Plenário
Restrição à doação de sangue por homossexuais: constitucionalidade – 2
Extinção de Tribunais de Contas dos Municípios
1ª Turma
Transmissão clandestina de sinal de internet: atipicidade
2ª Turma
Extradição e instrução deficiente
Ministério Público comum e especial e legitimidade processual

Plenário

Restrição à doação de sangue por homossexuais: constitucionalidade (2) (ADI 5543/DF)

Julgamento suspenso.

 

Extinção de Tribunais de Contas dos Municípios

O Plenário entendeu que a Constituição Federal não proíbe a extinção de Tribunais de Contas dos Municípios.

Além da questão meramente legal ou constitucional, o STF também se manifestou em relação à suposta situação de desvio de finalidade do ato normativo disputado (extinção do Tribunal de Conta dos Municípios do Estado do Ceará). De fato, para ser impugnado o ato, seria necessária a comprovação do desvio, e não a mera conjectura de retaliação política:

O Colegiado entendeu que a fraude na edição de lei com o objetivo de alcançar finalidade diversa do interesse público deve ser explicitada e comprovada. A mera menção à existência de parlamentares com contas desaprovadas não conduz à conclusão de estarem viciadas as deliberações cujo tema é a atividade de controle externo.

Relembrou a Corte que a Constituição veda a criação de Tribunais, Conselhos ou órgãos de Contas Municipais, o que não impede a criação de órgãos estaduais voltados ao controle de contas dos Municípios (a exemplo dos chamados Tribunais de Contas dos Municípios).

Art. 31. A fiscalização do Município será exercida pelo Poder Legislativo Municipal, mediante controle externo, e pelos sistemas de controle interno do Poder Executivo Municipal, na forma da lei.
§ 1º O controle externo da Câmara Municipal será exercido com o auxílio dos Tribunais de Contas dos Estados ou do Município ou dos Conselhos ou Tribunais de Contas dos Municípios, onde houver.
§ 2º O parecer prévio, emitido pelo órgão competente sobre as contas que o Prefeito deve anualmente prestar, só deixará de prevalecer por decisão de dois terços dos membros da Câmara Municipal.
§ 3º As contas dos Municípios ficarão, durante sessenta dias, anualmente, à disposição de qualquer contribuinte, para exame e apreciação, o qual poderá questionar-lhes a legitimidade, nos termos da lei.
§ 4º É vedada a criação de Tribunais, Conselhos ou órgãos de Contas Municipais.

Entretanto, lembre-se que órgãos existentes antes da promulgação da Constituição não foram atingidos pela vedação.

Essa interpretação nos leva à conclusão de que o legislador constituinte reconheceu a existência dos Tribunais ou Conselhos de Contas Municipais já existentes na data da promulgação da Constituição Federal, não permitindo às respectivas Constituições Estaduais aboli-los, porém, ao mesmo tempo, expressamente vedou a criação de novos Tribunais ou Conselhos de Contas. (MORAES, 2016, p. 702).

Assim, a escolha pela existência de tal órgão suplementar cabe ao respectivo Estado, que poderá concentrar as atividades de controle no seu próprio Tribunal de Contas (este, sim, tem existência obrigatória, nos moldes do art. 75, parágrafo único, da Constituição Federal).

O legislador constituinte permitiu a experimentação institucional dos entes federados, desde que não fossem criados conselhos ou tribunais municipais, devendo ser observado o modelo federal, com ao menos um órgão de controle externo.

Art. 75. As normas estabelecidas nesta seção aplicam-se, no que couber, à organização, composição e fiscalização dos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal, bem como dos Tribunais e Conselhos de Contas dos Municípios.
Parágrafo único. As Constituições estaduais disporão sobre os Tribunais de Contas respectivos, que serão integrados por sete Conselheiros.

Também ponderou o Plenário que não há vício de iniciativa legislativa, pois os parâmetros presentes na Constituição Estadual foram seguidos, e não se apresentou incompatibilidade com as normas de iniciativa apresentadas na Constituição Federal.

 

Primeira turma

Transmissão clandestina de sinal de internet: atipicidade (HC 127.978)

Em conclusão, a Turma decidiu que a oferta de serviço de internet, concebido como serviço de valor adicionado, não pode ser considerada atividade clandestina de telecomunicações.

O crime imputado neste caso é o previsto no art. 183, da Lei de Telecomunicações (Lei nº 7.472/97):

Art. 183. Desenvolver clandestinamente atividades de telecomunicação:
Pena – detenção de dois a quatro anos, aumentada da metade se houver dano a terceiro, e multa de R$ 10.000,00 (dez mil reais).
Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem, direta ou indiretamente, concorrer para o crime.

Como se percebe do preceito primário (definição da conduta criminalizada), estamos diante de uma norma penal em branco, pois há dependência com a definição de “atividades de telecomunicação”. A suplementação em questão se faz presente na legislação (norma penal em branco imprópria), mais especificamente, na própria Lei nº 7.472/97, sendo, portanto, uma norma penal em pranco imprópria homovitelínea (SANCHES, 2017).

As definições pertinentes, no caso de telecomunicações, encontram-se nos arts. 60 e 61, da Lei de Telecomunicações:

Art. 60. Serviço de telecomunicações é o conjunto de atividades que possibilita a oferta de telecomunicação.
§ 1° Telecomunicação é a transmissão, emissão ou recepção, por fio, radioeletricidade, meios ópticos ou qualquer outro processo eletromagnético, de símbolos, caracteres, sinais, escritos, imagens, sons ou informações de qualquer natureza.
[…]
Art. 61. Serviço de valor adicionado é a atividade que acrescenta, a um serviço de telecomunicações que lhe dá suporte e com o qual não se confunde, novas utilidades relacionadas ao acesso, armazenamento, apresentação, movimentação ou recuperação de informações.
§ 1º Serviço de valor adicionado não constitui serviço de telecomunicações, classificando-se seu provedor como usuário do serviço de telecomunicações que lhe dá suporte, com os direitos e deveres inerentes a essa condição.
§ 2° É assegurado aos interessados o uso das redes de serviços de telecomunicações para prestação de serviços de valor adicionado, cabendo à Agência, para assegurar esse direito, regular os condicionamentos, assim como o relacionamento entre aqueles e as prestadoras de serviço de telecomunicações.

Para a Primeira Turma, a transmissão do sinal de Internet não se enquadraria no art. 60, §1º, do diploma, o que possibilitaria a incidência do tipo, mas sim no art. 61. Dessa forma, a conduta seria atipica, por inexistir criminalização da transmissão clandestina de serviço de valor adicionado.

 

Segunda Turma

Extradição e instrução deficiente (Ext 1.512/DF)

Deferiu-se o pedido de extradição apresentado sem a cópia dos textos legais aplicáveis aos fatos que, em tese, correspondem aos crimes de tráfico de drogas e de associação para o tráfico. Mesmo com a instrução deficiente, a Turma observou a omissão da defesa e o interesse do próprio envolvido.

Os requisitos formais da extradição passarão a ser definidos pela Lei nº 13.445/17, a Lei da Migração, conforme os seguintes destaques:

Art. 81, §1: A extradição será requerida por via diplomática ou pelas autoridades centrais designadas para esse fim.
Art. 82. Não se concederá a extradição quando:
I – o indivíduo cuja extradição é solicitada ao Brasil for brasileiro nato;
II – o fato que motivar o pedido não for considerado crime no Brasil ou no Estado requerente;
III – o Brasil for competente, segundo suas leis, para julgar o crime imputado ao extraditando;
IV – a lei brasileira impuser ao crime pena de prisão inferior a 2 (dois) anos;
V – o extraditando estiver respondendo a processo ou já houver sido condenado ou absolvido no Brasil pelo mesmo fato em que se fundar o pedido;
VI – a punibilidade estiver extinta pela prescrição, segundo a lei brasileira ou a do Estado requerente;
VII – o fato constituir crime político ou de opinião;
VIII – o extraditando tiver de responder, no Estado requerente, perante tribunal ou juízo de exceção; ou
IX – o extraditando for beneficiário de refúgio, nos termos da Lei no 9.474, de 22 de julho de 1997, ou de asilo territorial.
Art. 83. São condições para concessão da extradição:
I – ter sido o crime cometido no território do Estado requerente ou serem aplicáveis ao extraditando as leis penais desse Estado; e
II – estar o extraditando respondendo a processo investigatório ou a processo penal ou ter sido condenado pelas autoridades judiciárias do Estado requerente a pena privativa de liberdade.

 

Ministério Público comum e especial e legitimidade processual

A Segunda Turma negou provimento a dois agravos regimentais em reclamações, ajuizadas por membros do Ministério Público Especial junto aos Tribunais de Contas. Em ambos os casos, se trata de concessão indevida de aposentadoria especial a servidor público civil, em suposta afronta ao que decidido pelo STF na ADI 3.772/DF (DJE de 7.11.2008).

A Turma concluiu pela ausência de legitimidade ativa de causa, visto que a legitimidade processual extraordinária e independente do Ministério Público comum não se estende ao Ministério Público junto aos Tribunais de Contas, cuja atuação se limita ao controle externo, nos termos da Constituição.

Relembre-se que a decisão na ADI nº 3.772/DF definiu que a a aposentadoria especial de professores se estende a diretores, coordenadores e assessores pedagógicos de estabelecimentos de ensino básico, quando forem professores de carreira.

Trata-se de violação de decisão vinculante, razão pela qual foi manejada reclamação. Entretanto, houve vício de legitimidade ativa, visto que a legitimidade processual extraordinária e independente do Ministério Público comum não se estende ao Ministério Público junto aos Tribunais de Contas.

A Corte definiu, portanto, diferenças de legitimidade ativa entre o Ministério Público comum e o MP junto aos Tribunais de Contas. Vale observar que:

De par com a legitimação ordinária, ou seja, a que decorre da posição ocupada pela parte como sujeito da lide, prevê o direito processual, em casos excepcionais, a legitimação extraordinária, que consiste em permitir-se, em determinadas circunstâncias, que a parte demande em nome próprio, mas na defesa de interesse alheio. (THEODORO JR., 2015).

Referências

MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. São Paulo: Saraiva, 2015.
MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. São Paulo: Editora Atlas, 2016.
STF. Informativo nº 883. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/informativo/pesquisarInformativo.asp
THEODORO JR., Humberto. Curso de direito processual civil. v. 1. Rio de Janeiro: Forense, 2015.