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Lugar do crime e ubiquidade

No que diz respeito ao lugar do crime, o código adotou a teoria da ubiquidade, também denominada teoria mista ou teoria da unidade.

Lugar do crime

Art. 6º – Considera-se praticado o crime no lugar em que ocorreu a ação ou omissão, no todo ou em parte, bem como onde se produziu ou deveria produzir-se o resultado.

A preocupação ínsita ao lugar do crime diz respeito à jurisdição penal sob enfoque internacional: qual país pode processar o delito? De fato, diversos delitos apresentam toques transnacionais, se prolongam por várias fronteiras ou simplesmente tem resultado final em outro país.

Pela teoria da ubiquidade, portanto, o lugar do crime é simultaneamente aqueles onde se desenvolveram as atividades parcial ou totalmente e aquele em que se verificou ou deveria se verificar o resultado. Normalmente isso implica a possibilidade de mais de um país poder processar o delito.

Sobre o assunto, a doutrina menciona a importância da teoria da ubiquidade para o processamento dos crimes à distância:

Nos denominados crimes a distância é que apresenta relevância jurídica a adoção da teoria da ubiquidade.
Os crimes podem ser de espaço mínimo ou de espaço máximo, segundo se realizem ou não no mesmo lugar os atos executórios e o resultado. Na hipótese negativa, fala-se em crimes a distância. Assim, um crime executado na Argentina e consumado no Brasil. Sendo o crime um todo indivisível, basta que uma de suas características se tenha realizado em território nacional para a solução do problema dos crimes a distância.

jesus, 2014, e-book (cap. viii, item 3)

Por outro lado, se a controvérsia sobre o local do crime estiver contida dentro da jurisdição brasileira, o conflito se resolve com base nas regras internas, notadamente o art. 70, do Código de Processo Penal.

Art. 70.  A competência será, de regra, determinada pelo lugar em que se consumar a infração, ou, no caso de tentativa, pelo lugar em que for praticado o último ato de execução.
§ 1o  Se, iniciada a execução no território nacional, a infração se consumar fora dele, a competência será determinada pelo lugar em que tiver sido praticado, no Brasil, o último ato de execução.
§ 2o  Quando o último ato de execução for praticado fora do território nacional, será competente o juiz do lugar em que o crime, embora parcialmente, tenha produzido ou devia produzir seu resultado.
§ 3o  Quando incerto o limite territorial entre duas ou mais jurisdições, ou quando incerta a jurisdição por ter sido a infração consumada ou tentada nas divisas de duas ou mais jurisdições, a competência firmar-se-á pela prevenção.

código de processo penal

Referências

JESUS, Damásio de. Direito penal . v. 1. São Paulo: Saraiva, 2014.

Tempo do crime e teoria da atividade

O tempo do crime é aquele em que a conduta é praticada, podendo esta ser comissiva (ação) ou omissiva, mesmo que seu resultado ocorra posteriormente.

Tempo do crime
Art. 4º – Considera-se praticado o crime no momento da ação ou omissão, ainda que outro seja o momento do resultado.

código penal

Diz-se, portanto, que o código adota a teoria da atividade.

A especial importância deste dispositivo reside na definição da lei aplicável, tendo em vista que, como o resultado pode advir posteriormente, também pode estar vigente outra lei neste momento. Um exemplo clássico envolve o homicídio: o disparo é efetuado em dado momento, mas o óbito ocorre depois de anos de internação. Se nesse intervalo surgir lei mais rigorosa, esta não alcança o atirador.

Isso, entretanto, nem sempre ocorre. Nos crimes permanentes (aquele cuja atividade criminosa se protrai no tempo) ou continuados (aqueles em que, por ficção, diversas ações criminosas semelhantes são consideradas uma unidade delitiva), por exemplo, o advento de lei mais rigorosa alcança o criminoso. É o que se encontra consolidado na jurisprudência:

A lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime permanente, se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou da permanência.

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL – SÚMULA Nº 711

Erro de tipo: caracterização e espécies

O erro sobre elementos do tipo é previsto no Código Penal:

Erro sobre elementos do tipo
Art. 20 – O erro sobre elemento constitutivo do tipo legal de crime exclui o dolo, mas permite a punição por crime culposo, se previsto em lei.
Descriminantes putativas
§ 1º – É isento de pena quem, por erro plenamente justificado pelas circunstâncias, supõe situação de fato que, se existisse, tornaria a ação legítima. Não há isenção de pena quando o erro deriva de culpa e o fato é punível como crime culposo.
Erro determinado por terceiro
§ 2º – Responde pelo crime o terceiro que determina o erro.
Erro sobre a pessoa
§ 3º – O erro quanto à pessoa contra a qual o crime é praticado não isenta de pena. Não se consideram, neste caso, as condições ou qualidades da vítima, senão as da pessoa contra quem o agente queria praticar o crime.

Código penal

O erro de tipo é o equívoco sobre os elementos que compõem a conduta típica. É a errônea representação do mundo dos fatos, situação que faz com que o elemento subjetivo do agente não se alinhe à realidade efetivamente vivenciada. Essa ruptura ocorre entre o psicológico do agente (que o faz atuar com base em um cenário inexistente) e o a realidade.

É possível destrinchar essas ideias básicas para melhor compreensão através de um exemplo.

Imagine o crime de violação de correspondência: “
Art. 151 – Devassar indevidamente o conteúdo de correspondência fechada, dirigida a outrem:”

A sua tipificação depende da compreensão de certos elementos típicos: a) a devassa; b) a correspondência; c) a condição de estar fechada; e d) o fato de estar dirigida a outrem.

O agente pode se equivocar sobre todos esses elementos, excluindo o dolo necessário à punição pelo crime.

Por exemplo, ele pode pensar que a correspondência é para ele. Talvez ele pode pensar que a correspondência já estava aberta, ou que não se tratava de correspondência, mas de algum panfleto publicitário.

No final das contas, ele representou equivocadamente a realidade, errando sobre elementos do tipo.

Como esse crime não permite modalidade culposa, não há crime, pois não há dolo e, consequentemente, não há tipicidade.

Exemplos: o professor de anatomia golpeia mortalmente o corpo humano vivo, trazido ao anfiteatro, supondo tratar-se de um cadáver (não é punível por homicídio doloso e, se invencível o erro, nem mesmo por homicídio culposo); o visitante leva consigo, ao retirar-se, confundindo-o com o seu, o chapéu de sol do dono da casa (não é punível a título de furto); […]

hungria; fragoso, 19778, p. 226-227.

A ideia por trás de toda modalidade de erro de tipo é, portanto, a equivocada representação do mundo fático. Inclusive, esta é a razão pela qual ele era denominado erro de fato originalmente no Código, mas a melhor técnica fez prevalecer a alcunha atual.

Em qualquer hipótese, é importante frisar que o erro pode ser escusável (perdoável, inevitável, invencível) ou inescusável (imperdoável, evitável, vencível). A depender da modalidade de erro, as consequências jurídicas serão diversas.

O erro de tipo, por exemplo, pode ser essencial ou acidental.

No essencial, sempre há a exclusão do dolo, mas se ele for inescusável, é possível a imputação do correspondente tipo culposo. A essencialidade, no caso, diz respeito aos elementos básicos que tornam a conduta criminosa em si. O agente não sabe que está prestes a cometer um ato típico. Explica Cunha (2016) que, nesses casos, o agente para de agir criminosamente se avisado do erro.

O erro de tipo tem por efeito excluir sempre o dolo, embora possa subsistir a punibilidade a título de culpa, se o erro é inescusável.

HUNGRIA; FRAGOSO, 1978, P. 567.

O erro de tipo acidental recai sobre elementos periféricos do crime que se pretende praticar. O intuito do agente é, de fato, criminoso, mas ele erra sobre detalhes do delito que quer cometer. Mesmo que avisado sobre o erro, ele continuaria com a conduta criminosa, apenas retificando o equívoco periférico. Algumas modalidades de erro de tipo acidental serão estudadas oportunamente.

Descriminantes putativas
§ 1º – É isento de pena quem, por erro plenamente justificado pelas circunstâncias, supõe situação de fato que, se existisse, tornaria a ação legítima. Não há isenção de pena quando o erro deriva de culpa e o fato é punível como crime culposo.

O erro também pode incidir sobre a existência fática de uma causa de exclusão de ilicitude. Ou seja, o agente imagina que está em uma situação em que pode agir albergado por uma causa excludente de antijuridicidade (ou seja, uma causa descriminante, que torna sua conduta lícita e, portanto, não criminosa). Ocorre que essa situação descriminante é imaginária (putativa).

O sujeito imagina estar vivenciando situação de estado de necessidade, ou que está sofrendo uma agressão injusta, permitindo sua legítima defesa etc., entretanto, tais causas de exclusão de ilicitude são imaginárias no contexto fático vivido.

O termo putativo significa imaginário, hipotético, decorrente de suposição.

1. Supostamente verdadeiro, sem o ser. (Michaelis)

Exemplos: um indivíduo, por errônea apreciação de circunstâncias de fato, julga-se na iminência de ser injustamente agredido por outro, e contra este exerce violência (legítima defesa putativa). ao falso alarma de incêndio numa casa de diversões, os espectadores, tomados de pânico, disputam-se a retirada, e alguns deles, para se garantirem caminho, empregam violência, sacrificando outros (estado de necessidade putativo); a sentinela avançada mata com um tiro de fuzil, supondo tratar-se de um inimigo, o companheiro d’armas que, feito prisioneiro, consegue fugir e vem de retorno ao acampamento (putativo cumprimento do dever legal); o adquirente de um prédio rural, enganado sobre a respectiva linha de limite, corta ramos da árvore frutífera do prédio vizinho, supondo erroneamente que avançam sobre sua proprieade, além do plano vertical divisório (putativo exercício regular de direito).

hungria; fragoso, 1978, p. 229.

As descriminantes putativas, como espécies do erro de tipo, usualmente denominadas erro de tipo permissivo (pois tratam de equívoco sobre a existência de uma situação que, se existisse, permitiria a conduta), seguem a mesma lógica do erro de tipo essencial anteriormente exposta: sempre excluem o dolo e, se decorrerem de erro vencível, permitem a imputação por culpa.

Cogitemos um exemplo:

O indivíduo A é ameaçado de morte por B. Dias depois, vê o desafeto vindo em sua direção com uma arma. Antes de qualquer interação, A atira preventivamente em B, pensando que este está na iminência de injustamente matá-lo, quando, na verdade, B portava um guarda-chuva e iria apenas desculpar-se pelo evento anterior.

Diante da ameaça prévia, pode-se supor que o erro era invencível, não respondendo A pelo homicídio.

Agora imagine que B apenas havia xingado A por uma disputa futebolística. Se A vem a matar B nas condições já explicadas, claramente estará caindo em um erro facilmente vencível, pois as circunstâncias não fariam supor a iminência de uma iminente agressão.

Erro determinado por terceiro
§ 2º – Responde pelo crime o terceiro que determina o erro.

Em algumas circunstâncias, o erro pode ter sido determinado por conduta de terceiro. Nessas situações, o agente em si muitas vezes atua como mero instrumento do delito maquinado por terceiro, sendo também possível que o terceiro tenha agido com culpa.

Nesses casos, seguimos a regra do erros de tipo essencial: exclui-se o dolo do agente, que poderá responder por culpa se tiver agido com credulidade culpável. O terceiro responderá por dolo ou por culpa, a depender do seu elemento subjetivo.

Um exemplo: se C, querendo matar B, diz para A jogar no triturador industrial um pesado saco de lixo (onde B está, inconsciente), responderá C pelo homicídio de B, não respondendo A pelo evento.

Se o saco estivesse se mexendo e gemendo, por outro lado, esperaria-se de A uma natural desconfiança e prudência. Ao proceder com a conduta sem tomar esse cuidado, age de forma negligente, podendo ser condenado por crime culposo.

Erro sobre a pessoa
§ 3º – O erro quanto à pessoa contra a qual o crime é praticado não isenta de pena. Não se consideram, neste caso, as condições ou qualidades da vítima, senão as da pessoa contra quem o agente queria praticar o crime.

Outro erro estuado nesse artigo é o erro sobre a pessoa (error in persona), que compreende o equívoco sobre a vítima pretendida pelo autor do crime. A doutrina classifica essa hipótese como um erro de tipo acidental, pois incide sobre aspectos secundários da conduta, persistindo um intuito criminoso mesmo se o agente não estivesse equivocado sobre a realidade (CUNHA, 2016).

O agente pensa que comete o crime contra um indivíduo A quando, na realidade, acaba por cometê-lo em face de B. Nesse caso, irá responder pelo delito como se houvesse praticado-o contra A, seu alvo inicial. Isso impõe a aplicação das circunstâncias agravantes e qualificadoras que correspondem à qualidade da vítima (ex: feminicídio, patricídio etc.).

Referências

CUNHA, Rogério Sanches. Manual de direito penal: parte geral. Salvador: JusPODIVM, 2016.
HUNGRIA, Nelson; FRAGOSO, Heleno Cláudio. Comentários ao código penal. v. 1, tomo II. Rio de Janeiro: Forense, 1978.

Descriminantes putativas ou erro de tipo permissivo

Sobre o erro, informa o Código Penal:

Erro sobre elementos do tipo
Art. 20 – O erro sobre elemento constitutivo do tipo legal de crime exclui o dolo, mas permite a punição por crime culposo, se previsto em lei.
Descriminantes putativas
§ 1º – É isento de pena quem, por erro plenamente justificado pelas circunstâncias, supõe situação de fato que, se existisse, tornaria a ação legítima. Não há isenção de pena quando o erro deriva de culpa e o fato é punível como crime culposo.

O erro de tipo é o equívoco sobre os elementos que compõem a conduta típica.

É a errônea representação do mundo dos fatos, situação que faz com que o elemento subjetivo do agente não se alinhe à realidade efetivamente vivenciada. Essa ruptura ocorre entre o psicológico do agente (que o faz atuar com base em um cenário inexistente) e a realidade.

Descriminantes putativas
§ 1º – É isento de pena quem, por erro plenamente justificado pelas circunstâncias, supõe situação de fato que, se existisse, tornaria a ação legítima. Não há isenção de pena quando o erro deriva de culpa e o fato é punível como crime culposo.

O erro também pode incidir sobre a existência fática de uma causa de exclusão de ilicitude. Ou seja, o agente imagina que está em uma situação em que pode agir albergado por uma causa excludente de antijuridicidade (ou seja, uma causa descriminante, que torna sua conduta lícita e, portanto, não criminosa). Ocorre que essa situação descriminante é imaginária (putativa).

O sujeito imagina estar vivenciando situação de estado de necessidade, ou que está sofrendo uma agressão injusta, permitindo sua legítima defesa etc., entretanto, tais causas de exclusão de ilicitude são imaginárias no contexto fático vivido.

O termo putativo significa imaginário, hipotético, decorrente de suposição.

1. Supostamente verdadeiro, sem o ser. (Michaelis)

Exemplos: um indivíduo, por errônea apreciação de circunstâncias de fato, julga-se na iminência de ser injustamente agredido por outro, e contra este exerce violência (legítima defesa putativa). ao falso alarma de incêndio numa casa de diversões, os espectadores, tomados de pânico, disputam-se a retirada, e alguns deles, para se garantirem caminho, empregam violência, sacrificando outros (estado de necessidade putativo); a sentinela avançada mata com um tiro de fuzil, supondo tratar-se de um inimigo, o companheiro d’armas que, feito prisioneiro, consegue fugir e vem de retorno ao acampamento (putativo cumprimento do dever legal); o adquirente de um prédio rural, enganado sobre a respectiva linha de limite, corta ramos da árvore frutífera do prédio vizinho, supondo erroneamente que avançam sobre sua proprieade, além do plano vertical divisório (putativo exercício regular de direito).

hungria; fragoso, 1978, p. 229.

As descriminantes putativas, como espécies do erro de tipo, usualmente denominadas erro de tipo permissivo (pois tratam de equívoco sobre a existência de uma situação que, se existisse, permitiria a conduta), seguem a mesma lógica do erro de tipo essencial anteriormente exposta: sempre excluem o dolo e, se decorrerem de erro vencível, permitem a imputação por culpa.

Cogitemos um exemplo:

O indivíduo A é ameaçado de morte por B. Dias depois, vê o desafeto vindo em sua direção com uma arma. Antes de qualquer interação, A atira preventivamente em B, pensando que este está na iminência de injustamente matá-lo, quando, na verdade, B portava um guarda-chuva e iria apenas desculpar-se pelo evento anterior.

Diante da ameaça prévia, pode-se supor que o erro era invencível, não respondendo A pelo homicídio.

Agora imagine que B apenas havia xingado A por uma disputa futebolística. Se A vem a matar B nas condições já explicadas, claramente estará caindo em um erro facilmente vencível, pois as circunstâncias não fariam supor a iminência de uma iminente agressão.

Referências

CUNHA, Rogério Sanches. Manual de direito penal: parte geral. Salvador: JusPODIVM, 2016.
HUNGRIA, Nelson; FRAGOSO, Heleno Cláudio. Comentários ao código penal. v. 1, tomo II. Rio de Janeiro: Forense, 1978.

Maioridade penal e imputabilidade

Aduz o art. 27, do Código Penal:

Menores de dezoito anos
Art. 27 – Os menores de 18 (dezoito) anos são penalmente inimputáveis, ficando sujeitos às normas estabelecidas na legislação especial.

Um critério normativo para a definição da inimputabilidade é o critério etário, de índole objetivamente biológica. Não se perquire concretamente a capacidade do indivíduo compreender o caráter ilícito do fato ou de sua capacidade de se posicionar diante desse entendimento (ou seja, não é um critério psicológico).

A escolha da idade de 18 anos decorre de política criminal e, inclusive, foi reiterada na Constituição de 1988:

Art. 228. São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às normas da legislação especial.

Constituição federal de 1988

Ao invés de assinalar o adolescente transviado com o ferrete de uma condenação penal, que arruinará, talvez irremediavelmente sua existência inteira, é preferível, sem dúvida, tentar corrigi-lo por métodos pedagógicos, prevenindo sua recaída no malefício.

hungria; fragoso, 1978, p. 359.

Portanto, a denominada imaturidade, observada objetivamente pelo critério etário, é causa de inimputabilidade, inexistindo culpabilidade ou crime. O ato típico e ilícito praticado por crianças e adolescentes é denominado de ato infracional e é apreciado por um outro subsistema legal:

Art. 103. Considera-se ato infracional a conduta descrita como crime ou contravenção penal.
Art. 104. São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às medidas previstas nesta Lei.
Parágrafo único. Para os efeitos desta Lei, deve ser considerada a idade do adolescente à data do fato.

Estatuto da Criança e do Adolescente (LEI Nº 8.069/90)

Referências

HUNGRIA, Nelson; FRAGOSO, Heleno Cláudio. Comentários ao código penal. v. 1, tomo II. Rio de Janeiro: Forense, 1978.

Dolo eventual e culpa consciente

Dolo e culpa são elementos subjetivos (que dizem respeito ao próprio sujeito) que compõem a tipicidade do delito, ou seja, a definição básica do ato criminoso, conforme teoria finalista da ação. Correspondem à força motriz interna da conduta, sendo por vezes chamados de elementos anímicos (“próprios da alma”, conforme define o dicionário) da mesma.

Como se sabe, o dolo adotado contemporaneamente na praxe e legislação penal brasileira é o dolo natural. Trata-se, em poucas palavras, da vontade de praticar uma conduta cujo teor e consequências se conhece plenamente.

É o dolo que está no tipo e que se caracteriza por ser a consciência (consciência dos elementos do fato – conduta, resultado e nexo causal) e a vontade (vontade de praticar a conduta e de chegar ao resultado. (KREBS, 2006, p. 167).

 

Percebe-se, então, que a típica manifestação do dolo envolve vontade e consciência sobre um ato e sobre seus resultados (representação/previsão destes).

 

Dolo eventual

O dolo eventual emerge nesse contexto como uma pequena variação da volição (do “querer”) do indivíduo. O agente quer praticar o ato, mas não está investido diretamente no resultado do mesmo. Mesmo consciente do provável resultado, o indivíduo não se distancia de sua motivação, não se importando com a possibilidade de concretização da consequência prevista.

Em poucas palavras, diante da possibilidade de um resultado delituoso, o agente assume o risco do mesmo, ainda que não o queira diretamente (de fato, caso quisesse, teria dolo direto).

Um exemplo seria o indivíduo que quer dar um “fino” (passar bem próximo) em um pedestre enquanto dirige, não se preocupando ou se importando com a possibilidade de atropelar e matar o mesmo durante a manobra. Mesmo que o intuito do motorista não seja o homicídio do pedestre, ele assume o risco de produzir tal resultado, consentindo (ou assentindo) com o mesmo.

 

O art. 18, do Código Penal, evidencia a adoção, no Brasil, de duas teorias que possibilitam a responsabilidade do sujeito pelo crime doloso: a teoria da vontade e a teoria do assentimento (ou consentimento):

Código Penal
Art. 18 – Diz-se o crime:
I – doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo;

 

Relembre-se que a teoria da representação não é adotada no direito penal brasileiro:

Teoria da representação: fala-se em dolo sempre que o agente tiver a previsão do resultado como possível e, ainda assim, decide prosseguir com a conduta. (SANCHES, 2016, p. 194).

 

Diferença entre dolo eventual e culpa consciente

A partir da percepção de que o consentimento em relação ao resultado previsto é o ponto chave do dolo eventual, e que a teoria da representação não permite o reconhecimento de dolo do agente, pode-se traçar os contornos da chamada culpa consciente, e como esta difere do dolo eventual.

A típica culpa decorre da “inconsciência” (falta de representação ou previsão) do indivíduo sobre um possível resultado de uma conduta. Essa falha de previsibilidade usualmente decorre de imperícia, negligência ou imprudência.

Entretanto, pode existir culpa, também decorrente dessas mesmas falhas de conduta (imperícia, negligência ou imprudência), em certas situações em que o resultado indesejado havia sido previsto e devidamente representado pelo agente. Entretanto, no lugar de consentir/assumir esse resultado, o agente o repele e acredita que o mesmo não se concretizará.

O exemplo típico da doutrina envolve o atirador de elite (ou sniper), que dispara contra um bandido que usa um refém como escudo (confiante que acertará o disparo por causa de sua experiência e técnica), mas erra o alvo e acerta o inocente.

 

Ou seja, enquanto no dolo eventual o indivíduo prevê o resultado e não se importa com sua concretização, na culpa consciente o agente se importa e crê que o mesmo não se concretizará, sendo esta a razão pela qual insiste na conduta.

O dolo eventual aproxima-se da culpa consciente e dela se distingue porque nesta, o agente, embora prevendo o resultado como possível ou provável, não o aceita nem consente. Não basta, portanto, a dúvida, ou seja, a incerteza a respeito de certo evento, sem a implicação de natureza volitiva. O dolo eventual põe-se na perspectiva da vontade, e não da representação, pois esta última pode conduzir também à culpa consciente. (FRAGOSO, 1987, p. 178).

 

Em situações fronteiriças, é comum que se debata se o agente atuou com dolo eventual ou culpa consciente. Diante da impossibilidade de leitura dos pensamentos do agente, a certeza sobre a existência de dolo ou culpa é inviável, mas o operador do Direito pode fundamentar a existência de um ou outro elemento psicológico com base nas circunstâncias fáticas que estão ao redor do ato delituoso.

Por exemplo, em caso recente, noticiado no Informativo nº 904, do STF, a Primeira Turma entendeu que o homicídio causado por embrigado ao volante, dirigindo na contramão, seria doloso, diante destas peculiaridades.

 

Referências

KREBS, Pedro. Teoria jurídica do delito: noções introdutórias: tipicidade objetiva e subjetiva. Barueri: Manole, 2006.
SANCHES, Rogerio. Manual de direito penal: parte geral. Salvador: JusPodivm, 2016.
FRAGOSO, Heleno Cláudio. Lições de direito penal: parte geral. Rio de Janeiro: Forense, 1987.

Prescrição penal

A prescrição é o fenômeno jurídico de índole material que desencadeia a fulminação da pretensão jurídica punitiva ou executória do Estado (o jus puniendi). Em outras palavras, finda a possibilidade de processamento e punição de um indivíduo pelo ente soberano, que detém exclusividade na aplicação da sanção criminal, tendo em vista o decurso de lapso temporal significativo para tornar indesejada, aos olhos do ordenamento jurídico, a punição.

Cesare Beccaria é um dos expoentes da visão de que o crime há de ser seguido de perto pelo seu castigo legal. O atraso demasiado da punição implica injustiça e verdadeira vingança. A prescrição, portanto, desabona a morosidade dos processos persecutórios e serve de garantia para o acusado, buscando aproximar o máximo possível delito e punição.

QUANDO o delito é constatado e as provas são certas, é justo conceder ao acusado o tempo e os meios de justificar-se, se lhe for possível; é preciso, porém, que esse tempo seja bastante curto para não retardar demais o castigo que deve seguir de perto o crime, se se quiser que o mesmo seja um freio útil contra os celerados. (BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. Domínio público, recurso digital).

No Código Penal brasileiro, a matéria é tratada como circunstância extintiva de punibilidade.

Art. 107 – Extingue-se a punibilidade: IV – pela prescrição, decadência ou perempção;

Utiliza-se, no ordenamento pátrio, o índice do art. 109, do CP, para estipular os lapsos prescricionais dos crimes, seja para a aferição com base na pena abstrata ou concretamente imposta. Atenção aos destaques é essencial:

Art. 109. A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, salvo o disposto no § 1o do art. 110 deste Código, regula-se pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime, verificando-se:
I – em vinte anos, se o máximo da pena é superior a doze;
II – em dezesseis anos, se o máximo da pena é superior a oito anos e não excede a doze;
III – em doze anos, se o máximo da pena é superior a quatro anos e não excede a oito;
IV – em oito anos, se o máximo da pena é superior a dois anos e não excede a quatro;
V – em quatro anos, se o máximo da pena é igual a um ano ou, sendo superior, não excede a dois;
VI – em 3 (três) anos, se o máximo da pena é inferior a 1 (um) ano.

Restruturando com mais clareza:

Pena Prescrição
– de 1 ano 3 anos Novo patamar mínimo decorrente da Lei nº 12.234/10.
Não retroage para crimes anteriores.
+ ou = 1 ano
– ou = 2 anos
4 anos Único substrato onde há duas igualdades aritméticas.
Os demais tem apenas uma ou nenhuma igualdade.
+ de 2 anos e
– ou = 4 anos
8 anos Observe-se que os prazos prescricionais crescem de 4 em 4 anos a partir do substrato anterior.
+ de 4 anos e
– ou = 8 anos
12 anos
+ de 8 anos e
– ou = 12 anos
16 anos
+ de 12 anos 20 anos

Pretensões punitiva e executória

No mais, o ordenamento prevê dois gêneros de prescrição: a da pretensão punitiva e a da pretensão executória.

A prescrição da pretensão punitiva ocorre antes do trânsito em julgado da decisão final, extinguindo qualquer consequência do crime. A seu turno, a prescrição da pretensão executória se dá posteriormente ao trânsito em julgado, com a inércia estatal em aplicar de fato a sanção definida. Neste caso, consequências acessórias da punição permanecem, como a reincidência, sendo apenas a pena em si extinta.

 

Cômputo em concreto e em abstrato

Somado a esses dois critérios, ainda note-se que a prescrição pode ser computada de duas formas: pela pena cominada em abstrato ou em concreto.

O cômputo pela pena in abstracto leva em consideração a pena máxima que o indivíduo pode receber e usualmente é reconhecida antes da condenação (visto que, até então, não há pena concreta cominada para se definir outro critério). A lógica é simples, pois havendo lapso de tempo correspondente ao prazo de prescrição máximo para certo delito, inevitavelmente teremos prescrição, pois já estamos considerando a pior das hipóteses para o réu em termos de pena. Exemplo simples: o homicídio simples (art. 120, caput, do CP) tem pena máxima de 20 anos. Sendo duração maior que 12 anos, aplica-se a regra do art. 109, I, do CP, que indica a prescrição desse crime em 20 anos. Se, entre o dia da consumação (art.
111, I, do CP) e a apresentação da denúncia existir lapso temporal superior a 20 anos, a pretensão punitiva estará prescrita.

O cômputo pela pena in concreto difere:

Ao fim do processo, havendo condenação e imputação de determinada pena, esta passa a ser o critério para apuração do respectivo prazo prescricional, em correlação com a lista do art. 109, do CP.

Termo inicial e marcos interruptivos

A prescrição funciona pelo cômputo do decurso temporal. Para realizar esse procedimento cronológico, é necessário entender quais os momentos em que se inicia tal contagem e as circunstâncias que interrompem a mesma, reiniciando-a.

É o que se descobre nos arts. 111 e 117, do CP:

Art. 111 – A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, começa a correr:
I – do dia em que o crime se consumou;
II – no caso de tentativa, do dia em que cessou a atividade criminosa;
III – nos crimes permanentes, do dia em que cessou a permanência;
IV – nos de bigamia e nos de falsificação ou alteração de assentamento do registro civil, da data em que o fato se tornou conhecido.
V – nos crimes contra a dignidade sexual de crianças e adolescentes, previstos neste Código ou em legislação especial, da data em que a vítima completar 18 (dezoito) anos, salvo se a esse tempo já houver sido proposta a ação penal.

Art. 117 – O curso da prescrição interrompe-se:
I – pelo recebimento da denúncia ou da queixa;
II – pela pronúncia;
III – pela decisão confirmatória da pronúncia;
IV – pela publicação da sentença ou acórdão condenatórios recorríveis;
V – pelo início ou continuação do cumprimento da pena;
VI – pela reincidência.

Obs: note-se que a “publicação” da sentença ocorre com a entrega em mãos ao escrivão, que lavrará termo nos autos e registrará em livro próprio, conforme art. 389, do CPP. Também é interessante perceber que “acórdão condenatório” é o que condena após absolvição em primeiro grau ou o que altera substancialmente a condenação pré-existente. A simples confirmação pelo Tribunal não interrompe a prescrição.

Espécies de prescrição da pretensão punitiva

O já exposto nos traz algumas possibilidades:

Prescrição da pretensão punitiva em abstrato: Antes da cominação de pena e do trânsito em julgado. Utiliza-se a pena máxima cominável no tipo penal (considerando qualificadoras, que usualmente determinam diferentes penas, e majorantes e minorantes, que podem ir além ou aquém dos limites do preceito secundário (pena prevista). Pode incidir entre quaisquer das causas interruptivas do art. 117, do CP.

Como já mencionado, no caso da prescrição em abstrato, admite-se sempre a pior hipótese fática cabível, para fins de cômputo do prazo.

Tome-se o roubo majorado como exemplo. O roubo em si (art. 157, caput) tem pena máxima de dez anos (prescrição em 16 anos), mas se houver emprego de arma (art. 157, §2º, I), pode incidir majorante de um terço até metade. Para fins de prescrição, será necessário cogitar o incremento máximo sobre a pena máxima, o que revela uma pena de quinze anos, com prazo de prescrição em 20 anos.

Por outro lado, com base na pena cominada concretamente, com trânsito em julgado para a acusação (impedindo majoração da pena ulteriormente), temos outras hipóteses de prescrição da pretensão punitiva, abaixo descritas.

É possível também tais hipóteses de prescrição, conforme explica Masson, nas hipóteses em que há recurso acusatório, mas que este não é capaz de alterar o prazo prescritivo pertinente, como nos casos em que se pede majoração da pena de 1 para 2 anos. (MASSON, Cleber. Direito penal: parte geral. São Paulo: Método, 2017, p. 1066).

STF – Súmula 146: A prescrição da ação penal regula-se pela pena concretizada na sentença, quando não há recurso da acusação.

Prescrição da pretensão punitiva retroativa: Após cominação de pena nos termos acima, surge nova oportunidade de cálculo da prescrição com base na pena imposta, com relação aos períodos passados do processo, anteriores à publicação da sentença. Os marcos iniciais são os existentes a partir do recebimento da denúncia. Tal hipótese é ratificada pelo art. 110, §1º, do CP:

§1º A prescrição, depois da sentença condenatória com trânsito em julgado para a acusação ou depois de improvido seu recurso, regula-se pela pena aplicada, não podendo, em nenhuma hipótese, ter por termo inicial data anterior à da denúncia ou queixa.

É importante observar que as alterações legislativas de 2010 reduziram o escopo da prescrição retroativa, pois não se admite termo inicial anterior à denúncia ou à queixa.

A Lei 12.234/2010, ao dar nova redação ao art. 110, §1º, do Código Penal, não aboliu a prescrição da pretensão punitiva, na modalidade retroativa, fundada na pena aplicada na sentença. Apenas vedou, quanto aos crimes praticados na sua vigência, seu reconhecimento entre a data do fato e a do recebimento da denúncia ou da queixa. (STF – HC 122694, Relator Ministro Dias Toffoli, Tribunal Pleno, julgamento em 10.12.2014, DJe 19.2.2015)

Exemplo: Um indivíduo recepta um certo bem (art. 180), estando sujeito à pena de um a quatro anos. Entre a consumação e o recebimento da denúncia, há mora de quatro anos (não ocorre prescrição, pois nesta faixa só é possível a prescrição em abstrato, que depende de oito anos neste caso). Entre o recebimento da denúncia e a publicação da sentença condenatória, há lapso de cinco anos. Entretanto, a condenação é de apenas um ano de reclusão e não há recurso da acusação. Considerando que essa pena em concreto tem como prazo prescricional correspondente o período de 4 anos (art. 109, VI), percebe-se que o lapso temporal anterior (portanto, retroativo) é superior (5 anos), possibilitando o reconhecimento da prescrição retroativa.

Prescrição da pretensão punitiva superveniente ou intercorrente: com base no mesmo art. 110, §1º, do CP, temos prescrição com base na pena aplicada, mas com pensamento para o futuro do processo, notadamente a demora para julgamento dos recursos de defesa (lapso temporal entre a publicação da sentença e publicação do acórdão).

Exemplo: um indivíduo pratica estelionato (art. 171), sendo condenado a um ano de reclusão. Só a defesa recorre. Contando a partir da publicação da sentença (marco interruptivo e também termo inicial neste caso), a pretensão punitiva prescreverá em quatro anos (art. 109, V), se não for prolatado acórdão antes. Advindo publicação de acórdão neste prazo, a contagem se reinicia com o recurso da defesa, sendo necessária a decisão do STF/STJ no mesmo prazo, sob pena de advento da prescrição.

Prescrição da pretensão executória

Havendo trânsito em julgado da sentença condenatória para a acusação (havendo críticas sobre esta redação e posição de que o trânsito deve ser para ambas as partes) e verificando-se inércia executiva pelo prazo do art. 109, tendo como base a pena imputada definitivamente, ocorre prescrição da pretensão executória, mantidos os demais efeitos acessórios da condenação.

Art. 110 – A prescrição depois de transitar em julgado a sentença condenatória regula-se pela pena aplicada e verifica-se nos prazos fixados no artigo anterior, os quais se aumentam de um terço, se o condenado é reincidente.

Seu termo inicial é o trânsito em julgado da decisão para a acusação, nos termos da legislação.

Art. 112 – No caso do art. 110 deste Código, a prescrição começa a correr:
I – do dia em que transita em julgado a sentença condenatória, para a acusação, ou a que revoga a suspensão condicional da pena ou o livramento condicional;
II – do dia em que se interrompe a execução, salvo quando o tempo da interrupção deva computar-se na pena.

Sobre a interpretação do primeiro inciso, aduz a doutrina:

Essa regra se afigura contraditória, mas é extremamente favorável ao réu. De fato, a prescrição da pretensão executória depende do trânsito em julgado para ambas as partes, mas, a partir do momento em que isso ocorre, seu termo inicial retroage ao trânsito em julgado para a acusação. É o que se infere do art. 112, I, 1ª parte, do Código Penal. (MASSON, Cleber. Direito penal: parte geral. São Paulo: Método, 2017, p. 1074)

Complementação

A prescrição é matéria de ordem pública, podendo ser reconhecida a pedido ou de ofício pelo magistrado, em qualquer momento do processo, nunca precluindo.

Código de Processo Penal – Art. 61. Em qualquer fase do processo, o juiz, se reconhecer extinta a punibilidade, deverá declará-lo de ofício.

Em regra, a pretensão punitiva é prescritível. No entanto, a Constituição Federal traz as únicas hipóteses de imprescritibilidade admitidas no ordenamento pátrio: o racismo e a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático.

Constituição Federal – Art. 5º […]
XLII – a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei;
XLIV – constitui crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático;

A prescrição, sendo matéria de índole material-penal, tem repercussão no princípio da retroatividade em caso de mudanças. Se a alteração beneficiar o réu, a lei nova é aplicada aos casos anteriores. Caso contrário, só valerá para casos posteriores à sua vigência.

A prescrição da pretensão punitiva em perspectiva (ou antecipada ou virtual) é uma construção doutrinária e jurisprudencial, sem previsão normativa, que visa o reconhecimento antecipado da prescrição com base na provável pena concreta que irá ser cominada, antes mesmo do advento da condenação (réu primário, boas circunstâncias judiciais, menor de 21 anos na data do fato, instrução demorada etc.). O julgador, com base nas circunstâncias do caso concreto, observa que o autor provavelmente será condenado em pena cujo prazo prescritivo se encaixa nos marcos interruptivos da prescrição. Para evitar a inócua e ineficaz atividade jurisdicional e prezar pela celeridade e economia, o Juízo poderia reconhecer de pronto a prescrição antecipada ou virtual (pois se baseia em cogitação), evitando o desperdício de esforço e recursos públicos.
A prática, entretanto, é desabonada pelo Superior Tribunal de Justiça, cuja entendimento sumulado expõe:

STJ – Súmula 438: É inadmissível a extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva com fundamento em pena hipotética, independentemente da existência ou sorte do processo penal.

Prescrição da pena de multa: aplica-se o art. 114, do CP:

Art. 114 – A prescrição da pena de multa ocorrerá:
I – em 2 (dois) anos, quando a multa for a única cominada ou aplicada;
II – no mesmo prazo estabelecido para prescrição da pena privativa de liberdade, quando a multa for alternativa ou cumulativamente cominada ou cumulativamente aplicada.

Redução dos prazos prescricionais: ocorre em conformidade com o art. 115, do CP:

Art. 115 – São reduzidos de metade os prazos de prescrição quando o criminoso era, ao tempo do crime, menor de 21 (vinte e um) anos, ou, na data da sentença, maior de 70 (setenta) anos.

Suspensão da prescrição: ocorre conforme art. 116, do CP, em situações de prejudicialidade com outro processo (como no caso da resolução da bigamia em âmbito cível ou a verificação do estado civil do réu ou vítima). Existem outra hipóteses na legislação extravagante.

Art. 116 – Antes de passar em julgado a sentença final, a prescrição não corre:
I – enquanto não resolvida, em outro processo, questão de que dependa o reconhecimento da existência do crime;
II – enquanto o agente cumpre pena no estrangeiro.
Parágrafo único – Depois de passada em julgado a sentença condenatória, a prescrição não corre durante o tempo em que o condenado está preso por outro motivo.

Questões

(FCC – PGE/SE – 2005 – Procurador) A prescrição:

a) admite a interrupção, mas não a suspensão do respectivo prazo.

Falso. As causas impeditivas do art. 116 são situações de suspensão.

b) exclui o dia de início na contagem do prazo.

Falso. Como regra de direito material, conta-se o dia de início, conforme art. 10, do CP. A exclusão do dia inicial é procedimento de direito processual.

c) é calculada pelo total da pena no caso de concurso de crimes.

Falso. Art. 119 – No caso de concurso de crimes, a extinção da punibilidade incidirá sobre a pena de cada um, isoladamente.

d) é calculada pelo máximo da pena cominada no caso de prescrição da pretensão executória.

Usa-se a pena cominada concretamente. Apenas a prescrição da pretensão em abstrato usa a pena máxima.

e) não é interrompida pela sentença absolutória recorrível.

Correto. A previsão do art. 117 fala em sentença ou acórdão condenatórios.

 

(FCC – TJ/RR – 2008 – Juiz) A prescrição:

a) é calculada pelo total da pena no caso de concurso de crimes.

Art. 119. Mesmo comentário acima.

b) admite a interrupção, mas não a suspensão do respectivo prazo.

Mesmo comentário acima. Art. 116

c) é calculada pelo máximo da pena cominada no caso de prescrição da pretensão executória.

Mesmo comentário da questão anterior.

d) exclui o dia de início na contagem do prazo.

Mesmo comentário da questão anterior. Art. 10

e) retroativa constitui modalidade de prescrição da pretensão punitiva.

Correto.

 

(FCC – TCE/RO – 2010 – Procurador) A prescrição é interrompida:

a) pelo oferecimento da denúncia.

Pelo recebimento.

b) pela sentença absolutória imprópria.

Pela sentença condenatória. A falta de previsão, inclusive, importaria em analogia contrária ao réu, proibida no Direito Penal.

c) pela reincidência, se corresponder à prescrição da pretensão punitiva.

Trata-se de marco interruptivo da pretensão executória. O concurso de crimes antes da execução impõe prescrição isolada de cada um.

d) pela sentença concessiva de perdão judicial.

Pela sentença condenatória. A falta de previsão, inclusive, importaria em analogia contrária ao réu, proibida no Direito Penal.

e) pelo acórdão condenatório recorrível.

Correto. Art. 117.

 

(FCC – TJ/GO – 2015 – Juiz) A interrupção da prescrição:

a) não leva a que comece a correr novamente o prazo a partir do dia em que verificada a causa interruptiva, no caso de continuação do cumprimento da pena.

Correto. Art. 117, §2º. A regra é que a prescrição retorne a partir do dia da interrupção, salvo no início ou continuação do cumprimento da pena.

b) ocorre com o oferecimento da denúncia ou da queixa, e não com o recebimento.

Apenas recebimento.

c) é extensível aos crimes conexos, ainda que objeto de processos distintos, se verificada em relação a qualquer deles.

É necessário que haja processamento no mesmo feito. Art. 117, §1º.

d) produz efeitos relativamente a todos os autores do crime quando do início ou continuação do cumprimento da pena por algum deles.

A regra é que produza, salvo na reincidência ou início e continuação do cumprimento de pena, pois a condição é personalíssima do agente.

e) ocorre com a publicação da sentença ou acórdãos absolutórios recorríveis.

Sentença ou acórdão condenatórios.

Estrito cumprimento do dever legal e exercício regular de direito

O estrito cumprimento do dever legal e o exercício regular de direito são circunstâncias que justificam a conduta praticada, tornando-a compatível com o ordenamento e, consequentemente, impedindo o reconhecimento da prática delituosa.

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