No que se refere à ciência jurídica, os direitos humanos (“direitos do homem”, “direitos humanos fundamentais”) evidenciam típico objeto de estudo do Direito Internacional, apesar de manterem íntimas relações com os demais ramos do Direito.
A disciplina é usualmente denominada Direito Internacional dos Direitos Humanos. Este envolvimento enriquece o Direito em âmbito local, mas também propicia calorosos debates no que diz respeito à cultura, à identidade e à ideologia predominante em cada sociedade. Sobre a clara interdisciplinariedade da questão:

Por sua vez, o Direito Internacional dos Direitos Humanos, ao concentrar seu objeto nos direitos da pessoa humana, revela um conteúdo materialmente constitucional, já que os direitos humanos, ao longo da experiência constitucional, sempre foram considerados matéria constitucional. Contudo, no âmbito do Direito Internacional dos Direitos Humanos, a fonte de tais direitos é de natureza internacional. O enfoque da investigação é, assim, interdisciplinar, já que se localiza justamente na interação entre o Direito Constitucional e o Direito Internacional dos Direitos Humanos. (PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o direito constitucional internacional). São Paulo: Saraiva, 2013, recurso digital).

Essa interdisciplinariedade é patente no introito da Constituição Federal de 1988, que assevera, em complementação ao seu inspirado leque de direitos fundamentais:

Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios:
II – prevalência dos direitos humanos;

Para uma abordagem jurídica prefacial e didática, pode-se entender um direito humano como uma prerrogativa jurídica essencial e intrínseca à condição humana, um direito que decorre meramente do fato de um indivíduo compartilhar da humanidade comum e de merecer dignidade. São direitos que, com evidência crescente a partir de meados do século XX, impõem uma peculiar visão ética sobre a vida em sociedade, local e globalmente.

Obs: mesmo que sejam, em regra, iguais materialmente (ou seja, em essência e fundamento), direitos fundamentais e direitos humanos encontram uma simples divisão técnica na doutrina majoritária: os primeiros dizem respeito à vida jurídica no âmbito interno do Estado constitucional, enquanto os segundos, no âmbito internacional. Ainda assim, na praxe internacional e interna, não há uma terminologia rigorosa, existindo tratados de direitos humanos que os mencionam como direitos fundamentais e direitos humanos vestidos de direitos fundamentais, com conseguinte direta aplicação interna. As diferenças, em regra, adentram a seara das formalidades e aplicabilidade, existindo autores que pregam a submissão integral da soberania dos países ao Direito Internacional dos Direitos Humanos, visão que torna irrelevantes as principais diferenças formais entre as figuras.

Essa “união de termos” [direitos humanos fundamentais] mostra que a diferenciação entre “direitos humanos, representando os direitos reconhecidos pelo Direito Internacional dos Direitos Humanos, e os “direitos fundamentais”, representando os direitos positivados nas Constituições e leis internas, perde a importância, ainda mais na ocorrência de um processo de aproximação e mútua relação entre o Direito Internacional e o Direito interno na temática dos direitos humanos. (RAMOS, André de Carvalho. Curso de direitos humanos. São Paulo: Saraiva, 2014, recurso digital).

Atualmente é certa a autonomia científica deste ramo de estudo, que no decorrer dos anos vem adquirindo maior concretização e força normativa por meio do amadurecimento dos seus sistemas protetivos, instituições e corpo normativo. Entre os objetos de estudo dessa disciplina, estudam-se os fundamentos dos direitos humanos e suas características típicas, as previsões positivas dos mesmos (declarações, tratados, convenções), os mecanismos e procedimentos de proteção (sistemas regionais e internacional, formas de petição e meios coercitivos de respaldo).

Esta visão corresponde ao que se denomina de noção contemporânea dos direitos humanos, que merece especial destaque em face de sua internacionalização, alto grau de legitimação, adesão e suporte instrumental por instituições, Estados e organizações internacionais, bem como possibilidade de petição por diversos sujeitos e julgamento por órgãos legitimados. Para a doutrina, esta visão contemporânea é introduzida com o a Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948 e com a Declaração de Direitos Humanos de Viena de 1993. Observe-se que a noção de contemporaneidade tem forte apelo cronológico, não subestimando estudos milenares existentes sobre o homem, a justiça, os princípios, os valores e os seus direitos essenciais.

A Declaração Universal de 1948 demarca a concepção contemporânea dos direitos humanos, seja por fixar a ideia de que os direitos humanos são universais, inerentes à condição de pessoa e não relativos às peculiaridades sociais e culturais de determinada sociedade, seja por incluir em seu elenco não só direitos civis e políticos, mas também direitos sociais, econômicos e culturais. A partir da aprovação da Declaração Universal, começa a se desenvolver o Direito Internacional dos Direitos Humanos, mediante a adoção de inúmeros tratados internacionais voltados à proteção de direitos fundamentais. (PIOVESAN, Flávia. Temas de Direitos Humanos). São Paulo: Saraiva, 2012, recurso digital).

É interesse observar que a história evolutiva dos direitos humanos evidencia outros olhares sobre os mesmos, com visões naturalistas e religiosas. É comum a menção à tragédia grega “Antígona”, de Sófocles, onde a personagem homônima recusa a aplicação da lei posta em prestígio das leis universais e atemporais dos deuses.

Características

A partir da Declaração de Viena de 1993 podemos extrair algumas características desses direitos:

5. Todos os Direitos do homem são universais, indivisíveis, interdependentes e interrelacionados. A comunidade internacional tem de considerar globalmente os Direitos do homem, de forma justa e equitativa e com igual ênfase. Embora se devam ter sempre presente o significado das especificidades nacionais e regionais e os antecedentes históricos, culturais e religiosos, compete aos Estados, independentemente dos seus sistemas político, económico e cultural, promover e proteger todos os Direitos do homem e liberdades fundamentais.

A universalidade é a característica de que tais direitos são titularizados por todos os seres humanos indistintamente.
A indivisibilidade é a característica de que esse complexo de direitos é interconectado, indivisível. A violação de um aspecto dos direitos humanos implica violação dos demais. Tais direitos não podem ser gozados de maneira fracionária. Isso se aplica para a totalidade de suas vertentes, incluindo liberdades civis e direitos sociais e econômicos.

A noção de indivisibilidade interage com a evolução e processo acumulativo de tais direitos. Os autores falam, portanto, em gerações de direitos humanos ou dimensões, termo preferido por parte da doutrina por melhor caracterizar a noção de interdependência e conectividade.

Isto é, afasta-se a ideia da sucessão “geracional” de direitos, na medida em que se acolhe a ideia da expansão, cumulação e fortalecimento dos direitos humanos consagrados, todos essencialmente complementares e em constante dinâmica de interação. (PIOVESAN, Flávia. Temas de Direitos Humanos). São Paulo: Saraiva, 2012, recurso digital).

Outra característica ressaltada é a historicidade e a proibição de retrocesso (ou effet cliquet, conforme doutrina francesa). Neste aspecto, entendem-se tais direitos como um fenômeno que evolui juntamente com a sociedade, angariando novas facetas em um processo acumulativo, e não deletério. Nesse contexto, veda-se a revogação ou superação de direitos consagrados, de forma a se manter íntegra a proteção de todo o complexo de direitos, proibindo-se o retrocesso do cenário protetivo.

Obs: nesse mesmo contexto, entrincheiramento (entrenchment) é a preservação dos direitos já conquistados, concretizando-os e protegendo-os de ulteriores retrocessos ou reduções.

Direitos humanos também são inalienáveis, indisponíveis, irrenunciáveis e imprescritíveis. Isso quer dizer que as pessoas não podem se desfazer, renunciar ou perder a possibilidade de gozo ou exercício de tais direitos por inércia ou vontade própria, pois os mesmos são intrinsecamente ligados às mesmas, sendo juridicamente ínsitos à respectiva condição humana, permanecendo juridicamente indissociáveis.

Os direitos humanos são tão vinculados à proteção da dignidade inerente ao ser humano que são indisponíveis, inalienáveis e irrenunciáveis, não podendo, portanto, ser afastados ainda que assim queira seu destinatário. (PORTELA, Paulo Henrique Gonçalves. Direito internacional público e privado. Salvador: JusPodivm, 2015, p. 803).

Acima estão características meramente exemplificativas. A doutrina é generosa na indicação de facetas (por vezes redundantes), sendo a Declaração Universal e a Declaração de Viena o costumeiro norte para definição da visão atual de direitos humanos.

Fundamentos e dignidade da pessoa humana

A título de fundamento, é comum a indicação da dignidade da pessoa humana como fundamento dos direitos humanos. A noção de dignidade, hoje em voga e com importância última reconhecida também na Constituição Federal de 1988, é especialmente delineada por Immanuel Kant, que na obra Fundamentação da metafísica dos costumes delineia que coisas com preço podem ser substituídas, enquanto as com dignidade, notadamente os indivíduos, não se submetem à substituição, sendo fins em si mesmos. A visão kantiana, portanto, defere aos indivíduos dignidade, tornando-os seres finalísticos em si próprios, não podendo ser objetificados ou utilizados como meros meios.

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
III – a dignidade da pessoa humana;

Tanto nos diplomas internacionais quanto nacionais, a dignidade humana é inscrita como princípio geral ou fundamental, mas não como um direito autônomo. De fato, a dignidade humana é uma categoria jurídica que, por estar na origem de todos os direitos humanos, confere-lhes conteúdo ético. Ainda, a dignidade humana dá unidade axiológica a um sistema jurídico, fornecendo um substrato material para que os direitos possam florescer. (RAMOS, André de Carvalho. Curso de direitos humanos. São Paulo: Saraiva, 2014, recurso digital).

Outras teorias apontam uma ordem superior e universal (visão jusnaturalista, podendo admitir enfoques religiosos ou racionalistas), além da norma posta; a visão positivista, que entende que o fundamento é a norma posta, com previsão expressa dos direitos humanos. E a teoria moralista, de Perelman:

A teoria moralista (ou de Perelman) fundamenta os direitos humanos na “experiência e consciência moral de um determinado povo”, ou seja, na convicção social acerca da necessidade da proteção de determinado valor. (PORTELA, Paulo Henrique Gonçalves. Direito internacional público e privado. Salvador: JusPodivm, 2015, p. 802).

A doutrina debate sobre a questão, sendo consequência prática deste debate a necessidade ou não de expressão positiva de tais direitos. Para os positivistas, é necessária a positivação. Para os jusnaturalistas, a positivação é mero acessório, sendo possível e devida a proteção independentemente de consagração formal. Esta desnecessidade de positivação encontra respaldo de maioria doutrinária, mas possui dificuldade de aplicação prática, tendo em vista que, em regra, os mecanismos coercitivos dos sistemas de proteção dependem de uma adesão formal por parte dos Estados soberanos.

Materialidade e formalidade

A partir desse debate, emerge a discussão acerca das facetas formal e material dos direitos humanos. O elemento formal diz respeito à consagração positiva explícita de um direito, enquanto o elemento material trata da essencialidade do direito, em conformidade com seu fundamento, independentemente de previsão explícita.

Os direitos humanos representam valores essenciais, que são explicitamente ou implicitamente retratados nas Constituições ou nos tratados internacionais. A fundamentalidade dos direitos humanos pode ser formal, por meio da inscrição desses direitos no rol de direitos protegidos nas Constituições e tratados, ou pode ser material, sendo considerado parte integrante dos direitos humanos aquele que – mesmo não expresso – é indispensável para a promoção da dignidade humana. (RAMOS, André de Carvalho. Curso de direitos humanos. São Paulo: Saraiva, 2014, recurso digital).