O Código de Processo Civil de 2015 permite de forma geral a cumulação de pedidos (cumulação objetiva, pois trata do objeto do processo, e não de seus sujeitos) em uma demanda, contanto que haja compatibilidade entre os mesmos e que seja respeitada a competência do juízo e o procedimento pertinente.
Tag: do pedido
O início do processo é marcado pela sua fase postulatória, na qual autor apresenta formalmente sua demanda em conformidade com o art. 319, do CPC, oportunizando-se posteriormente a apresentação de defesa pela parte contrária.
Em certas ocasiões, entretanto, pode ocorrer que já em sua fase postulatória a demanda venha a ser extinta sem julgamento de mérito ou apreciada liminarmente, com decisão capaz de decidir o seu mérito. São as hipóteses de indeferimento da petição inicial e de improcedência liminar do pedido, respectivamente.
Indeferimento da petição inicial
O indeferimento da petição inicial obsta liminarmente (no início do processo) o prosseguimento do feito (ou de parte dele, em caso de cumulação de pedidos), extinguindo-o (art. 485, I, do CPC). Didier Jr (2016) aponta que, tecnicamente, o indeferimento sempre ocorre antes da oitiva do réu. Caso ocorra o reconhecimento de vício posteriormente, a extinção do processo decorrerá de outro fenômeno (art. 485, II a X, do CPC).
O art. 330, do CPC, enumera exaustivamente as hipóteses de indeferimento da petição inicial:
Art. 330. A petição inicial será indeferida quando:
Código de processo civil
I – for inepta;
II – a parte for manifestamente ilegítima;
III – o autor carecer de interesse processual;
IV – não atendidas as prescrições dos arts. 106 e 321.
A primeira hipótese é exemplificada pela própria legislação:
§1º Considera-se inepta a petição inicial quando:
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL
I – lhe faltar pedido ou causa de pedir;
II – o pedido for indeterminado, ressalvadas as hipóteses legais em que se permite o pedido genérico;
III – da narração dos fatos não decorrer logicamente a conclusão;
IV – contiver pedidos incompatíveis entre si.
A inépcia, como se percebe, é a insuficiência da petição, gerando uma peça incapaz de concatenar e expor logicamente a demanda. É tipicamente vislumbrada na falta de coerência (ex. Pedidos incompatíveis, a chamada “petição suicida”), a falta de informações essenciais ou de exposições fáticas genéricas.
Conforme visto, a petição inicial é o veículo da demanda, que se compõe do pedido, da causa de pedir (elementos objetivos) e dos sujeitos (elemento subjetivo). A inépcia diz respeito a vícios na identificação/formulação dos elementos objetivos da demanda (DIDIER JR, 2016, p. 571).
A ilegitimidade manifesta da parte é outra hipótese de indeferimento. Neste caso o julgador verifica que, através da narrativa inicial, a composição do processo por uma das partes é indevida. A adjetivação “manifesta” aponta a visão de que tal percepção pelo Juiz há de ser isenta de dúvida:
Menciona o art. 330, II, do Novo CPC que a parte deve ser “manifestamente ilegítima”, levando a crer que a mera ilegitimidade não seria o suficiente para o indeferimento. É claro que, se o juiz, ao analisar a petição inicial, se convencer da ilegitimidade de uma das partes ou mesmo de ambas deverá indeferir a petição inicial, ainda que a ilegitimidade não seja aberrante ou evidente (NEVES, 2016, p. 561).
A falta de interesse processual também possibilita o indeferimento da peça inicial. A doutrina tende a compor a noção de interesse processual por meio das noções de necessidade, adequação e/ou utilidade. Em termos gerais, há interesse processual sempre que a prestação jurisdicional é necessária à solução do problema (ou seja, não há alternativa), útil ao interessado (potencialmente trará uma benesse material ou imaterial ao autor).
O interesse processual está presente sempre que a parte tenha a necessidade de exercer o direito de ação (e, consequentemente, instaurar o processo) para alcançar o resultado que pretende, relativamente à sua pretensão e, além disso, sempre que aquilo que se pede no processo seja útil sob o aspecto prático (WAMBIER; TALAMINI, 2016, e-book).
Assim, se o indivíduo propõe demanda desnecessária e inútil aos seus interesses, a mesma estará fadada ao indeferimento liminar.
Caso a petição não atenda às prescrições dos arts. 106 e 321, do CPC, também é possível seu indeferimento. O art. 106 trata de formalidades de identificação advogado (endereço profissional, número de inscrição na OAB. O art. 321 diz respeito ao prazo concedido em Juízo para retificação de vícios. Caso a parte permaneça inerte, a petição será indeferida.
Art. 321. O juiz, ao verificar que a petição inicial não preenche os requisitos dos arts. 319 e 320 ou que apresenta defeitos e irregularidades capazes de dificultar o julgamento de mérito, determinará que o autor, no prazo de 15 (quinze) dias, a emende ou a complete, indicando com precisão o que deve ser corrigido ou completado.
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL
Parágrafo único. Se o autor não cumprir a diligência, o juiz indeferirá a petição inicial.
Aspecto recursal e retratação
A decisão interlocutória que indefere parcialmente a petição inicial é recorrível, em primeiro grau, por agravo de instrumento (art. 354, parágrafo único, do CPC).
O recurso cabível contra o indeferimento integral por sentença é a apelação.
No caso de demanda instaurada originalmente nos Tribunais, a decisão pode ser do relator (possibilitando a apresentação de agravo interno) ou do órgão colegiado, permitindo a apresentação de recurso extraordinário e/ou recurso especial, ou recurso ordinário.
Sendo interposta apelação contra a decisão, possibilita-se a retratação do Juízo no prazo de cinco dias (a doutrina estende essa possibilidade às demais irresignações recursais). Não adotado este procedimento, o recurso segue para julgamento. Caso tenha êxito em grau recursal, o processo retorna à origem e o prazo de contestação inicia-se com a intimação do réu sobre esse retorno:
Art. 331. Indeferida a petição inicial, o autor poderá apelar, facultado ao juiz, no prazo de 5 (cinco) dias, retratar-se.
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL
§ 1º Se não houver retratação, o juiz mandará citar o réu para responder ao recurso.
§ 2º Sendo a sentença reformada pelo tribunal, o prazo para a contestação começará a correr da intimação do retorno dos autos, observado o disposto no art. 334.
§ 3º Não interposta a apelação, o réu será intimado do trânsito em julgado da sentença.
Improcedência liminar do pedido
A improcedência liminar do pedido é decisão que julga improcedente o pedido autoral no limiar do processo, sem que seja sequer necessária a instauração do contraditório pela citação da parte contrária. É uma técnica que foge do tradicional desenvolvimento processual, abreviando o rito e apresentando uma decisão de mérito quando se fazem presentes elementos suficientes para a definição precoce do provimento jurisdicional.
Como se vê a seguir, são situações em que a jurisprudência é contrária ao pleito do autor ou há evidente óbice meritório (prescrição ou decadência), razão pela qual a movimentação integral da máquina jurisdicional violaria os princípios da economia e da celeridade.
O novo CPC ampliou a possibilidade de o magistrado proceder ao julgamento liminar do pedido, pela sua improcedência, aproximando-nos mais ainda do sistema do common law (direito comum, em tradução livre), adotado em países como os Estados Unidos, o Canadá, o Reino Unido e nas ex-colônias do Império Britânico, apenas para exemplificar, marcado pela valorização dos precedentes jurisprudenciais, como técnica de resolução de conflitos de interesses (MONTENEGRO FILHO, 2016, e-book).
Dispõe a legislação aplicável:
Art. 332. Nas causas que dispensem a fase instrutória, o juiz, independentemente da citação do réu, julgará liminarmente improcedente o pedido que contrariar:
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL
I – enunciado de súmula do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça;
II – acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos;
III – entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência;
IV – enunciado de súmula de tribunal de justiça sobre direito local.
§1º O juiz também poderá julgar liminarmente improcedente o pedido se verificar, desde logo, a ocorrência de decadência ou de prescrição.
§2º Não interposta a apelação, o réu será intimado do trânsito em julgado da sentença, nos termos do art. 241.
§3º Interposta a apelação, o juiz poderá retratar-se em 5 (cinco) dias.
§4º Se houver retratação, o juiz determinará o prosseguimento do processo, com a citação do réu, e, se não houver retratação, determinará a citação do réu para apresentar contrarrazões, no prazo de 15 (quinze) dias.
Observe-se que o disposto no art. 332, I, do CPC, não exige súmula vinculante. Uma súmula comum do STF ou do STJ, portanto, é capaz de justificar a aplicação da técnica estudada, abreviando o processo e evitando o prolongamento de uma demanda fadada ao fracasso, tendo em vista posição jurisprudencial contrária já firmada sobre a mesma.
No mais, a súmula sobre direito local abrange matérias de âmbito estadual e municipal. A consolidação de entendimentos sobre tais matérias traz um incremento na relevância dos Tribunais de Justiça.
Referências
DIDIER JR., Fredie. Curso de direito processual civil. v. 1. Salvador: JusPodivm, 2016.
MONTENEGRO FILHO, Misael. Curso de direito processual civil. São Paulo: Atlas, 2016.
NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Novo código de processo civil comentado. Salvador: JusPodivm, 2016.
WAMBIER, Luiz Rodrigues; TALAMINI, Eduardo. Curso avançado de processo civil. v. I. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016, e-book.
Questões
(DPE-BA – Defensor Público – 2016) Sobre a petição inicial e seu indeferimento e a improcedência liminar do pedido é correto:
(UECE – Advogado – 2017): No que concerne à improcedência liminar do pedido, assinale a assertiva verdadeira.