O instituto do livramento condicional está topograficamente inserido no título quinto do Código Penal, referente às penas e seus temas correlatos. Sendo matéria típica de execução penal, é apreciada e julgada pelo competente juiz da execução, com oitiva do Ministério Público.

Em termos gerais, trata-se da possibilidade de cumprimento da pena remanescente em liberdade pelo condenado (“liberdade antecipada”), desde que cumpridos os requisitos legais, cuja definição decorre de política criminal e apreciação jurisdicional. A ideia geral por trás da medida é a de abreviar a permanência carcerária e privilegiar a reinserção do condenado na sociedade.

A medida, ressalte-se, não tem uma relação imediata com a noção de progressão de regime, sendo desnecessária a transição de regime ou passagem por um regime ou outro para deferimento do livramento. Ademais, a progressão para regime mais ameno ainda importa em restrições evidentes à liberdade do indivíduo, como a submissão integral à colônia agrícola ou similar (semiaberto, art. 35) ou o recolhimento à noite e nas folgas em casa de albergado (aberto, art. 36). Em suma, o livramento é mais benéfico do que o cumprimento da pena em regimes mais amenos.

Requisitos legais

São os requisitos legais do livramento, apreciados pelo Juiz da execução:

Art. 83 – O juiz poderá conceder livramento condicional ao condenado a pena privativa de liberdade igual ou superior a 2 (dois) anos, desde que: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
I – cumprida mais de um terço da pena se o condenado não for reincidente em crime doloso e tiver bons antecedentes;
II – cumprida mais da metade se o condenado for reincidente em crime doloso;
III – comprovado comportamento satisfatório durante a execução da pena, bom desempenho no trabalho que lhe foi atribuído e aptidão para prover à própria subsistência mediante trabalho honesto;
IV – tenha reparado, salvo efetiva impossibilidade de fazê-lo, o dano causado pela infração;
V – cumpridos mais de dois terços da pena, nos casos de condenação por crime hediondo, prática de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, tráfico de pessoas e terrorismo, se o apenado não for reincidente específico em crimes dessa natureza.
Parágrafo único – Para o condenado por crime doloso, cometido com violência ou grave ameaça à pessoa, a concessão do livramento ficará também subordinada à constatação de condições pessoais que façam presumir que o liberado não voltará a delinqüir.

Como se percebe, existem requisitos objetivos (que não dizem respeito à pessoa do apenado) e subjetivos (que tratam do condenado). De início, observe-se o requisito objetivo do quantitativo condenatório mínimo: é necessário que a pena sofrida seja igual ou superior a dois anos de pena privativa de liberdade (este quantitativo pode ser atingido pela soma das diversas infrações cometidas – ainda não cumpridas –, conforme art. 84). Consequentemente, penas restritivas e de multa não admitem o benefício.

Outro requisito diz respeito ao prazo já cumprido de pena, de acordo com a qualidade da conduta criminosa e reincidência do agente.

Hediondo, tortura, terrorismo, tráfico de pessoas ou drogas + de 2/3 da pena
Reincidência em crime doloso. + de 1/2 da pena
Demais casos, com bons antecedentes + de 1/3 da pena

Para os fins de cômputo desse quesito cronológico, permite-se o uso de tempo de pena remida, permanência em estabelecimento de tratamento psiquiátrico ou de prisão provisória.

Entre os requisitos subjetivos comuns às possibilidades acima, destacam-se o satisfatório comportamento carcerário e bom desempenho laboral, bem como aptidão para prover subsistência honesta fora do cárcere. São elementos que corroboram com o viés ressocializador da medida.

Também se exige a reparação do dano causado, caso seja possível (alguns crimes têm efeitos irreparáveis, com impossível retorno ao status quo ante, ou talvez o agente não tenha condições de prover a reparação). Essa reparação não depende de ação civil pela vítima.

Por fim, sendo caso de crime cometido mediante grave ameaça ou violentamente, emerge como requisito subjetivo a constatação de condições pessoais que façam presumir que o liberado não voltará a delinquir. Autores como Rogério Greco (2017) sugerem que tal verificação possa ser realizada mediante exame criminológico. (art. 8º, da LEP).

Atente-se que o livramento não é um benefício que está à mercê da vontade do julgador, mas é um claro direito subjetivo do apenado, desde que preenchidas as formalidades constantes do preceito (SANCHES, 2016, p. 481).

Condições, revogamento e extinção

O indivíduo beneficiado pela medida se submete às condições apontadas pela Justiça.

A LEP (Lei nº 7210), em seus art. 132, explicita condições obrigatórias e exemplifica outras obrigações que podem ser impostas:

§ 1º Serão sempre impostas ao liberado condicional as obrigações seguintes:
a) obter ocupação lícita, dentro de prazo razoável se for apto para o trabalho;
b) comunicar periodicamente ao Juiz sua ocupação;
c) não mudar do território da comarca do Juízo da execução, sem prévia autorização deste.
§ 2° Poderão ainda ser impostas ao liberado condicional, entre outras obrigações, as seguintes:
a) não mudar de residência sem comunicação ao Juiz e à autoridade incumbida da observação cautelar e de proteção;
b) recolher-se à habitação em hora fixada;
c) não frequentar determinados lugares.

O benefício será revogado nos moldes do art. 86 a 88, do CP:

Art. 86 – Revoga-se o livramento, se o liberado vem a ser condenado a pena privativa de liberdade, em sentença irrecorrível:
I – por crime cometido durante a vigência do benefício;
II – por crime anterior, observado o disposto no art. 84 deste Código.
Art. 87 – O juiz poderá, também, revogar o livramento, se o liberado deixar de cumprir qualquer das obrigações constantes da sentença, ou for irrecorrivelmente condenado, por crime ou contravenção, a pena que não seja privativa de liberdade.
Art. 88 – Revogado o livramento, não poderá ser novamente concedido, e, salvo quando a revogação resulta de condenação por outro crime anterior àquele benefício, não se desconta na pena o tempo em que esteve solto o condenado.

Existem, portanto, situações de revogação obrigatória (notadamente a condenação definitiva em pena privativa de liberdade por crime cometido durante o gozo do benefício ou até mesmo antes).

A diferença entre as hipóteses do art. 86, do CP, se vê no art. 88. De fato, se a condenação definitiva que ocorre no curso do benefício decorre de crime praticado antes da concessão do benefício, o prazo em liberdade é computado como pena cumprida e o tempo adicionado pelo novo crime pode ser computado para concessão de um novo livramento. Segue o exemplo da doutrina:

JOÃO, cumprindo pena pela prática do crime de roubo (art. 157 do CP), foi beneficiado pelo livramento condicional faltando 3 anos para cumprir a reprimenda. Depois de 2 anos, é condenado definitivamente a pena privativa de liberdade por novo crime, porém cometido antes do período de prova do livramento, mais especificamente, estelionato (art. 171 do CP). O benefício deve ser obrigatoriamente revogado. Contudo, o tempo em que JOÃO esteve solto (2 anos) será computado como pena cumprida. Em relação ao roubo, é possível conceder novamente o benefício, desde que preenchidos os requisitos, admitindo, ainda, somar as penas dos dois crimes para se chegar ao quantum mínimo de 2 anos (art. 84 do CP). (SANCHES, 2016, p. 488).

Se até o seu término o livramento não é revogado, considera-se extinta a pena privativa de liberdade. (art. 90, do CP). Essa extinção não será declarada se houver pendência de processo por crime cometido na vigência do livramento (art. 89).

Essa última observação decorre do fato de que, advindo condenação ulterior por crime cometido no curso do benefício, o período já gozado não será considerado pena cumprida. Há, portanto, uma prorrogação do prazo de livramento, a fim de evitar a extinção indevida da pena.

Complemento

Falta grave

Por falta de previsão legal, “a falta grave não interrompe o prazo para obtenção de livramento
condicional”. Este é, inclusive, o literal enunciado da Súmula nº 441, do STJ. Entretanto, a falta grave é indício subjetivo negativo, podendo vir a inviabilizar a concessão do benefício:

2. A prática de faltas graves durante a execução da pena, embora não interrompa o prazo para a obtenção do benefício do livramento condicional (requisito objetivo), pode afastar o preenchimento do requisito subjetivo, obstando a concessão da benesse. (STJ. T5. HC 400744. HABEAS CORPUS nº 2017/0119608-1. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA).

Reincidência específica

Outro tópico interessante diz respeito à noção de reincidência específica para aplicação do critério mais rigoroso de livramento. (>2/3) Sobre o assunto, debate a doutrina:

Por essa razão, a partir dessa alteração legislativa [Lei nº 13.344/2016], acreditamos que a razão esteja com Alberto Silva Franco, ao exigir que se considere reincidência específica a prática de infrações penais idênticas, isto é, aquelas que encontram moldura no mesmo tipo penal. Dessa forma, não se poderia considerar como reincidente específico o agente que viesse a ser condenado, inicialmente, pelo crime de estupro e, posteriormente, por um crime de tráfico de drogas, ou pelo delito de tráfico de pessoas. (GRECO, 2017, e-book).

Diferenças com o sursis:

No livramento condicional o condenado retorna ao convívio social depois do cumprimento de parte da pena que lhe foi imposta, dependendo da natureza do crime e de suas condições pessoais. Foi condenado, cumpre uma fração da reprimenda e, posteriormente, é colocado em liberdade. Por sua vez, no sursis o condenado sequer inicia o cumprimento da pena privativa de liberdade. Distinguem-se também quanto à duração. No livramento condicional o período de prova, também chamado de período de experiência, isto é, o tempo em que o condenado deve observar as condições legais e judiciais impostas, bem como respeitar as causas de revogação, é representado pelo restante da pena ainda não cumprido. No sursis, de seu turno, o período de prova deve ser estipulado dentro dos parâmetros legalmente indicados: entre 2 (dois) e 4 (quatro) anos, mas que pode ser diverso, tal como no sursis etário e no sursis humanitário, bem como em hipóteses indicadas por leis especiais, como é o caso dos crimes ambientais. Finalmente, o sursis geralmente é concedido pela sentença condenatória, que comporta recurso de apelação (art. 593 e § 4.º, do CPP). Mas também pode ser concedido pelo acórdão, em grau de recurso ou em se tratando de competência originária dos tribunais. Já o livramento condicional é obrigatoriamente deferido pelo juízo da execução, e para impugnar essa decisão o recurso cabível é o agravo em execução (art. 197 da LEP). (MASSON, 2014, e-book).

Referências

GRECO, Rogério. Código penal: comentado. Niterói: Impetus, 2017.
MASSON, Cléber. Código penal comentado. Rio de Janeiro: Forense, 2014.
SANCHES, Rogério. Manual de direito penal: parte geral. Salvador: JusPodivm, 2016.

Questões

(TRF3 – Juiz Federal Substituto – 2016) Se o defensor de um condenado preso entender que ele faz jus ao livramento condicional, deverá:

a) Solicitar ao Tribunal, mediante a impetração de habeas corpus;
b) Solicitar ao Tribunal, mediante a propositura de Revisão Criminal;
c) Solicitar ao Juiz da Execução, mediante Agravo em Execução;
d) Solicitar ao Juiz da Execução, mediante petição.

 

(DPE-ES – Defensor Público – 2016) Sobre o livramento condicional:

a) é vedada a concessão do livramento condicional para o preso que cumpre pena em regime fechado, sob pena de incorrer em progressão por salto.
b) segundo a jurisprudência majoritária do STJ, o descumprimento das condições do livramento condicional pode ser aferido após o término do período de prova, ainda que este não tenha sido prorrogado pelo juízo da execução.
c) o lapso temporal para o livramento condicional no caso de reincidente é de dois terços da pena.
d) é vedada a revogação do livramento condicional por crime cometido antes do período de prova.
e) é vedada a concessão de livramento condicional ao reincidente específico em crime hediondo.

 

(TJSC – Juiz Substituto – 2015) NÃO é requisito para obtenção do livramento condicional:

a) Cumprimento de mais de dois terços da pena, nos casos de condenação por crime hediondo ou assemelhado.
b) Pagamento da pena de multa.
c) Reparação do dano, salvo impossibilidade de o fazer.
d) Cumprimento de mais de um terço da pena se não for reincidente em crime doloso e tiver bons antecedentes.
e) Cumprimento de mais da metade se for reincidente em crime doloso.