Ciências jurídicas e temas correlatos

Tag: informativo Page 9 of 10

STF – Informativo nº 894 comentado

Plenário
Medida Provisória e FGTS
Medida Provisória e Decreto Legislativo
Fundo Partidário e recursos destinados às candidaturas de mulheres
2ª Turma
Execução provisória da pena e trânsito em julgado
Desacato praticado por civil contra militar e constitucionalidade

 

Plenário

Medida Provisória e FGTS (ADI 2382)

O julgamento apreciou ações diretas que combatiam alterações promovidas sobre a Lei nº 8.036/90, que dispõe sobre o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS.

Um dos tópicos iniciais é a análise de inconstitucionalidade por violação do art. 62, da Constituição, que indica a necessidade de urgência e relevância para edição de medidas provisórias:

Art. 62. Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional.

 

Para o Plenário, não cabe ao Judiciário, em condições normais, apreciar a existência de urgência ou relevância, que seriam juízos de competência constitucional do chefe do Executivo.

Em relação aos demais tópicos suscitados, a Corte não vislumbrou inconstitucionalidade. Por exemplo, a exigência de comparecimento pessoal para realização de saques seria razoável e dificultaria fraudes. Também entendeu inexistente vício formal no dispositivo que impede medidas liminares que impliquem movimentação na conta do trabalhador, visto que tal mudança é anterior à Emenda Constitucional nº 32/2001, que proíbe medidas provisórias com matéria processual.

 

Medida Provisória e Decreto Legislativo

Trata-se do julgamento da ADPF nº 216, a qual discute a interpretação que se deve conferir aos efeitos da Medida Provisória nº 320/06.

Esta MP tratou de questões burocráticas relativas a certas questões aduaneiras e exportação, mas não foi aprovada pelo Legislativo. O Congresso Nacional, contudo, não editou decreto legislativo para disciplinar as relações jurídicas dela decorrentes, nos termos do art. 62, § 3º, da Constituição Federal.

Nesse contexto, diversos pedidos administrativos formulados com base na referida MP ficaram pendentes e passaram a ser judicializados, gerando controvérsia apta a justificar o ajuizamento de ADPF para delimitação dos efeitos dessas relações jurídicas.

Verificando a importância da matéria e a existência de possível violação a preceitos fundamentais, o STF entendeu que sua jurisprudência admite a utilização da ADPF para questionar a interpretação judicial de norma constitucional.

No mérito, o Plenário entendeu que não se pode protrair indefinidamente os efeitos da MP recusada, devendo ser interpretado com cautela o art. 62, §11, da Constituição:

CF/88
§ 11. Não editado o decreto legislativo a que se refere o § 3º até sessenta dias após a rejeição ou perda de eficácia de medida provisória, as relações jurídicas constituídas e decorrentes de atos praticados durante sua vigência conservar-se-ão por ela regidas.

 

O efeito prático do julgado reconhece que os dispositivos da MP arquivada não podem ser utilizados para garantir a licença para exploração dos centros aduaneiros, pois inexiste direito adquirido ou ato jurídico perfeito concretamente, visto que a controvérsia revolve em torno de pedidos administrativos não apreciados.

 

Fundo Partidário e recursos destinados às candidaturas de mulheres

O STF, com base no vetor da igualdade material, julgou ação direta que tratava da distribuição de recursos do fundo partidário destinados à candidatura de mulheres, de forma a garantir uma distribuição e participação mais equânime às mulheres, que, apesar de comporem maior parte do eleitorado, têm presença ínfima nas fileiras dos cargos políticos.

Entendeu a Corte que a superação de discriminações históricas justifica e depende de um tratamento desigual, de forma a se garantir a realização de uma igualdade material:

Nesse sentido, determinadas diferenciações, se usadas para corrigir a discriminação, são legítimas. Em outras palavras, é próprio do direito à igualdade a possibilidade de uma desequiparação, desde que pontual e tenha por objetivo superar uma desigualdade histórica.

 

A interpretação definida pelo Supremo, portanto, segue o seguinte parâmetro para divisão de tais recursos, interpretando o o percentual de 30% como patamar mínimo, e não máximo:

Assim, não há como deixar de reconhecer como sendo a única interpretação constitucional admissível aquela que determina aos partidos políticos a distribuição dos recursos públicos destinados à campanha eleitoral na exata proporção das candidaturas de ambos os sexos, sendo, em vista do disposto no art. 10, § 3º, da Lei de Eleições, o patamar mínimo de 30%.

 

Também julgou inconstitucional a limitação do incentivo por três eleições, tendo em vista que devem permanecer tais diferenciações enquanto perdurar a respectiva necessidade:

Assim, é inconstitucional a fixação de um prazo, porquanto a distribuição não discriminatória dos recursos deve perdurar enquanto for justificada a composição mínima das candidaturas. Isso porque a legitimidade das políticas afirmativas depende de seu caráter temporário. A temporariedade incide, no caso em exame, nas cotas das candidaturas, não na distribuição de recursos, que não está sujeita a tratamento discriminatório.

 

Segunda Turma

Execução provisória da pena e trânsito em julgado (HC 136.720/PB)

A Segunda turma, em conclusão de julgamento, resolveu questão de ordem para julgar prejudicada a impetração em face de pedido de desistência do impetrante

 

Desacato praticado por civil contra militar e constitucionalidade

A Turma denegou o habeas corpus impetrado em prol de paciente civil, condenado pelo crime de desacato praticado contra militar.

CPM
Art. 299. Desacatar militar no exercício de função de natureza militar ou em razão dela:
Pena – detenção, de seis meses a dois anos, se o fato não constitui outro crime.

 

O órgão fracionário ratificou a visão de que, no crime de desacato, o sujeito passivo principal é a Administração Pública, tendo com bem jurídico protegido o prestígio desta e seu regular funcionamento. O servidor atingido é sujeito passivo secundário, sendo irrelevante que o mesmo se sinta ofendido.

No mais, trata-se de crime comum, praticável por qualquer pessoa, desde que o ato tenha nexo causal com a atividade pública exercida.

Nesta toada, entendeu que as previsões constitucionais e convencionais (Pacto de San Jose) acerca da liberdade de expressão não importam em direitos absolutos, razão pelas quais devem harmonizar-se com os demais direitos envolvidos, não eliminá-los. Incide, portanto, o princípio da concordância prática, pelo qual o intérprete deve buscar a conciliação entre normas constitucionais.

Por conseguinte, a figura penal do desacato não tolhe o direito à liberdade de expressão, não retirando da cidadania o direito à livre manifestação, desde que exercida nos limites de marcos civilizatórios bem definidos, punindo-se os excessos.

 

Também não aceitou o argumento de que a conduta em questão estaria acobertada pela adequação social, não podendo ser vista como crime:

Não parece ainda o caso de se invocar a teoria da adequação social como causa supralegal de exclusão da tipicidade, pela qual se preconiza que determinadas condutas, consensualmente aceitas pela sociedade, não mais se ajustam a um modelo legal incriminador. A evolução dos costumes seria fator decisivo para a verificação da excludente de tipicidade, circunstância ainda não passível de aferição, mas é preciso que o legislador atualize a legislação para punir eficazmente desvios e abusos de agentes do Estado. Havendo lei, ainda que deficitária, punindo o abuso de autoridade, pode-se afirmar que a criminalização do desacato se mostra compatível com o Estado democrático.

STF – Informativo nº 893 comentado

Plenário
RCED e competência
Vacância de cargos políticos e procedimento eleitoral
Vacância de cargos políticos e eleições
Fiscal de Rendas do Estado do Rio de Janeiro – 3
Magistratura: norma estadual e alteração no projeto original
Vício de iniciativa e fonte de custeio – 5
1ª Turma
Independência funcional das instâncias do Ministério Público
Reclamação: ADPF 130/DF e censura – 2
2ª Turma
Incitação à discriminação religiosa e liberdade de expressão
Terras indígenas e conflito de competência – 3
Fixação de Preços de Medicamentos e Valores Diferenciados – 4
Férias de 60 dias e Advogados da União

 

Plenário

RCED e competência (ADPF 167/DF)

Neste julgado, o Plenário entendeu que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) é o órgão competente para julgar os Recursos Contra Expedição de Diploma (RCED) nas eleições presidenciais e gerais (federais e estaduais). Com essa orientação, o Plenário, por maioria, julgou improcedente pedido formulado em arguição de descumprimento de preceito fundamental em face de jurisprudência fixada pelo TSE.

Em suma, o recurso contra a diplomação de senador, deputado federal, suplentes destes, governador e vice-governador é de competência do TSE. No mais, mesmo que utilizado o termo recurso, trata-se de uma ação autônoma.

Portanto, o recurso contra expedição de diploma é meio pelo qual se suscita a inelegibilidade de ordem constitucional ou surgida após o pedido de registro, ou, ainda, ausência de condição de elegibilidade. As outras ações, como a ação de impugnação de mandato eletivo (AIME), têm como fundamento abuso de poder econômico ou político, captação ou uso ilícito de recurso para fins eleitorais, captação ilícita de sufrágio, prática de conduta vedada, corrupção ou fraude.

 

Vacância de cargos políticos e procedimento eleitoral (ADI 5525/DF)

O STF, debruçando-se sobre o Código Eleitoral, entendeu que, para os casos de vacância de cargos de Presidente, Vice-Presidente e Senador, o procedimento previsto na Constituição Federal (arts. 56, §2º, e 81, §1º, da CF/88) deve prevalecer sobre o determinado no art. 224, §3º, do Código, dispensando a necessidade de trânsito em julgado para a realização de novas eleições.

Código Eleitoral
Art. 224. Se a nulidade atingir a mais de metade dos votos do país nas eleições presidenciais, do Estado nas eleições federais e estaduais ou do município nas eleições municipais, julgar-se-ão prejudicadas as demais votações e o Tribunal marcará dia para nova eleição dentro do prazo de 20 (vinte) a 40 (quarenta) dias.
§ 3º A decisão da Justiça Eleitoral que importe o indeferimento do registro, a cassação do diploma ou a perda do mandato de candidato eleito em pleito majoritário acarreta, após o trânsito em julgado, a realização de novas eleições, independentemente do número de votos anulados.

CF/88
Art. 56. Não perderá o mandato o Deputado ou Senador: (…) § 2º Ocorrendo vaga e não havendo suplente, far-se-á eleição para preenchê-la se faltarem mais de quinze meses para o término do mandato.
Art. 81. Vagando os cargos de Presidente e Vice-Presidente da República, far-se-á eleição noventa dias depois de aberta a última vaga. § 1º Ocorrendo a vacância nos últimos dois anos do período presidencial, a eleição para ambos os cargos será feita trinta dias depois da última vaga, pelo Congresso Nacional, na forma da lei

 

A Corte suscitou, ademais, que a mora para alcançar o referido trânsito em julgado antes de adotadas as previsões constitucionais seria contrária ao princípio democrático e ao princípio da soberania popular.

 

Vacância de cargos políticos e eleições (ADI 5619/DF)

Paralelamente ao julgado acima, o STF fixou a seguinte tese no que diz respeito à vacância do cargo de Prefeito, para municípios com menos de duzentos mil eleitores, caso em que a eleição é vencida por maioria simples sem necessidade de segundo turno:

É constitucional legislação federal que estabeleça novas eleições para os cargos majoritários simples — isto é, Prefeitos de Municípios com menos de duzentos mil eleitores e Senadores da República — em casos de vacância por causas eleitorais”.

 

Para o Tribunal, a previsão legal de se realizar uma nova eleição prestigia o Legislativo e o princípio democrático, razão pela qual não haveria inconstitucionalidade.

 

Fiscal de Rendas do Estado do Rio de Janeiro (ADI 2877/RJ)

O Plenário analisou a Constituição do Estado do RJ e a Lei Complementar estadual nº 107/2003, que trata das carreiras de fiscalização tributária.

Em suma, o STF entendeu inconstitucional ou deu interpretação conforme aos dispositivos da lei combatida que obrigavam a participação da OAB, do Ministério Público ou do Conselho Regional de Contabilidade no Conselho Superior da Fiscalização Tributária, tornando facultativa tais participações.

 

Magistratura: norma estadual e alteração no projeto original (ADI 1834/SC)

O Plenário da Corte apreciou legislação estadual relativa à classificação de comarcas e reclassificação de entrâncias no Estado de Santa Catarina.

O STF julgou com base na manutenção do sistema de acesso aos tribunais de segundo grau por antiguidade e merecimento, alternadamente, no que se refere aos juízes da última entrância. A antiguidade conta-se em cada entrância, sendo vedado norma infraconstitucional equiparar magistrados de entrâncias diversas para efeito de promoção por antiguidade.

 

Vício de iniciativa e fonte de custeio (ADI 3628)

Neste julgamento, o STF julgou inconstitucional previsão normativa que transferia do Estado o ônus financeiros de aposentadorias e pensões de membros de Poderes de Estado, MP e TCE para entidade autônoma de previdência (Amapá Previdência).

O Plenário entendeu que houve violação do equilíbrio financeiro e atuarial, pois a obrigação viria desacompanhada de qualquer contraprestação pecuniária ou custeio para garantir liquidez aos benefícios.

No que diz respeito às emendas parlamentares ao projeto, entendeu não haver vício, pois não houve aumento de despesas ou impertinência temática.

 

Primeira Turma

Independência funcional das instâncias do Ministério Público

Com base nos princípios da independência funcional e do promotor natural, a Primeira Turma do STF denegou habeas corpus onde se pleiteava nulidade de cisão de denúncia oferecida pelo MPF e posteriormente ratificada pelo MPE com respectivos aditamentos.

A Turma afirmou que seria possível o aditamento da denúncia a qualquer tempo antes da sentença final, garantidos o devido processo legal, a ampla defesa e o contraditório, máxime quando a inicial ainda não tenha sido sequer recebida originariamente pelo juízo competente, como se deu na espécie.

 

Nesse contexto, o princípio da independência funcional garante uma atuação técnica e juridicamente livre de imposições externas à compreensão do promotor atuante, bem como desvinculada e não subordinada a outras manifestações de órgãos superiores da instituição no que diz respeito ao estrito exercício das atividades jurídicas.

 

Reclamação: ADPF 130/DF e censura – 2

Nesta reclamação, pautada no descumprimento da decisão do STF sobre a Lei de Imprensa, a Turma deu procedência à pretensão dos reclamantes, autorizando a permanência de matéria em sítio eletrônico de notícias. Os fundamentos da decisão giram em torno das noções de livre acesso à informação, vedação da censura e livre manifestação do pensamento.

No mais, entendeu o órgão fracionário que a matéria tinha teor crítico, mas não ofensivo ao ponto de justificar sua retirada. A medida extrema, portanto, não teria espaço num contexto democrático, devendo tais conflitos serem resolvidos pelas vias do direito de respostas, da responsabilidade civil ou de retificações.

Via de regra, a colisão da liberdade de expressão com os direitos da personalidade deve ser resolvida pela retificação, pelo direito de resposta ou pela reparação civil. Concluiu pela existência de interesse público presumido na livre circulação de ideias e opiniões. Ademais, a pessoa retratada se apresentou como pessoa pública a atuar em espaço público, sujeita, portanto, a um grau de crítica maior.

 

Segunda Turma

Incitação à discriminação religiosa e liberdade de expressão

A Segunda Turma analisou recurso ordinário em habeas corpus e denegou a ordem com base no entendimento de que a incitação ao ódio público contra quaisquer denominações religiosas e seus seguidores não está protegida pela cláusula constitucional que assegura a liberdade de expressão.

O caso teria acontecido por meio da Internet, e a denúncia seria pautada na Lei de Discriminação (Lei 7.716/89):

Art. 20. Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional.
Pena: reclusão de um a três anos e multa.
§ 1º Fabricar, comercializar, distribuir ou veicular símbolos, emblemas, ornamentos, distintivos ou propaganda que utilizem a cruz suástica ou gamada, para fins de divulgação do nazismo.
Pena: reclusão de dois a cinco anos e multa.
§ 2º Se qualquer dos crimes previstos no caput é cometido por intermédio dos meios de comunicação social ou publicação de qualquer natureza:
Pena: reclusão de dois a cinco anos e multa.

 

A Turma observou o exercício irregular das liberdades de manifestação do paciente, o qual desbordou os limites constitucionais do direito. Anotou a Turma que:

Nessa medida, os postulados da igualdade e da dignidade pessoal dos seres humanos constituem limitações externas à liberdade de expressão, que não pode e não deve ser exercida com o propósito subalterno de veicular práticas criminosas tendentes a fomentar e a estimular situações de intolerância e de ódio público.

 

Terras indígenas e conflito de competência – 3 (RE 541737/SC)

Acolhida questão de ordem para julgar prejudicado recurso

 

Fixação de Preços de Medicamentos e Valores Diferenciados – 4 (RMS 26575/DF)

Homologou-se o pedido de desistência de recurso ordinário em mandado de segurança.

 

Férias de 60 dias e Advogados da União (ARE 996895/SE)

A Segunda Turma, por maioria, conheceu e deu provimento a embargos de declaração, para o efeito de conhecer de recurso extraordinário e reconhecer a existência de repercussão geral da questão relativa à possibilidade de Advogados da União usufruírem sessenta dias de férias.

Esta decisão apenas delimitou a repercussão geral da matéria e viabilizou o recurso extraordinário interposto.

STF – Informativo nº 892 comentado

Plenário
Código Florestal e constitucionalidade – 3
Transgêneros e direito a alteração no registro civil
Correção monetária e planos econômicos – 3
Repercussão Geral
Causa de inelegibilidade e trânsito em julgado – 4
1ª Turma
Prazo decadencial e direito de representação – 2
2ª Turma
Recurso extraordinário e acordão proferido em processo administrativo
Decisão judicial transitada em julgado e “habeas corpus”

Plenário

Código Florestal e constitucionalidade – 3

Trata-se do julgamento da constitucionalidade de diversos dispositivos do Código Florestal (Lei nº 12.651/2012), motivada pelo ajuizamento de múltiplas ações diretas de inconstitucionalidade.

O parâmetro geral que orientou o julgamento foi o art. 225, da Constituição, que nos apresenta o direito fundamental a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem jurídico de índole difusa que deve ser protegido para as presentes e futuras gerações.

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações.

Ressaltou a Corte o caráter dúplice do dispositivo, o qual define como direito o meio ambiente ecologicamente equilibrado, mas que também impõe o dever de defendê-lo também à coletividade.

Entretanto, o direito em questão, em um contexto amplo e sistemático, há de se conciliar com “outros valores democraticamente eleitos pelos legisladores, como o mercado de trabalho, o desenvolvimento social, o atendimento às necessidades básicas de consumo dos cidadãos etc.”, no dizer do Tribunal.

Em suma, o que quer dizer o STF é que o parâmetro ambiental não é absoluto ou final para a definição da constitucionalidade de uma norma ou postura, existindo outros fatores que também hão de ser levados em consideração para tal apreciação. Expôs a Corte:

Não se deve desprezar que a mesma Constituição que protege o meio ambiente também exorta o Estado brasileiro a garantir a livre iniciativa (CF, artigos 1º, IV, e 170) e o desenvolvimento nacional (CF, art. 3º, II), a erradicar a pobreza e a marginalização, e a reduzir as desigualdades sociais e regionais (CF, artigos 3º, III, e 170, VII), a proteger a propriedade (CF, artigos 5º, “caput” e XXII, e 170, II), a buscar o pleno emprego (CF, artigos 170, VIII, e 6º) e a defender o consumidor (CF, artigos 5º, XXXII, e 170, V).

 

Entendeu o Supremo que o antagonismo normativo entre meio ambiente e desenvolvimento é apenas aparente, sendo inevitável que a atuação do homem tenha impactos no ambiente em que se insere, até mesmo por fazer parte de tal realidade. No mais, reforçou que a definição de políticas sobre o sensível assunto é questão que deve ser abordada nos adequados meios democráticos, e não de forma unilateral pela Justiça, mesmo que por juízes bem intencionados:

Meio ambiente e desenvolvimento econômico encerram conflito normativo aparente, a envolver diversas nuances, em especial a justiça intergeracional, demandando escolhas trágicas a serem realizadas pelas instâncias democráticas, e não pela convicção de juízes, por mais bem-intencionados que sejam.
Ademais, o princípio da vedação ao retrocesso não se sobrepõe ao princípio democrático, no afã de transferir ao Judiciário funções inerentes aos Poderes Legislativo e Executivo, e nem justifica afastar arranjos legais mais eficientes para o desenvolvimento sustentável do país como um todo, na linha do que decidido no RE 586.224/SP.

Esta nota final ratifica a visão de separação harmônica das funções (poderes) republicanas (art. 2º, da CF) e privilegia a visão de que os órgãos legislativos e executivos são os legitimados e mais hábeis à condução e à definição de políticas públicas relativas ao meio ambiente e ao desenvolvimento econômico.

 

Transgêneros e direito a alteração no registro civil

Com fundamento no direito fundamental à igualdade, na dignidade da pessoa humana, na inviolabilidade da intimidade e em outros preceitos, definiu o Plenário que “o direito à igualdade sem discriminações abrange a identidade ou a expressão de gênero.”. Na mesma esteira, entendeu que a identidade de gênero é questão íntima a pessoa, não cabendo ao Estado impô-la aos indivíduos.

Nesse contexto, a ação direta ajuizada foi julgada procedente para conferir interpretação conforme a Constituição do art. 58 da Lei nº 6.015/73 (lei de registros públicos), permitindo-se aos transgêneros, independentemente da cirurgia de transgenitalização, ou da realização de tratamentos hormonais ou patologizantes, o direito à alteração de prenome e gênero diretamente no registro civil.

O entendimento majoritário não trouxe outros empecilhos, de forma que se dispensa idade mínima, a apresentação de laudos médicos ou ajuizamento de demanda judicial.

 

Correção monetária e planos econômicos – 3

Trata-se da controvérsia judicial sobre diferenças pecuniárias decorrentes de efeitos financeiros de planos econômicos (Bresser, Verão, Collor I, etc.) sobre a correção monetária de investimentos da caderneta de poupança (expurgos inflacionários).

Foi realizado um acordo bilionário, ora homologado pelo STF:

Os termos do acordo preveem o pagamento de mais de 12 bilhões de reais aos poupadores, que serão inscritos em plataforma digital preparada pelo CNJ. Os bancos irão analisar os requerimentos dos interessados, que terão direito de recorrer a nova análise.

 

A curiosidade do caso é a realização de acordo dentro de um procedimento objetivo (ADPF). Nesta situação, o STF não aborda as teses jurídicas trazidas.

 

Causa de inelegibilidade e trânsito em julgado – 4

Neste julgado, o STF abordou a possibilidade de aplicação de hipóteses de inelegibilidade inseridas no ordenamento em 2010 (Lei da ficha limpa) a ilícitos perpetrados anteriormente à mudança legislativa.

O Tribunal fixou a seguinte tese de repercussão geral:

A condenação por abuso do poder econômico ou político em ação de investigação judicial eleitoral, transitada em julgado, “ex vi” do artigo 22, inciso XIV, da Lei Complementar 64/90, em sua redação primitiva (2), é apta a atrair a incidência da inelegibilidade do artigo 1º, inciso I, alínea “d”, na redação dada pela Lei Complementar 135/2010, aplicando-se a todos os processos de registros de candidatura em trâmite.

Dessa forma, as condenações transitadas em julgado antes da Lei Complementar nº 135/2010 também se sujeitam à regulação trazida por esta, tornando inelegíveis por 8 anos os respectivos candidatos condenados.

 

Primeira Turma

Prazo decadencial e direito de representação – 2

Neste habeas corpus, o STF entendeu que permanece aplicável a Súmula nº 608, da própria Corte, após as mudanças legislativas que se operaram sobre os crimes contra a dignidade sexual (Título VI, do Código Penal).

O caso de fundo envolve a suposta prática de atentado violento ao pudor (hoje se enquadra em estupro). O acusado buscou a extinção precoce da ação penal sob a alegação de que houve decadência do prazo de representação da vítima.

CP: Art. 103. Salvo disposição expressa em contrário, o ofendido decai do direito de queixa ou de representação se não o exerce dentro do prazo de 6 (seis) meses, contado do dia em que veio a saber quem é o autor do crime, ou, no caso do § 3º do art. 100 deste Código, do dia em que se esgota o prazo para oferecimento da denúncia.

CP: Art. 225. Nos crimes definidos nos Capítulos I e II deste Título, procede-se mediante ação penal pública condicionada à representação.
Parágrafo único. Procede-se, entretanto, mediante ação penal pública incondicionada se a vítima é menor de 18 (dezoito) anos ou pessoa vulnerável.

 

Os Ministros da Primeira Turma, entretanto, observaram que as instâncias inferiores concluíram que o crime foi praticado mediante violência real, o que motivaria a aplicação da Súmula nº 608, do STF, e consequente manutenção da persecução penal, tendo em vista a inexistência de decadência ou prescrição.

Súmula nº 608, STF: No crime de estupro, praticado mediante violência real, a ação penal é pública incondicionada.

 

Segunda Turma

Recurso extraordinário e acordão proferido em processo administrativo

A Segunda Turma entendeu que não é viável a interposição de recurso extraordinário contra acórdão do TST no bojo de procedimento administrativo-disciplinar, visto que não se trata de demanda judicial.

 

Decisão judicial transitada em julgado e “habeas corpus”

A Turma entendeu que é cabível a impetração de habeas corpus contra decisão transitada em julgado quando o argumento for a nulidade manifesta do processo.

CPP: Art. 648. A coação considerar-se-á ilegal:
VI – quando o processo for manifestamente nulo;

Entretanto, os Ministros não se convenceram da alegada nulidade, tendo em vista a fundamentação lacônica e a falta de demonstração da conexão entre os pontos de interesse do paciente.

 

STF – Informativo nº 891 comentado

Plenário
Código Florestal e constitucionalidade – 2
1ª Turma
Inexigibilidade de licitação e tipicidade da conduta
2ª Turma
Execução provisória da pena e trânsito em julgado
Gestantes e mães presas preventivamente e “habeas corpus” coletivo

Plenário

Código Florestal e constitucionalidade – 2 (ADC 42/DF e outros)

Julgamento suspenso.

 

Primeira Turma

Inexigibilidade de licitação e tipicidade da conduta (Inq. 3962/DF)

Neste caso, a Turma rejeitou denúncia apresentada em desfavor de parlamentar federal pela suposta prática da conduta prevista no art. 89, da Lei nº 8.666/93:

Art. 89. Dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses previstas em lei, ou deixar de observar as formalidades pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade:
Pena – detenção, de 3 (três) a 5 (cinco) anos, e multa.
Parágrafo único. Na mesma pena incorre aquele que, tendo comprovadamente concorrido para a consumação da ilegalidade, beneficiou-se da dispensa ou inexigibilidade ilegal, para celebrar contrato com o Poder Público.

 

A Turma rejeitou a denúncia oferecida, tendo em vista que não se convenceu da existência de materialidade criminosa. Argumentou que a mera existência de irregularidades não seria o suficiente para configurar o crime, que necessita da existência de violação a princípios cardeais da Administração Pública.

O delito em questão exige, além do dolo genérico — representado pela vontade consciente de dispensar ou inexigir licitação com descumprimento das formalidades —, a configuração do especial fim de agir, que consiste no dolo específico de causar dano ao erário ou de gerar o enriquecimento ilícito dos agentes envolvidos na empreitada criminosa.

Para reforçar esse entendimento, suscitou a existência de elementos que corroboram a tese defensiva, como a existência de pareceres favoráveis.

 

Segunda Turma

Execução provisória da pena e trânsito em julgado

A Segunda Turma afetou ao Plenário o julgamento de habeas corpus em que se discute a possibilidade de execução provisória da pena após o julgamento de recurso em segundo grau de jurisdição.

 

Gestantes e mães presas preventivamente e “habeas corpus” coletivo (HC 143641/SP)

A Segunda Turma concedeu a ordem em habeas corpus coletivo impetrado pela Defensoria Pública da União em favor de todas as mulheres presas preventivamente que ostentem a condição de gestantes, de puérperas (condição pós-parto) ou de mães de crianças sob sua responsabilidade, permitindo a prisão domiciliar de tais pacientes, sem prejuízo de outras medidas:

CPP: Art. 319. São medidas cautelares diversas da prisão:
I – comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo juiz, para informar e justificar atividades;
II – proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações;
III – proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela permanecer distante;
IV – proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja conveniente ou necessária para a investigação ou instrução;
V – recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos;
VI – suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais;
VII – internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes praticados com violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser inimputável ou semi-imputável (art. 26 do Código Penal) e houver risco de reiteração;
VIII – fiança, nas infrações que a admitem, para assegurar o comparecimento a atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial;
IX – monitoração eletrônica.

Entretanto, como exceção, entendeu a Segunda Turma que a ordem não beneficia acusadas por crimes praticados mediante violência ou grave ameaça contra seus descendentes ou, ainda, em situações excepcionalíssimas, as quais deverão ser devidamente fundamentadas pelos juízes que denegarem o benefício.

A decisão em questão privilegia a visão de excepcionalidade da prisão como medida cautelar e a proteção constitucional e legal da infância (art. 227, da CF/88, e ECA).

CF/88: Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

STF – Informativo nº 890 comentado

Plenário
Planos de saúde e direito do consumidor
Lei estadual e requisição de pequeno valor
Planos e seguros privados de assistência à saúde
Planos e seguros privados de assistência à saúde e ressarcimento ao SUS
Responsabilidade subsidiária da Administração Pública por débitos trabalhistas – 2
Comunidade dos quilombos e decreto autônomo – 10
1ª Turma
Prescrição da pretensão punitiva e execução imediata da pena
2ª Turma
Quebra de sigilo telefônico e telemático
Progressividade das alíquotas de ITR e Território Rural

Plenário

Planos de saúde e direito do consumidor (ADI 4512/MS)

O Plenário apreciou ação direta que discutia a criação de obrigação aos planos de saúde por meio de lei estadual. Para a Corte, o Estado do MS agiu dentro de sua competência constitucional (proteção do consumidor e acesso à informação) ao determinar que os planos de saúde fornecessem comprovante e informações pertinentes a eventuais recusas em face dos beneficiários.

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: XXXII – o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor;

Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre: VIII – responsabilidade por dano ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico;

Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: V – defesa do consumidor;

Para o STF, a competência privativa relacionada com planos e seguros de assistência à saúde abrange apenas as questões contratuais e securitárias gerais, sob atuação centralizada da União.

Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: VII – política de crédito, câmbio, seguros e transferência de valores;

 

Lei estadual e requisição de pequeno valor

O STF entendeu que é lícito aos entes federados fixar o valor máximo para enquadramento no pagamento por meio de requisição de pequeno valor (RPV), desde que se obedeça ao princípio constitucional da proporcionalidade.

No caso, o Estado de Rondônia fixou como parâmetro para enquadramento o valor de dez salários mínimos. O STF, considerando o IDH da referida unidade federativa, não vislumbrou violação ao princípio da proporcionalidade.

Obs: quando não há previsão legislativa local sobre o patamar máximo de dívidas públicas para pagamento por meio de RPV, aplica-se o que prevê o art. 87, do ADCT: I – quarenta salários-mínimos, perante a Fazenda dos Estados e do Distrito Federal; II – trinta salários-mínimos, perante a Fazenda dos Municípios.

 

Planos e seguros privados de assistência à saúde (ADI 1931/DF)

O Plenário se debruçou sobre dispositivos da Lei nº 9.656/98, que dispõe sobre planos e seguros privados de saúde, e entendeu que certas modificações trazidas pela MP nº 2.177-44/01 seria inconstitucionais por violação do art. 5º, XXXVI, da Constituição.

XXXVI – a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada;

As novas regras não poderiam afetar contratos aperfeiçoados anteriormente, como pretendia a nova legislação, sob pena de ferimento de tais preceitos constitucionais.

Em relação a outros dispositivos impugnados, o STF rechaçou a existência de inconstitucionalidade com base em diversos parâmetros constitucionais, como a defesa e auxílio dos idosos (art. 230, da CF), a defesa do consumidor (art. 170, da CF) e a promoção da saúde (art. 196, da CF).

A Corte também se pronunciou sobre disposição que determina o ressarcimento dos cofres públicos quando o agente privado de saúde se beneficiar do atendimento público gratuito prestado pelo Estado, mesmo possuindo a obrigação contratual de prestar tal atendimento. 

A escolha do agente privado de atuar na prestação de relevantes serviços à saúde, de forma concorrente com o Estado, pressupõe a responsabilidade de arcar integralmente com as obrigações assumidas. A norma impede o enriquecimento ilícito das empresas e a perpetuação de modelo no qual o mercado de serviços de saúde submeta-se unicamente à lógica do lucro, ainda que às custas do erário. Entendimento em sentido contrário resultaria em situação em que os planos de saúde recebem pagamentos mensais dos segurados, mas os serviços continuam a ser fornecidos pelo Estado, sem contrapartida.

 

Planos e seguros privados de assistência à saúde e ressarcimento ao SUS

Na mesma toada do julgamento acima, neste RE o STF decidiu que o ressarcimento previsto no art. 32, da Lei nº 9.656/98.

Art. 32.  Serão ressarcidos pelas operadoras dos produtos de que tratam o inciso I e o § 1o do art. 1o desta Lei, de acordo com normas a serem definidas pela ANS, os serviços de atendimento à saúde previstos nos respectivos contratos, prestados a seus consumidores e respectivos dependentes, em instituições públicas ou privadas, conveniadas ou contratadas, integrantes do Sistema Único de Saúde – SUS.

 

Responsabilidade subsidiária da Administração Pública por débitos trabalhistas – 2

O STF entendeu que houve perda superveniente do objeto das reclamações.

 

Comunidade dos quilombos e decreto autônomo – 10

A demanda em questão aborda decreto que demarca e desapropria terras em prol de comunidades quilombolas.

Assim, ao determinar que fossem levados em consideração, na medição e na marcação da terra, os critérios de territorialidade indicados pelos remanescentes das comunidades quilombolas, longe de submeter o procedimento demarcatório ao arbítrio dos próprios interessados, a norma positivaria o devido processo legal, na garantia de que as comunidades envolvidas tivessem voz e fossem ouvidas. Portanto, não haveria vício de inconstitucionalidade no procedimento de desapropriação previsto no Decreto 4.887/2003.

Obs: é importante perceber que decretos usualmente são atos normativos secundários, inaptos a serem objetos de ação direta. No caso, entretanto, a maioria dos Ministros entendeu que o Decreto 4.887/2003 teria abstração e generalidade normativa suficiente para se submeter ao controle. “A aferição de constitucionalidade dos decretos, na via da ação direta, só seria vedada quando estes se adstringissem ao papel secundário de regulamentar normas legais, cuja inobservância ensejasse apenas conflito resolúvel no campo da legalidade.”.

 

Primeira Turma

Prescrição da pretensão punitiva e execução imediata da pena

Trata-se de curiosa situação de apreciação de Recurso Especial pelo STF. Isso só é possível em virtude da investidura em cargo com foro privilegiado na fase recursal. No caso, a autoridade municipal foi condenada e, posteriormente, apresentou recurso especial. Em seguida, tomou posse em cargo de deputado federal, atraindo a competência do STF para julgar o recurso.

No julgamento em si, o STF desproveu o apelo, entendendo que se pretendia revolvimento de matéria fático-probatória, medida inviável na esfera dos recursos extraordinários.

 

Segunda Turma

Quebra de sigilo telefônico e telemático

Neste recurso ordinário em habeas corpus, a Segunda Turma entendeu que a interceptação telefônica pode ser decretada com fundamento em denúncia (notícia de crime) que ao menos indique sua autoria. Nestas circunstâncias, não estar-se-ia diante de uma denúncia propriamente anônima.

Nota: o recurso ordinário para o STF neste caso deriva do art. 102, II, “a”, da CF/88, que se refere ao habeas corpus denegado no âmbito dos tribunais superiores em julgamento originário (casos com foro privilegiado).

Também argumentou que outros elementos preliminares reforçaram os fundamentos necessários para adoção das medidas investigativas e para a evidência de materialidade e autoria, como a existência de informações provenientes do Ministério da Justiça e da Controladoria-Geral da União.

No que diz respeito ao sigilo de correspondência, entendeu a Turma que a exceção alcança inclusive as comunicações telemáticas (como e-mails), razão pela qual não existe vício nesta interceptação.

 

Progressividade das alíquotas de ITR e Território Rural

A Segunda Turma, reconhecendo o caráter extrafiscal do imposto sobre propriedade territorial rural (ITR), de competência da União.

Nota: a extrafiscalidade é uma característica de certos tributos que denota uma função além da mera captação de recursos pelo Estado (caráter fiscal, como o imposto de renda). No caso do ITR, a Constituição revela que o mesmo busca forçar o uso produtivo da terra rural, beneficiando especialmente pequenas glebas.

Alguns dispositivos constitucionais são relevantes:

Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre: VI – propriedade territorial rural;
§ 4º O imposto previsto no inciso VI do caput:
I – será progressivo e terá suas alíquotas fixadas de forma a desestimular a manutenção de propriedades improdutivas;
II – não incidirá sobre pequenas glebas rurais, definidas em lei, quando as explore o proprietário que não possua outro imóvel;
III – será fiscalizado e cobrado pelos Municípios que assim optarem, na forma da lei, desde que não implique redução do imposto ou qualquer outra forma de renúncia fiscal.

Para a Turma, não há inconstitucionalidade na progressividade de alíquotas em razão do tamanho da propriedade, tendo em vista que este é um parâmetro que funciona em conjunto com a percepção do grau de utilização da terra para definir aspectos de produtividade.

 

STF – Informativo nº 889 comentado

Plenário
Agências reguladoras e função normativa

Agências reguladoras e função normativa

Na ADI nº 4874/DF, o Supremo julgou improcedente o pedido formulado em face de dispositivo da Lei nº 9.782/99 e, sucessivamente, da Resolução nº 14/2012 da Anvisa. A questão de fundo diz respeito à regulação da indústria do tabaco e envolve a atuação normativa da Anvisa na definição de aspectos técnicos da produção e comercialização da referida droga.

Nota: lembre-se que, tecnicamente, o pedido sucessivo impróprio, ou subsidiário, é aquele que é apreciado apenas se o pedido principal cair em improcedência. Em se tratando de pedido sucessivo próprio, a rejeição do principal implica a do subsidiário. Neste caso, o pedido sucessivo próprio apenas é apreciado se o principal for procedente.

O objeto legal em questão é o seguinte:

Art. 7º Compete à Agência proceder à implementação e à execução do disposto nos incisos II a VII do art. 2º desta Lei, devendo:
III – estabelecer normas, propor, acompanhar e executar as políticas, as diretrizes e as ações de vigilância sanitária;
XV – proibir a fabricação, a importação, o armazenamento, a distribuição e a comercialização de produtos e insumos, em caso de violação da legislação pertinente ou de risco iminente à saúde;

Para o autor da ação, tais dispositivos estariam conferindo amplos poderes normativos à Anvisa, razão pela qual seria necessária a interpretação conforme a Constituição para reduzir tais prerrogativas. Como resultado desse entendimento, apenas deveria ser possível a interpretação de que tais competências da Anvisa servem para regular situações concretamente, e não abstratamente.

Nota: a interpretação conforme a constituição, sem redução de texto, é uma técnica de julgamento em controle de constitucionalidade por meio da qual se reconhece a inconstitucionalidade de possíveis interpretações do texto normativo, mantendo íntegro o texto discutido, mas orientando o aplicador na direção da interpretação compatível com a Constituição. Para que a medida faça sentido, é necessário que o objeto da ação admita mais de uma interpretação (seja, portanto, polissêmico).

O STF, em decisão apertada, discordou da tese autoral, argumentando que os dispositivos legais não são polissêmicos. Entendeu que admitem, portanto, apenas uma interpretação, que seria constitucional no ver da Corte. Essa interpretação revolve em torno do fato de que a competência da Anvisa é executiva e guiada pelas políticas públicas aprovadas em conjunto pelo Executivo e Legislativo, sempre em estrita observância do disposto na lei, mesmo que a autarquia apresente poderes normativos para uma melhor regulação de questões técnicas. A agência não teria os poderes normativos originários amplos suscitados na ação e não teria extrapolado de seu devido nicho operativo.

A função normativa das agências reguladoras, no entanto, notadamente quando atinge direitos e deveres dos administrados ligados ao Estado tão somente por vínculo de sujeição geral, subordina-se necessariamente ao que disposto em lei. Assim, embora dotadas de considerável autonomia, a medida da competência normativa em que são investidas as agências reguladoras será aquela perfeitamente especificada nas leis pelas quais são criadas (ADI 4874).

Em comentários paralelos (obiter dictum), o STF expôs aspectos relevantes do papel das agências reguladoras na conformação atual da Administração Pública:

O Plenário registrou que o advento das agências reguladoras setoriais representa inegável aperfeiçoamento da arquitetura institucional do Estado de Direito contemporâneo no sentido do oferecimento de uma resposta da Administração Pública para fazer frente à complexidade das relações sociais verificadas na modernidade. A exigência de agilidade e flexibilidade cada vez maiores do Estado diante das ininterruptas demandas econômicas e sociais que lhe são direcionadas levou à emergência de estruturas administrativas relativamente autônomas e independentes — as chamadas agências — dotadas de mecanismos aptos e eficazes para a regulação de setores específicos, o que inclui a competência para editar atos qualificados como normativos. Nesse contexto, o escopo do modelo regulatório adotado no Brasil não se reduz à regulação concorrencial, não se limitando à correção das chamadas “falhas de mercado”. Pelo contrário, incorpora também instrumentos necessários para o atingimento de objetivos gerais de interesse público: regulação social, e não apenas econômica (ADI 4874).

STF – Informativo nº 888 comentado

Plenário
Acordo de colaboração premiada e delegado de polícia
Embargos de declaração em embargos de declaração e efeitos infringentes – 3
Imunidade formal do Presidente da República e aplicabilidade a codenunciados
1ª Turma
Empresas Públicas e execução de débitos via precatório
Lei de Anistia e prescrição de crimes de lesa-humanidade – 2
Repercussão geral e reclamação: impossibilidade
2ª Turma
“Habeas corpus” e medida cautelar de afastamento de cargo público

Plenário

Acordo de colaboração premiada e delegado de polícia (ADI 5.508/DF)

Houve adiamento do julgamento.

A matéria discutida, vale frisar, diz respeito ao art. 4º, §§2º e 6º, da Lei nº 12.850/13 (organizações criminosas), que tratam da chamada colaboração premida (gênero do qual faz parte a delação premiada), especificamente sobre os poderes do Delegado neste contexto.

O art. 4º, §2º, da referida lei, dispõe que o Ministério Público, a qualquer momento, e o Delegado de Polícia, durante o curso do inquérito, poderão requerer ou representar ao Judiciário pela concessão dos benefícios legais ao indivíduo colaborador.

§2º Considerando a relevância da colaboração prestada, o Ministério Público, a qualquer tempo, e o delegado de polícia, nos autos do inquérito policial, com a manifestação do Ministério Público, poderão requerer ou representar ao juiz pela concessão de perdão judicial ao colaborador, ainda que esse benefício não tenha sido previsto na proposta inicial, aplicando-se, no que couber, o art. 28 do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal).

O parágrafo sexto, a seu turno, possibilita que o Delegado e membros do MP façam as negociações, na mesma esteira em que veda a atuação do julgador em tais atos:

§6º O juiz não participará das negociações realizadas entre as partes para a formalização do acordo de colaboração, que ocorrerá entre o delegado de polícia, o investigado e o defensor, com a manifestação do Ministério Público, ou, conforme o caso, entre o Ministério Público e o investigado ou acusado e seu defensor.

 

Embargos de declaração em embargos de declaração e efeitos infringentes – 3 (AP 565 ED-ED/RO)

Neste julgado, o Plenário ratificou a tese segundo a qual o empate no julgamento de ação penal deve privilegiar a corrente mais favorável ao réu. É posicionamento que prestigia vetores e princípios interpretativos comezinhos ao Direito Penal e ao Direito Processual Penal, como a aplicação da norma mais favorável, favor rei e in dubio pro reo.

Neste mesmo julgamento, esteve em debate situação de dupla penalização do réu (bis in idem), circunstância também rechaçada pela Corte. Prevaleceu o voto do Ministro Dias Toffoli no sentido de que o manuseio de circunstâncias relativas à conduta social e personalidade em duplicidade (para incrementar a culpabilidade e impor majorante ao fato) seria vedado pelo ordenamento jurídico.

 

Imunidade formal do Presidente da República e aplicabilidade a codenunciados (Inq 4483 e Inq 4327)

O Plenário asseverou que:

A imunidade formal prevista no art. 51, I, e no art. 86, “caput”, da Constituição Federal (1) (2), tem por finalidade tutelar o exercício regular dos cargos de Presidente da República e de Ministro de Estado, razão pela qual não é extensível a codenunciados que não se encontram investidos em tais funções.

Esta imunidade, lembre-se, diz respeito à necessidade de a Câmara dos Deputados autorizar a instauração de processo contra o Presidente, seu vice e ministros. É uma condição de procedibilidade para o processo contra tais figuras republicanas. Trata-se, ademais, de uma decisão de cunho político-jurídico.

A decisão da Câmara favorável ao Presidente e Ministros envolvidos, entretanto, não beneficia terceiros que não se encontram investido nestes cargos. Nessa toada, o STF entendeu que o desmembramento da ação penal e continuidade do procedimento penal em face dos demais acusados pelos respectivos Juízos competentes é regular.

Primeira Turma

Empresas Públicas e execução de débitos via precatório (RE 851.711)

A Turma ratificou que as empresas públicas e sociedades de economia mista não têm direito à prerrogativa de execução via precatório. Ou seja, suas dívidas estão sujeitas aos mesmos métodos de cobrança disponíveis contra dívidas de qualquer outra empresa privada.

Trata-se de repercussão necessária da submissão ao regime jurídico de direito privado e da observância ao princípio da livre concorrência (art. 170, IV, da CF/88). No mais, é importante rememorar que a exploração direta de atividade econômica pelo Estado é medida excepcional, decorrente de duas hipóteses: a) motivos de segurança nacional e b) existência de relevante interesse coletivo.

Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei.
§ 1º A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, dispondo sobre:
II – a sujeição ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto aos direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributários

O entendimento permanece inclusive para as empresas que se focam na prestação de serviços públicos. Para estas, o mais adequado seria a adoção da forma autárquica.

 

Lei de Anistia e prescrição de crimes de lesa-humanidade – 2 (Ext 1270/DF)

A Turma definiu que o crime de sequestro, por ser permanente, não prescreve enquanto não for encontrada a pessoa ou o corpo, sendo este julgado interessante pelas suas repercussões sobre delitos ocorridos durante períodos ditatoriais porque passaram diversos países latino-americanos.

Este caso em específico trata de extradição solicitada pelo governo argentino contra indivíduo acusado de participar em crimes de sequestro, tortura e outros. O voto majoritário entendeu que não havia prescrição a ser declarada, razão pela qual os fatos ainda seriam puníveis.

 

Repercussão geral e reclamação: impossibilidade

O caso trata de terceirização no âmbito da Administração Pública, notadamente a responsabilidade do Estado por dívidas trabalhistas de empresas com que manteve contrato de prestação de serviços terceirizados.

A Primeira Turma entendeu que, em virtude do julgamento do RE 760.931, a ADC 16 não poderia ser parâmetro para o ajuizamento de reclamação, pois houve substituição da tese firmada nesta pela firmada naquela. O entendimento vigente, bem semelhante ao anterior, aprecia o tema nº 246 de Repercussão Geral e expõe que:

[…] o inadimplemento dos encargos trabalhistas dos empregados do contratado não transfere automaticamente ao Poder Público contratante a responsabilidade pelo seu pagamento, seja em caráter solidário ou subsidiário, nos termos do art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/93.

A Turma também asseverou que a má aplicação da tese firmada há de ser combatida pelos recursos previstos na lei, tendo em vista que é inadmissível reclamação proposta para garantir a observância de acórdão de recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida ou de acórdão proferido em julgamento de recursos extraordinário ou especial repetitivos, quando não esgotadas as instâncias ordinárias, nos moldes do art. 988, §5º, II, do CPC. O dispositivo visa a frear o ajuizamento de reclamações e impedir a transformação da mesma em substituto recursal.

 

Segunda Turma

Habeas corpus e medida cautelar de afastamento de cargo público

Decidiu a Segunda Turma:

O “habeas corpus” pode ser empregado para impugnar medidas cautelares de natureza criminal diversas da prisão. Com base nessa orientação, ao concluir o julgamento conjunto de duas impetrações, a Segunda Turma, por maioria, concedeu a ordem para revogar a suspensão do exercício da função pública de Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Amapá e demais medidas cautelares pessoais impostas pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Para a maioria dos ministros integrantes, o remédio constitucional em questão pode ser utilizado quando interesses não patrimoniais diversos da liberdade locomotiva sejam afetados. A Turma também observou a duração prolongada e desproporcional da medida cautelar imposta.

STF – Informativo nº 887 comentado

Plenário
ADI e imunidade parlamentar
1ª Turma
Substituição de prisão preventiva por domiciliar e cuidados maternos
Repercussão geral e sobrestamento de processo-crime – 2
“Habeas corpus” e visita íntima
2ª Turma
Reclamação e índice de atualização de débitos trabalhistas -2
ICMS e lei estadual

Plenário

ADI e imunidade parlamentar

O julgamento foi suspenso para colher os votos dos ministros ausentes em assentada posterior.

 

1ª Turma

Substituição de prisão preventiva por domiciliar e cuidados maternos (HC 136.408/SP)

A Turma concedeu o habeas corpus para viabilizar a conversão da prisão preventiva em prisão domiciliar, tendo em vista que a paciente tinha filho menor de 12 anos.

É caso de mera aplicação do art. 318, do Código de Processo Penal, que enuncia as hipóteses de substituição da medida cautelar encarceradora por outra mais adequada ao excepcional perfil subjetivo do agente.

CPP: Art. 318. Poderá o juiz substituir a prisão preventiva pela domiciliar quando o agente for: (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).
I – maior de 80 (oitenta) anos;
II – extremamente debilitado por motivo de doença grave;
III – imprescindível aos cuidados especiais de pessoa menor de 6 (seis) anos de idade ou com deficiência;
IV – gestante;
V – mulher com filho de até 12 (doze) anos de idade incompletos;
VI – homem, caso seja o único responsável pelos cuidados do filho de até 12 (doze) anos de idade incompletos.
Parágrafo único. Para a substituição, o juiz exigirá prova idônea dos requisitos estabelecidos neste artigo.

Esta conversão, ademais, foi inserida pela Lei nº 13.257/16, que trata de políticas públicas para a primeira infância. Este diploma, vale ressaltar, é derivação de um comando constitucional originário, presente no art. 227, da Constituição:

CF/88: Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

 

Repercussão geral e sobrestamento de processo-crime – 2 (HC 127.834/MG)

Neste caso a Turma denegou a ordem de habeas corpus tendo em vista que o paciente buscava a suspensão de processo crime pela prática do delito previsto no art. 28, da Lei de Drogas:

Lei nº 11.363/06: Art. 28. Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas:
I – advertência sobre os efeitos das drogas;
II – prestação de serviços à comunidade;
III – medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.

Como se percebe, o preceito secundário do crime em questão não possui pena de prisão.

Dessa forma, a Turma entendeu que o HC é via inadequada para o fim pretendido, visto que não há privação de liberdade:

O “habeas corpus” não é o meio adequado para discutir crime que não enseja pena privativa de liberdade. (HC 127.834/MG)

Relembre-se que, em se tratando do uso de drogas (art. 28, da Lei de Drogas), estamos diante de um fenômeno de descarcerização, e não descriminalização ou despenalização, pois a prática ainda é delituosa e possui penas.

 

“Habeas corpus” e visita íntima (HC 138.286)

A Turma entendeu que o habeas corpus não é o meio adequado para tutelar visita íntima, por não estar envolvido o direito de ir e vir.

 

2ª Turma

Reclamação e índice de atualização de débitos trabalhistas -2 (Rcl. 22.012/RS)

Este caso envolve reclamação constitucional ajuizada pela Federação Nacional dos Bancos (Fenaban) contra acórdão do TST que determinou a alteração de índice de atualização de débitos trabalhistas, afastando a taxa referencial em prol do IPCA-E. Alguns aspectos processuais do julgamento merecem destaque.

Primeiro, temos o interesse de agir da federação.

A Turma entendeu inexistente interesse jurídico da mesma, visto que a federação não demonstrou como tal interesse teria sido violado pela decisão do TST.

Obs: relembre as hipóteses de cabimento da reclamação, segundo o novo CPC:

CPC: Art. 988. Caberá reclamação da parte interessada ou do Ministério Público para:
I – preservar a competência do tribunal;
II – garantir a autoridade das decisões do tribunal;
III – garantir a observância de enunciado de súmula vinculante e de decisão do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade;
IV – garantir a observância de acórdão proferido em julgamento de incidente de resolução de demandas repetitivas ou de incidente de assunção de competência;

No mérito, a Turma rechaçou a aplicação da tese da transcendência dos motivos determinantes. Esta teoria argumenta que os fundamentos que levam à decisão proferida em controle de constitucionalidade podem transcender ao caso concreto, passando a valer para outras situações congêneres mesmo que não tenham sido submetidas ao controle concentrado. Ou seja, não apenas o dispositivo  da decisão (efeito do controle), mas também seus fundamentos seriam vinculantes.

Nota: exemplo clássico disso ocorre quando uma lei de um Estado é julgada inconstitucional por um certo motivo e em outros âmbitos do Judiciário pede-se a inconstitucionalidade de outra lei de igual teor, mas de outro Estado, tendo em vista o aproveitamento ou transcendência dos motivos que determinaram a decisão precedente.

Se acatada a tese, os fundamentos vinculantes possibilitariam o manejo de reclamação (art. 988, III, do CPC), mas este não é o posicionamento majoritário no STF.

É muito importante ressaltar que a adoção da teoria da “transcendência dos fundamentos determinantes” nas decisões proferidas, no controle abstrato, pelo Supremo Tribunal Federal não se encontra pacificada no âmbito dessa Corte. […] Em face dessa realidade – a utilização da “transcendência dos fundamentos determinantes” estar em debate no Tribunal Maior -, a aplicação da teoria tem sido negada em julgados posteriores. (PAULO; ALEXANDRINO, 2017, p. 833).

Por fim, neste julgado a Turma ressaltou que não houve esgotamento das vias ordinárias antes do ajuizamento da reclamação (art. 988, §5º, II, do CPC), como determina a lei em casos em que a reclamação trata de RE com repercussão geral reconhecida ou RE ou REsp em regime de julgamento repetitivo. De fato, a reclamação não pode ser usada como sucedâneo de recurso. No caso, a decisão final no âmbito do TST admite a interposição de recurso extraordinário.

CF/88: Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:
III – julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância, quando a decisão recorrida:
a) contrariar dispositivo desta Constituição;
b) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal;
c) julgar válida lei ou ato de governo local contestado em face desta Constituição.
d) julgar válida lei local contestada em face de lei federal.

CPC: Art. 988. Caberá reclamação da parte interessada ou do Ministério Público para:
§ 5º É inadmissível a reclamação:
I – proposta após o trânsito em julgado da decisão reclamada;
II – proposta para garantir a observância de acórdão de recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida ou de acórdão proferido em julgamento de recursos extraordinário ou especial repetitivos, quando não esgotadas as instâncias ordinárias.

ICMS e lei estadual (ARE 917.950/SP)

Definiu a turma que:

É válida lei estadual que dispõe acerca da incidência do ICMS sobre operações de importação editada após a vigência da EC 33/2001, mas antes da LC 114/2002, visto que é plena a competência legislativa estadual enquanto inexistir lei federal sobre norma geral, conforme art. 24, § 3º Constituição Federal.

Trata-se de aplicação do art. 24, §3º, da Constituição, o qual garante a competência plena dos Estados para legislarem sobre matéria de competência concorrente que ainda não seja alvo de regulação geral pela União.

CF/88: Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:
I – direito tributário, financeiro, penitenciário, econômico e urbanístico;
§ 3º Inexistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados exercerão a competência legislativa plena, para atender a suas peculiaridades.
§ 4º A superveniência de lei federal sobre normas gerais suspende a eficácia da lei estadual, no que lhe for contrário.

Nesse caso, a discussão envolvia a tributação de veículo importado para uso próprio. O Estado de São Paulo legislou sobre a questão em 2001, mas em 2002 veio a LC nº 114/02, suspendendo a primeira no que fosse incompatível (§4º). Nesse meio tempo, entretanto, a legislação era plena e sua edição foi constitucional.

STF – Informativo nº 886 comentado

Plenário
ADI: amianto e efeito vinculante de declaração incidental de inconstitucionalidade
Amianto e competência legislativa concorrente – 16
ADI e Programa Mais Médicos
1ª Turma
Cômputo do tempo de prisão provisória e reconhecimento da prescrição da pretensão executória
ED e juízo de admissibilidade de RE – 2
Súmula Vinculante 37: reajuste de 13,23% e Lei 13.317/2016 – 2
2ª Turma
Conselho Nacional de Justiça: processo disciplinar e competência autônoma

Plenário

ADI: amianto e efeito vinculante de declaração incidental de inconstitucionalidade (ADI 3.406 e 3.470)

Este julgamento trata da polêmica questão do uso econômico e extração do amianto/asbesto, espécie de mineral com reconhecidas capacidades cancerígenas.

O Plenário julgou improcedentes as ações diretas, que buscavam o reconhecimento de inconstitucionalidades diversas em diploma estadual que traz rigoroso tratamento ao manuseio do amianto no Rio de Janeiro.

O voto vencedor reforça de início que a competência legislativa dos Estados é suficiente para regular aspectos da exploração do amianto relacionados com a produção e consumo, proteção do meio ambiente e controle da poluição e proteção e defesa da saúde, desde que não confronte norma federal correlata.

Nestes termos, a Lei nº 9.055/95, de índole nacional, disciplinou o manuseio do amianto de forma geral, conforme determina a Constituição Federal. Funcionando como espécie de guia teleológico, a norma federal serviria como parâmetro mínimo para definir a proteção ao meio ambiente e da saúde pública, podendo os Estados reforçarem esta tutela.

Nota: frise-se que no âmbito da competência (legislativa) concorrente, o papel da União é o de estabelecer normas gerais.

Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:
V – produção e consumo;
VI – florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição;
§ 1º No âmbito da legislação concorrente, a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais.

 

Amianto e competência legislativa concorrente – 16 (ADPF 109/SP)

Na esteira do julgado acima, a Corte julgou improcedentes pedidos semelhantes formulados em face de normas dos Estados do Rio Grande do Sul e Pernambuco e do Município de São Paulo. Novamente, ratificou-se a visão de que são constitucionais as normas que vedam o uso, a comercialização e a produção de produtos à base de amianto/asbesto.

A Corte também declarou incidentalmente a inconstitucionalidade do art. 2º da Lei nº 9.055/95, que permite o uso do asbesto branco.

 

ADI e Programa Mais Médicos (ADI 5035/DF)

Trata-se de ação direta movida contra preceitos da MP nº 621/13, posteriormente convertida em Lei nº 12.871/13, que trata do programa “Mais Médicos”.
A Corte debruçou-se sobre o tema e rechaçou as suscitadas hipóteses de inconstitucionalidade, conforme se vislumbra no excerto abaixo transcrito:

Assinalou que a ocorrência de problemas na aplicação da lei não afeta a constitucionalidade do modelo, opção legítima para a maior preocupação da sociedade que é a saúde. A norma atacada pode não ter sido a melhor opção do ponto de vista técnico, mas foi opção de política pública válida para tentar minimizar a dificuldade de se fazer chegar a possibilidade de atendimento médico aos locais mais distantes. Com esteio nos arts. 3º, III (2); 170 (3) e 198 (4) da CF/1988, verificou-se forma para que se pudesse levar o serviço médico a todos os rincões.

Ao reconhecer a existência de uma opção política, o STF prezou pela harmonia dos poderes, reconhecendo a legitimação do Poder Executivo para definir os meios pelos quais quer buscar a proteção da saúde. O tribunal não vislumbrou violações constitucionais no que diz respeito às diretrizes do ensino e saúde, julgando improcedente o pedido.

 

Primeira turma

Cômputo do tempo de prisão provisória e reconhecimento da prescrição da pretensão executória

Neste caso a Turma julgou prejudicado o HC em virtude da superveniência de decisão na Vara de origem, que reconheceu a prescrição da pretensão executória do Estado.

 

ED e juízo de admissibilidade de RE -2 (ARE 688.776)

A situação subjacente a este julgado envolve a inadmissão, na origem, do Recurso Extraordinário interposto. Ou seja, contra decisão de Tribunal, a parte interpõe Recurso Extraordinário que, ao ser apreciado pelo Presidente ou Vice-Presidente da corte de origem, vem a ser denegado. É o caso narrado no art. 1.030, do CPC atual:

CPC: Art. 1.030. Recebida a petição do recurso pela secretaria do tribunal, o recorrido será intimado para apresentar contrarrazões no prazo de 15 (quinze) dias, findo o qual os autos serão conclusos ao presidente ou ao vice-presidente do tribunal recorrido, que deverá:
V – realizar o juízo de admissibilidade e, se positivo, remeter o feito ao Supremo Tribunal Federal ou ao Superior Tribunal de Justiça, desde que:
a) o recurso ainda não tenha sido submetido ao regime de repercussão geral ou de julgamento de recursos repetitivos;
b) o recurso tenha sido selecionado como representativo da controvérsia; ou
c) o tribunal recorrido tenha refutado o juízo de retratação.

Em face do despacho denegatório, a parte apresenta embargos de declaração, buscando convencer o Presidente a reformar sua decisão.

O que a Primeira Turma do STF entende é que esses embargos não suspendem ou interrompem o prazo para interposição do recurso típico nesta situação: o agravo em recurso extraordinário (arts. 1.030 e 1.042, do CPC).

CPC: Art. 1.030, § 1º Da decisão de inadmissibilidade proferida com fundamento no inciso V caberá agravo ao tribunal superior, nos termos do art. 1.042.
Art. 1.042. Cabe agravo contra decisão do presidente ou do vice-presidente do tribunal recorrido que inadmitir recurso extraordinário ou recurso especial, salvo quando fundada na aplicação de entendimento firmado em regime de repercussão geral ou em julgamento de recursos repetitivos.

Nota: nos casos de explícita inexistência de repercussão geral, compatibilidade com tese já firmada pelo STF em regime de repercussão geral ou recursos repetitivos, o denegamento do Presidente se dá por autorizativo diverso (art. 1.030, I, do CPC), sendo esta decisão combatida por outro agravo: o agravo interno, para julgamento pelo próprio Tribunal de origem (art. 1.021, do CPC).

Esta é solução ao julgamento iniciado à época do Informativo nº 700, em que já foi explicitado o voto vitorioso:

Destacou a jurisprudência da Corte segundo a qual os embargos de declaração opostos contra a decisão do Presidente do Tribunal de origem que não admitira o recurso extraordinário, por serem incabíveis, não suspenderiam o prazo para interposição de outro recurso. (Informativo 700 – ARE 688776/RS, rel. Min. Dias Toffoli, 2.4.2013.

 

Súmula Vinculante 37: reajuste de 13,23% e Lei 13.317/2016 – 2

Na mesma esteira de diversos outros julgados, a Turma relembrou a jurisprudência pacífica no sentido de que não cabe ao Poder Judiciário, que não tem função legislativa, aumentar vencimentos de servidores públicos sob o fundamento de isonomia.

Súmula Vinculante 37: Não cabe ao Poder Judiciário, que não tem função legislativa, aumentar vencimentos de servidores públicos sob o fundamento de isonomia.

 

Segunda turma

Conselho Nacional de Justiça: processo disciplinar e competência autônoma (MS 34.685)

Neste julgado, a Segunda Turma definiu que a competência investigativa e disciplinar originária do Conselho Nacional de Justiça, ao contrário da revisional, não se sujeita ao parâmetro temporal previsto no art. 103-B, §4º, V, da Constituição Federal.
Com efeito, a revisão oficiosa ou provocada de processos disciplinares de membros do Poder Judiciário há de ocorrer em até um ano após o respectivo julgamento:

Art. 103-B. O Conselho Nacional de Justiça compõe-se de 15 (quinze) membros com mandato de 2 (dois) anos, admitida 1 (uma) recondução, sendo: […]
§4º Compete ao Conselho o controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes, cabendo-lhe, além de outras atribuições que lhe forem conferidas pelo Estatuto da Magistratura:
V – rever, de ofício ou mediante provocação, os processos disciplinares de juízes e membros de tribunais julgados há menos de um ano;

Por outro lado, a atuação originária, não derivada de outro processo judicial ou procedimento administrativo, não esbarra neste óbice, razão pela qual a disciplina pode ser aplicada mesmo em casos em que já houve julgamento anterior há mais de um ano, desde que este não seja a razão de ser da ulterior atuação do CNJ. Eis excertos importantes do informativo:

A defesa alegou que um dos fatos que constitui objeto da denúncia já havia sido julgado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), tendo o agravante sido eximido da responsabilidade por decisão de mérito. Sustentou também que, arquivado o processo, a revisão disciplinar só poderia ser instaurada a menos de um ano do julgamento, conforme o art. 103-B, § 4º, V da Constituição.
A Turma, entendeu que o CNJ tem preponderância sobre os dos demais órgãos do Poder Judiciário com exceção do Supremo Tribunal Federal (STF).
O Colegiado compreendeu, ainda, que o processo administrativo disciplinar instaurado pelo CNJ se deu em virtude de reclamação disciplinar autônoma, não estando relacionado à decisão do TSE. Ademais, asseverou não haver evidências de ilegalidade ou abuso de poder na atuação do CNJ, que apresenta capacidade correicional e autônoma para apreciar o atendimento, pelo magistrado, dos deveres jurídicos da magistratura.

STF – Informativo nº 885 comentado

Plenário
Prerrogativa de foro e interpretação restritiva – 2
Repercussão Geral
Transexual: alteração de gênero e cirurgia de redesignação de sexo
1ª Turma
Fato único: investigados sem prerrogativa de foro e não desmembramento
Lei de Segurança Nacional e competência do Supremo
Violação da ordem de inquirição de testemunhas no processo penal
Conselho Nacional de Justiça e controle de controvérsia submetida ao Judiciário
2ª Turma
Vantagens remuneratórias e superveniência de regime jurídico
Dupla extradição: requisitos e competência
Contrato de concessão: advento da Lei 12.783/2013 e prorrogação

Plenário

Prerrogativa de foro e interpretação restritiva – 2 (AP 937)

Suspenso por pedido de vista dos autos.

 

Transexual: alteração de gênero e cirurgia de redesignação de sexo (RE 670.422/RS)

Suspenso por pedido de vista dos autos.

 

Primeira Turma

Fato único: investigados sem prerrogativa de foro e não desmembramento (Inquérito nº 4.506)

A controvérsia discutida na turma diz respeito ao desmembramento da investigação quando parte dos envolvidos está investida em cargo com foro privilegiado (membro do Senado Federal).

A peculiaridade que definiu o resultado do julgamento é a unicidade do fato criminoso investigado. Para a maioria da turma, existindo uma união indissociável entre as condutas dos envolvidos, não seria possível o desmembramento da investigação.

A regra é que ocorra o desmembramento, mas o imbricamento é fator decisivo para evitar a divisão da investigação ou da ação penal, conforme vem decidindo o STF. Nesse sentido, pode-se vislumbrar trecho da ementa de decisão relativa ao Inquérito nº 4104:

1. Cabe apenas ao próprio tribunal ao qual toca o foro por prerrogativa de função promover, sempre que possível, o desmembramento de inquérito e peças de investigação correspondentes, para manter sob sua jurisdição, em regra, apenas o que envolva autoridade com prerrogativa de foro, segundo as circunstâncias de cada caso (INQ 3.515 AgR, Rel. Min. MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, DJe de 14.3.2014), ressalvadas as situações em que os fatos se revelem de tal forma imbricados que a cisão por si só implique prejuízo a seu esclarecimento (AP 853, Rel. Min. ROSA WEBER, DJe de 22.5.2014), o que não ocorre no caso. Deferimento do desmembramento do processo quanto aos não detentores de foro por prerrogativa de função. […] (Inq 4104 / SC – SANTA CATARINA. Relator(a): Min. TEORI ZAVASCKI. Julgamento: 22/11/16. Órgão Julgador: Segunda Turma).

 

Lei de Segurança Nacional e competência do Supremo (RC 1.473)

O caso concreto (invasão de termelétrica) envolve denúncia proposta pelo Ministério Público diante da suposta prática do delito previsto no art. 15, § 2º, da Lei 7.170/83 (Lei de Segurança Nacional). Eis o tipo penal:

Art. 15 – Praticar sabotagem contra instalações militares, meios de comunicações, meios e vias de transporte, estaleiros, portos, aeroportos, fábricas, usinas, barragem, depósitos e outras instalações congêneres.
Pena: reclusão, de 3 a 10 anos.
§ 2º – Punem-se os atos preparatórios de sabotagem com a pena deste artigo reduzida de dois terços, se o fato não constitui crime mais grave.

Nota: observe-se tratar de caso em que atos preparatórios são criminalizados, fugindo à regra de que a preparação do crime não é punida.

O Juízo de primeiro grau absolveu o réu. O Ministério Público, a seu turno, entendendo tratar-se de crime político, interpôs recurso ordinário constitucional, de apreciação direta pelo Supremo Tribunal Federal (art. 102, II, “b”, da CF/88).

A segunda turma entendeu por maioria que não estava configurado crime político, tornando o recurso ordinário em questão meio inadequado para impugnação da sentença. Também entendeu estar presente situação de crime impossível. Explica a doutrina que:

Crime político, denominado vulgarmente crime de Lesa-majestade, é todo cometimento ilícito motivado por razões de natureza pública, as quais violam o bem-estar social. É o caso das ofensas, ameaças, ações subversivas, diretas ou indiretas, determinadas ou anônimas, contra a ordem política vigente no Estado. Cabe ao Supremo Tribunal Federal dizer quais os crimes que podem ser rotulados como tais (Lei n. 6.81 5/80, art. 77, § 2º). (BULOS, 2014, p. 671).

 

Violação da ordem de inquirição de testemunhas no processo penal (HC 111.815)

A turma relembrou que a inquirição de testemunhas pelas partes deve preceder à realizada pelo Juízo. Assim, concedeu, em parte, a ordem de habeas corpus para que se procedesse a nova oitiva, mantidos os demais atos processuais.

Nota: observe-se a aplicação prática da noção de economia processual e da máxima pas de nullité sans grief, já que o entendimento majoritário determinou apenas a retificação do ato central, mantendo os demais atos instrutórios incólumes.

É o que se extrai do art. 212, do Código de Processo Penal:

Art. 212. As perguntas serão formuladas pelas partes diretamente à testemunha, não admitindo o juiz aquelas que puderem induzir a resposta, não tiverem relação com a causa ou importarem na repetição de outra já respondida. Parágrafo único. Sobre os pontos não esclarecidos, o juiz poderá complementar a inquirição.

Denota-se, portanto, que a formulação dos questionamentos em regra cabe às partes, podendo o julgador proceder à complementação da inquirição. Ao inverter tais posições, o Juízo aproxima-se de uma indevida postura inquisitiva.

 

Conselho Nacional de Justiça e controle de controvérsia submetida ao Judiciário (MS 28.845/DF)

O caso concreto envolve processo administrativo instaurado no âmbito do CNJ tendo em vista suposto descumprimento de decisão proferida pelo STF por outro Juízo. O Conselho arquivou o procedimento tendo em vista carecer de controle sobre atos jurisdicionais. O interessado propôs mandado de segurança, buscando forçar a atuação do CNJ, mas não obteve êxito no STF.

Com efeito, a turma reforçou a tese de que o CNJ tem atribuições exclusivamente administrativas, em que pese ser órgão integrante do Poder Judiciário (art. 92, I-A, da CF/88).

 

Segunda turma

Vantagens remuneratórias e superveniência de regime jurídico (Reclamação nº 26.064 AgR/RS)

A Segunda Turma entendeu que a competência para julgamento de controvérsia remuneratória mantida entre Poder Público e seus agentes é determinada pela natureza do vínculo jurídico atual, mesmo que o problema fundamente-se em período em que o funcionário mantinha vínculo celetista.

Em outras palavras, havendo a transição do servidor celetista para o regime estatutário, passa a ser competência da justiça comum as lides decorrentes da relação, mesmo que tenham origem questões anteriores à alteração do vínculo.

 

Dupla extradição: requisitos e competência (Extradição nº 1.225/DF)

A Turma entendeu que o indivíduo anteriormente extraditado que reingressa no Brasil pode ser entregue às autoridades do país interessado sem que seja necessário novo processo de extradição. Dessa forma, novas formalidades seriam prescindíveis.

A tese da DPU não foi acatada:

O caso se refere a indivíduo já extraditado que escapou à ação da justiça espanhola e reingressou em território brasileiro. A defesa alegou a incompetência do relator para a realização da entrega, a não formalização do novo pedido de extradição e a insuficiência de informações sobre o processo para a avaliação da dupla punibilidade. (Ext 1225/DF)

Vale observar que a nova Lei de Migração (Lei nº 13.445/17) possibilita a resolução desse tipo de problemática de forma administrativa, sem a necessária intervenção do Poder Judiciário ou da instauração de novo procedimento extraditório:

Lei nº 13.445: Art. 98. O extraditando que, depois de entregue ao Estado requerente, escapar à ação da Justiça e homiziar-se no Brasil, ou por ele transitar, será detido mediante pedido feito diretamente por via diplomática ou pela Interpol e novamente entregue, sem outras formalidades.

 

Contrato de concessão: advento da Lei nº 12.783/13 e prorrogação (RMS 34.203/DF)

A situação fática deste julgamento é a seguinte: certa empresa atuante na área de produção de energia elétrica mantinha contrato de concessão com o Poder Público federal. Antes do advento do termo final do ajuste, veio à tona a Lei nº 12.783/13, que modificou os critérios de prorrogação de concessões como aquela mantida pela empresa mencionada. Para realizar a prorrogação, seria necessário o aceitamento das novas condições.

Nesta toada, a empresa não acatou as novas condições e pleiteou a prorrogação contratual com manutenção do regime anterior à inovação legislativa mencionada. O Ministério pertinente, consequentemente, não procedeu à prorrogação do contrato, o que motivou a apresentação de mandado de segurança.

Obs: lembre-se que o mandado de segurança contra atos de Ministros de Estado é impetrado diretamente no STJ.

Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça:
I – processar e julgar, originariamente: b) os mandados de segurança e os habeas data contra ato de Ministro de Estado, dos Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica ou do próprio Tribunal;

A Turma reforçou que a prorrogação seria ato discricionário da Administração e que as cláusulas contratuais não apontavam norma no sentido da obrigatoriedade da mesma. Entendeu-se que atribuir tal prerrogativa à empresa contratada importaria em um enfraquecimento do princípio da supremacia do interesse público. Pontuou o Ministro Celso de Mello:

O Ministro Celso de Mello salientou que a Administração pode modificar unilateralmente as cláusulas regulamentares, mesmo que não haja previsão no próprio contrato de concessão, porque ínsito à potestade pública. É, de fato, uma prerrogativa de poder de que se vale o Estado para fazer prevalecer, de um lado, a superioridade, a supremacia do interesse público sobre o interesse privado e, de outro lado, para respeitar a cláusula de indisponibilidade desse interesse público. (RMS 34203/DF).

 

Referências

BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de direito constitucional. São Paulo: Saraiva, 2014.

Página 9 de 10

Powered by WordPress & Theme by Anders Norén