O Código Penal expõe:

Art. 25 – Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem.

Trata-se de causa excludente de ilicitude referente ao repelimento moderado de injusta agressão (deve ser portanto, uma direta ou indireta agressão humana) que está acontecendo (atual) ou prestes a acontecer (iminente) para proteger direito seu ou de outrem (finalidade almejada pelo agente).

São suas características precípuas, além da imersão psicológica do agredido na situação justificante:

Uma injusta agressão: é conduta contrária ao direito (ação ou omissão) que ameaça bens jurídicos de alguém. Há divergência sobre a conduta do inimputável.

Alerta a doutrina que a injustiça da agressão independe da consciência do agressor. Inimputáveis, por exemplo, podem cometer agressões injustas (por eles não compreendidas), autorizando o agredido invocar legítima defesa. (CUNHA, Rogério Sanches. Manual de direito penal: parte geral (arts. 1º ao 120). Salvador: JusPodivm, 2016, p. 265)

Atual ou iminente: não podendo ser futura. Deve corresponder à noção de reação.

A ação exercida após cessado o perigo caracteriza vingança, que é penalmente reprimida. Igual sorte tem o perigo futuro, que possibilita a utilização de outros meios, inclusive a busca de socorro da autoridade pública. (JESUS, Damásio de. Direito penal: parte geral. São Paulo: Saraiva, 2014, recurso digital.).

Uso moderado dos meios necessários: de acordo com as circunstâncias e meios disponíveis, exige-se que a reação seja razoável, proporcional e moderada, suficiente para impedir a agressão. O excesso impõe a responsabilidade a título culposo ou doloso.

Trata-se daquele menos lesivo que se encontra à disposição do agente, porém hábil a repelir a agressão. Havendo mais de um recurso capaz de obstar o ataque ao alcance do sujeito, deve ele optar pelo menos agressivo. (ESTEFAM, André; GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito penal esquematizado: parte geral. São Paulo: Saraiva, 2016, recurso digital).

É importante relembrar o que informa o art. 23, parágrafo único, do CP, aplicável a todas as espécies de excludentes:

Parágrafo único – O agente, em qualquer das hipóteses deste artigo, responderá pelo excesso doloso ou culposo.

A configuração do excesso é subsequente à reação justificada e pode decorrer de dolo ou culpa. Exemplo clássico disso é a “reação” que continua após o cessar da agressão inicial, como no caso em que o agressor já encontra-se submetido.

Excesso: É a intensificação desnecessária de uma ação inicialmente justificada. Presente o excesso, os requisitos das descriminantes deixam de existir, devendo o agente responder pelas desnecessárias lesões causadas ao bem jurídico ofendido (cf. art. 23, parágrafo único). (CAPEZ, Fernando; PRADO, Stela. Código penal comentado. São Paulo: Saraiva, 2013, recurso digital).

A doutrina ainda se debruça sobre vertente do excesso doloso decorrente de erro de proibição indireto. Neste caso, a pessoa que reage excede-se dolosamente por erro sobre os limites objetivos da legítima defesa (ex. a pessoa pensa que a legítima defesa abrange atos posteriores ao efetivo repelimento da agressão).

Neste último exemplo, embora a conduta praticada em excesso tenha sido dolosa, ela foi derivada de erro sobre os limites de uma causa de justificação, e nesse caso, como em qualquer modalidade de erro, devemos aferir se era evitável ou inevitável. Se inevitável, o agente, embora atuando em excesso, será considerado isento de pena; se evitável o erro, embora o fato por ele praticado seja típico, ilícito e culpável, verá sua pena reduzida entre os limites de um sexto a um terço, nos termos da parte final do art. 21 do Código Penal. (GRECO, Rogério. p. Curso de Direito Penal. Rio de Janeiro: Impetus, 2016, p. 463).

O excesso doloso (intencional, consciente, voluntário), excetuadas as situações de erro se transforma em ilícito próprio, respondendo a pessoa a título doloso.

O excesso culposo (inconsciente, involuntário ou não intencional) angaria discussões mais complexas na doutrina sobre a efetiva natureza da conduta, mas, sob a luz do Código Penal, é admitida em termos gerais como situação de erro. Assim, investiga-se se estamos diante de erro invencível (inevitável, desculpável, escusável), situação em que o agente não responderá; ou se o erro é vencível (evitável, indesculpável, inescusável), ocasião em que haverá responsabilidade a título de culpa.

Outro tópico discutido sem muita homogeneidade doutrinária é o excesso intensivo e extensivo.

O excesso extensivo se dá quando a defesa se prolonga durante mais tempo do que dura a atualidade da agressão. O excesso intensivo pressupõe, ao contrário, que a agressão seja atual mas que a defesa poderia e deveria adotar uma intensidade lesiva menor. O excesso extensivo é, pois, um excesso na duração da defesa, enquanto que o excesso intensivo é um excesso em sua virtualidade lesiva. (MIR PUIG, Santiago. Derecho penal: parte general, p. 434, apud GRECO, Rogério. op. cit., p. 465).

Legítima defesa real vs legítima defesa putativa

A doutrina não admite a concomitância de legítimas defesas reais, pois é necessário que exista uma agressão injusta, e a reação legítima é, por natureza, justificada. Isso não é empecilho para um embate entre legítima defesa real e putativa (imaginária, decorrente de erro, má representação da realidade vivenciada), pois a ação putativa, firmada em erro sobre o contexto fático, é injusta, permitindo que ocorra a reação legítima.

O caso clássico exposto pela doutrina é a do encontro entre inimigos capitais. Um, pensando que o outro se aproxima com intuito vil (quando na verdade vem buscar conciliação), efetua disparo preventivamente, supondo encontrar-se prestes a ser alvejado. O outro, diante da agressão, reage.

Outro caso é o de legítima defesa sucessiva:

É possível, no entanto, que uma pessoa aja inicialmente em legítima defesa e, após, intensifique desnecessariamente sua conduta, permitindo que o agressor, agora, defenda-se contra esse excesso (legítima defesa sucessiva — isto é “a reação contra o excesso”). (ESTEFAM, André; GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito penal esquematizado: parte geral. São Paulo: Saraiva, 2016, recurso digital).

Commodus discessus

A possibilidade de evitar integralmente a situação que ensejará a necessidade do uso da legítima defesa, fugindo inteiramente da ocasião em vias inflamatórias, chama-se “commodus discessus”, ou “saída cômoda”. A doutrina não observa empecilho ao reconhecimento da causa excludente caso a pessoa agredida não tenha aproveitado a oportunidade de se evadir do conflito. Em outras palavras, a agressão não precisa ser inevitável para se viabilizar a legítima defesa.

Ofendículos

São mecanismos e instrumentos empregados para a defesa de bens jurídicos (ex. cercas elétricas, material cortante em muros).

Embora haja dissenso doutrinário a respeito da natureza jurídica dos ofendículos (legítima defesa ou exercício regular de um direito), prevalece o entendimento de que sua preparação configura exercício regular de um direito, e sua efetiva utilização diante de um caso concreto, legítima defesa preordenada. (ESTEFAM, André; GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Direito penal esquematizado: parte geral. São Paulo: Saraiva, 2016, recurso digital).