Ciências jurídicas e temas correlatos

Autor: Victor Augusto Page 23 of 27

Extrafiscalidade e efeito de confisco

A extrafiscalidade é uma característica imbuída em alguns tributos. As exações tributárias que possuem tal natureza não encerram seus interesses na mera arrecadação de recursos para o Estado (natureza típica fiscal, como o imposto de renda), sendo de interesse precípuo também a fiscalização e regulação de certas atividades econômicas. Nestas situações, explica a doutrina que a tributação é usada como “instrumento de intervenção estatal no meio social e na economia privada” (BECKER, 2010, p. 629).

Estas finalidades, consequentemente, implicam um tratamento diferenciado aos tributos extrafiscais, na medida em que, em regra, estes não se sujeitam a certos limites do poder de tributar, possuindo maleável manuseio. São tributos como o imposto de importação, que apresentam alíquotas elevadas (exatamente para frear a importação e fomentar o mercado interno) e majorações aplicáveis de imediato, sem necessidade de se aguardar o prazo de noventa dias ou o início do exercício financeiro seguinte (hipóteses de anterioridade).

Essa condição diferenciada pode levar a uma situação de abuso e confisco, situações em que a propriedade do contribuinte é desarrazoadamente tolhida.

CF/88: Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
IV – utilizar tributo com efeito de confisco;

Para Aliomar Baleeiro, tributos confiscatórios seriam aqueles que “absorvem parte considerável do valor da propriedade, aniquilam a empresa ou impedem o exercício de atividade lícita e moral” (1977, p. 262).

A extrafiscalidade, com efeito, não é refúgio para que se ignorem direitos fundamentais do contribuinte. Sobre a questão, afirma Goldschmidt (2007, p. 195):

A tributação extrafiscal é admitida em certas circunstâncias pela Carta, mas, como ensinou Casanova, tal fato não excepciona o princípio do não-confisco, que incide quando se fizerem presentes seus pressupostos. Admite-se uma elevação da tributação por conta da extrafiscalidade (quando a mesma esteja permitida, evidentemente), mas essa elevação não pode chegar à medida da destruição, da penalização, ou da aniquilação de outros direitos do contribuinte, mesmo porque o constituinte não excepcionou a observância do art. 150, IV, nas hipóteses em que permitiu o uso extrafiscal da tributação. Ou seja, o princípio do não-confisco não só é plenamente aplicável à extrafiscalidade, como igualmente não sofre qualquer restrição no que concerne aos seus contornos qualitativos (salvo casos expressos).

 

Referências

BALEEIRO, Aliomar. Limitações constitucionais ao poder de tributar.Rio de Janeiro: Forense, 1977.

BECKER, Alfredo Augusto. Teoria Geral do Direito Tributário. São Paulo: Noeses, 2010.

GOLDSCHMIDT, Fabio Brun. O princípio do Não-Confisco no Direito Tributário. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003.

STF – Informativo nº 891 comentado

Plenário
Código Florestal e constitucionalidade – 2
1ª Turma
Inexigibilidade de licitação e tipicidade da conduta
2ª Turma
Execução provisória da pena e trânsito em julgado
Gestantes e mães presas preventivamente e “habeas corpus” coletivo

Plenário

Código Florestal e constitucionalidade – 2 (ADC 42/DF e outros)

Julgamento suspenso.

 

Primeira Turma

Inexigibilidade de licitação e tipicidade da conduta (Inq. 3962/DF)

Neste caso, a Turma rejeitou denúncia apresentada em desfavor de parlamentar federal pela suposta prática da conduta prevista no art. 89, da Lei nº 8.666/93:

Art. 89. Dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses previstas em lei, ou deixar de observar as formalidades pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade:
Pena – detenção, de 3 (três) a 5 (cinco) anos, e multa.
Parágrafo único. Na mesma pena incorre aquele que, tendo comprovadamente concorrido para a consumação da ilegalidade, beneficiou-se da dispensa ou inexigibilidade ilegal, para celebrar contrato com o Poder Público.

 

A Turma rejeitou a denúncia oferecida, tendo em vista que não se convenceu da existência de materialidade criminosa. Argumentou que a mera existência de irregularidades não seria o suficiente para configurar o crime, que necessita da existência de violação a princípios cardeais da Administração Pública.

O delito em questão exige, além do dolo genérico — representado pela vontade consciente de dispensar ou inexigir licitação com descumprimento das formalidades —, a configuração do especial fim de agir, que consiste no dolo específico de causar dano ao erário ou de gerar o enriquecimento ilícito dos agentes envolvidos na empreitada criminosa.

Para reforçar esse entendimento, suscitou a existência de elementos que corroboram a tese defensiva, como a existência de pareceres favoráveis.

 

Segunda Turma

Execução provisória da pena e trânsito em julgado

A Segunda Turma afetou ao Plenário o julgamento de habeas corpus em que se discute a possibilidade de execução provisória da pena após o julgamento de recurso em segundo grau de jurisdição.

 

Gestantes e mães presas preventivamente e “habeas corpus” coletivo (HC 143641/SP)

A Segunda Turma concedeu a ordem em habeas corpus coletivo impetrado pela Defensoria Pública da União em favor de todas as mulheres presas preventivamente que ostentem a condição de gestantes, de puérperas (condição pós-parto) ou de mães de crianças sob sua responsabilidade, permitindo a prisão domiciliar de tais pacientes, sem prejuízo de outras medidas:

CPP: Art. 319. São medidas cautelares diversas da prisão:
I – comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo juiz, para informar e justificar atividades;
II – proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações;
III – proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela permanecer distante;
IV – proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja conveniente ou necessária para a investigação ou instrução;
V – recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos;
VI – suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais;
VII – internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes praticados com violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser inimputável ou semi-imputável (art. 26 do Código Penal) e houver risco de reiteração;
VIII – fiança, nas infrações que a admitem, para assegurar o comparecimento a atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial;
IX – monitoração eletrônica.

Entretanto, como exceção, entendeu a Segunda Turma que a ordem não beneficia acusadas por crimes praticados mediante violência ou grave ameaça contra seus descendentes ou, ainda, em situações excepcionalíssimas, as quais deverão ser devidamente fundamentadas pelos juízes que denegarem o benefício.

A decisão em questão privilegia a visão de excepcionalidade da prisão como medida cautelar e a proteção constitucional e legal da infância (art. 227, da CF/88, e ECA).

CF/88: Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

Noções sobre a regra matriz de incidência tributária

No âmbito da ciência tributária, a chamada regra matriz de incidência tributária é uma ferramenta didática que nos revela critérios que identificam e individualizam a exação. Trata-se de um útil desenho do tributo, contribuindo para a verificação da fenomenologia da subsunção do fato à norma, e permitindo a visualização dos efeitos jurídicos pertinentes à incidência tributária. Paulo de Barros Carvalho (2011, p. 316) faz uma explanação:

O objeto sobre o qual converge o nosso interesse é a fenomenologia da incidência da norma tributária em sentido estreito ou regra-matriz de incidência tributária. Nesse caso, diremos que houve a subsunção, quando o fato (fato jurídico tributário constituído pela linguagem prescrita pelo direito positivo) guardar absoluta identidade com o desenho normativo da hipótese (hipótese tributária). Ao ganhar concretude o fato, instala-se automática e infalivelmente, como diz Alfredo Augusto Becker, o laço abstrato pelo qual o sujeito ativo torna-se o titular do direito subjetivo público de exigir a prestação, ao passo que o sujeito passivo ficará na contingência de cumpri-la.

Na conformação da regra matriz, encontramos dois momentos: antecedente e consequente. No primeiro, temos um enunciado hipotético pelo qual se determinam três parâmetros que individualizam o fato jurídico tributário: material, espacial e temporal. No conseqüente, encontramos a regulação prescritiva, a determinação das obrigações decorrentes da concretização dos critérios antecedentes. Neste momento temos dois parâmetros: pessoal e quantitativo.

Alfredo Augusto Becker (2010, p. 350), ainda, resume essa sistematização à ideia de núcleo e de elementos adjetivos, guiados por certas “coordenadas”:

A dissecação de toda e qualquer hipótese de incidência mostrará que ela se compõe de um único núcleo e de um ou mais elementos adjetivos e que ela somente poderá se realizar na época e no espaço que foram previstos pelas coordenadas de tempo e lugar.

 

O antecedente da regra matriz

O critério material, que se insere no antecedente da regra matriz de incidência tributária, descreve uma atividade, uma atuação, um comportamento rodeado por circunstâncias temporais e espaciais. É normalmente avistado através de um verbo. Sobre esta anotação específica, Carvalho (2011, p. 326) adverte:

Regressando ao tópico da transcendente importância do verbo, para a definição do antecedente da norma-padrão do tributo, quadra advertir que não se pode utilizar os da classe dos impessoais (como haver), ou aqueles sem sujeito (como chover), porque comprometeriam a operatividade dos desígnios normativos, impossibilitando ou dificultando seu alcance. Isso concerne ao sujeito, que pratica a ação, e bem assim ao complemento do predicado verbal, que, impreterivelmente, há de existir. Descabe falar-se, portanto, de verbos de sentido completo, que se expliquem por si mesmos. É forçoso que se trate de verbo pessoal e de predicação incompleta, o que importa a obrigatória presença de um complemento.

O critério espacial descreve o local onde se aperfeiçoa o critério material.

 

O critério temporal, por sua vez, determina quando, em uma linha cronológica, a hipótese se aperfeiçoa e revela-se apta a gerar efeitos jurídicos.

Nota: é válido ressaltar a importância de se saber com precisão o momento em que o fato descrito na norma tributária ocorre. Com efeito, aperfeiçoada a hipótese, gerando suas consequências típicas, surge um liame obrigacional entre ente tributante e contribuinte. A partir deste momento, há obrigação tributária, e este marco é de grande importância para aferição, por exemplo, da decadência do direito de lançar o tributo.

 

O consequente da regra matriz

No consequente da regra matriz de incidência tributária, estamos diante de uma efetiva incidência, mas que pode ser visualizada e estudada abstratamente.

Neste momento, temos as características básicas da obrigação que nasce entre contribuinte/responsável e Fisco. Podemos, portanto, analisar os dois critérios que compõem o consequente da regra matriz: critério pessoal e critério quantitativo. Becker traduz esse consequente como a irradiação da incidência da regra jurídica sobre a hipótese de incidência. Diz o autor que:

[…] a irradiação da relação jurídica é um efeito (consequência) jurídico da incidência da regra jurídica. (BECKER, 2010, p. 361).

Pelo critério pessoal, buscamos os sujeitos da relação proveniente da materialização da hipótese de incidência. Trata-se dos sujeitos ativo e passivo.

Quanto ao critério quantitativo, temos a dimensão pecuniária da prestação tributária. Trata-se da verificação da base de cálculo e da alíquota do tributo. Com efeito:

[…] é no critério quantitativo que encontraremos referências às grandezas mediante as quais o legislador pretendeu dimensionar o fato jurídico tributário, para efeito de definir a quantia a ser paga pelo sujeito passivo, a título de tributo.” (CARVALHO, 2011, p. 353).

A base de cálculo é uma dimensão monetária do objeto tributável sobre a qual incide uma operação matemática (alíquota), a fim de se determinar a quantia devida do tributo.

As alíquotas são as referidas operações matemáticas, podendo ser específicas, quando determinam uma relação de quantia de tributo a ser pago por unidade de medida prevista em lei, daquele objeto tributável, seja por peso, tamanho etc.; também podem ser ad valorem, isto é, determina-se uma percentagem que deve recair sobre o valor do produto ou operação.Podem, ainda, ser mistas, fazendo uso dos dois sistemas anteriores.

A análise do antecedente e consequente da regra matriz de incidência tributária permite uma compreensão teórica e prática do tributo, pois se desenha um esqueleto de sua existência normativa e aplicação.

 

Referências

BECKER, Alfredo Augusto. Teoria Geral do Direito Tributário. São Paulo: Noeses, 2010.

CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. São Paulo: Saraiva, 2011.

STF – Informativo nº 890 comentado

Plenário
Planos de saúde e direito do consumidor
Lei estadual e requisição de pequeno valor
Planos e seguros privados de assistência à saúde
Planos e seguros privados de assistência à saúde e ressarcimento ao SUS
Responsabilidade subsidiária da Administração Pública por débitos trabalhistas – 2
Comunidade dos quilombos e decreto autônomo – 10
1ª Turma
Prescrição da pretensão punitiva e execução imediata da pena
2ª Turma
Quebra de sigilo telefônico e telemático
Progressividade das alíquotas de ITR e Território Rural

Plenário

Planos de saúde e direito do consumidor (ADI 4512/MS)

O Plenário apreciou ação direta que discutia a criação de obrigação aos planos de saúde por meio de lei estadual. Para a Corte, o Estado do MS agiu dentro de sua competência constitucional (proteção do consumidor e acesso à informação) ao determinar que os planos de saúde fornecessem comprovante e informações pertinentes a eventuais recusas em face dos beneficiários.

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: XXXII – o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor;

Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre: VIII – responsabilidade por dano ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico;

Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: V – defesa do consumidor;

Para o STF, a competência privativa relacionada com planos e seguros de assistência à saúde abrange apenas as questões contratuais e securitárias gerais, sob atuação centralizada da União.

Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: VII – política de crédito, câmbio, seguros e transferência de valores;

 

Lei estadual e requisição de pequeno valor

O STF entendeu que é lícito aos entes federados fixar o valor máximo para enquadramento no pagamento por meio de requisição de pequeno valor (RPV), desde que se obedeça ao princípio constitucional da proporcionalidade.

No caso, o Estado de Rondônia fixou como parâmetro para enquadramento o valor de dez salários mínimos. O STF, considerando o IDH da referida unidade federativa, não vislumbrou violação ao princípio da proporcionalidade.

Obs: quando não há previsão legislativa local sobre o patamar máximo de dívidas públicas para pagamento por meio de RPV, aplica-se o que prevê o art. 87, do ADCT: I – quarenta salários-mínimos, perante a Fazenda dos Estados e do Distrito Federal; II – trinta salários-mínimos, perante a Fazenda dos Municípios.

 

Planos e seguros privados de assistência à saúde (ADI 1931/DF)

O Plenário se debruçou sobre dispositivos da Lei nº 9.656/98, que dispõe sobre planos e seguros privados de saúde, e entendeu que certas modificações trazidas pela MP nº 2.177-44/01 seria inconstitucionais por violação do art. 5º, XXXVI, da Constituição.

XXXVI – a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada;

As novas regras não poderiam afetar contratos aperfeiçoados anteriormente, como pretendia a nova legislação, sob pena de ferimento de tais preceitos constitucionais.

Em relação a outros dispositivos impugnados, o STF rechaçou a existência de inconstitucionalidade com base em diversos parâmetros constitucionais, como a defesa e auxílio dos idosos (art. 230, da CF), a defesa do consumidor (art. 170, da CF) e a promoção da saúde (art. 196, da CF).

A Corte também se pronunciou sobre disposição que determina o ressarcimento dos cofres públicos quando o agente privado de saúde se beneficiar do atendimento público gratuito prestado pelo Estado, mesmo possuindo a obrigação contratual de prestar tal atendimento. 

A escolha do agente privado de atuar na prestação de relevantes serviços à saúde, de forma concorrente com o Estado, pressupõe a responsabilidade de arcar integralmente com as obrigações assumidas. A norma impede o enriquecimento ilícito das empresas e a perpetuação de modelo no qual o mercado de serviços de saúde submeta-se unicamente à lógica do lucro, ainda que às custas do erário. Entendimento em sentido contrário resultaria em situação em que os planos de saúde recebem pagamentos mensais dos segurados, mas os serviços continuam a ser fornecidos pelo Estado, sem contrapartida.

 

Planos e seguros privados de assistência à saúde e ressarcimento ao SUS

Na mesma toada do julgamento acima, neste RE o STF decidiu que o ressarcimento previsto no art. 32, da Lei nº 9.656/98.

Art. 32.  Serão ressarcidos pelas operadoras dos produtos de que tratam o inciso I e o § 1o do art. 1o desta Lei, de acordo com normas a serem definidas pela ANS, os serviços de atendimento à saúde previstos nos respectivos contratos, prestados a seus consumidores e respectivos dependentes, em instituições públicas ou privadas, conveniadas ou contratadas, integrantes do Sistema Único de Saúde – SUS.

 

Responsabilidade subsidiária da Administração Pública por débitos trabalhistas – 2

O STF entendeu que houve perda superveniente do objeto das reclamações.

 

Comunidade dos quilombos e decreto autônomo – 10

A demanda em questão aborda decreto que demarca e desapropria terras em prol de comunidades quilombolas.

Assim, ao determinar que fossem levados em consideração, na medição e na marcação da terra, os critérios de territorialidade indicados pelos remanescentes das comunidades quilombolas, longe de submeter o procedimento demarcatório ao arbítrio dos próprios interessados, a norma positivaria o devido processo legal, na garantia de que as comunidades envolvidas tivessem voz e fossem ouvidas. Portanto, não haveria vício de inconstitucionalidade no procedimento de desapropriação previsto no Decreto 4.887/2003.

Obs: é importante perceber que decretos usualmente são atos normativos secundários, inaptos a serem objetos de ação direta. No caso, entretanto, a maioria dos Ministros entendeu que o Decreto 4.887/2003 teria abstração e generalidade normativa suficiente para se submeter ao controle. “A aferição de constitucionalidade dos decretos, na via da ação direta, só seria vedada quando estes se adstringissem ao papel secundário de regulamentar normas legais, cuja inobservância ensejasse apenas conflito resolúvel no campo da legalidade.”.

 

Primeira Turma

Prescrição da pretensão punitiva e execução imediata da pena

Trata-se de curiosa situação de apreciação de Recurso Especial pelo STF. Isso só é possível em virtude da investidura em cargo com foro privilegiado na fase recursal. No caso, a autoridade municipal foi condenada e, posteriormente, apresentou recurso especial. Em seguida, tomou posse em cargo de deputado federal, atraindo a competência do STF para julgar o recurso.

No julgamento em si, o STF desproveu o apelo, entendendo que se pretendia revolvimento de matéria fático-probatória, medida inviável na esfera dos recursos extraordinários.

 

Segunda Turma

Quebra de sigilo telefônico e telemático

Neste recurso ordinário em habeas corpus, a Segunda Turma entendeu que a interceptação telefônica pode ser decretada com fundamento em denúncia (notícia de crime) que ao menos indique sua autoria. Nestas circunstâncias, não estar-se-ia diante de uma denúncia propriamente anônima.

Nota: o recurso ordinário para o STF neste caso deriva do art. 102, II, “a”, da CF/88, que se refere ao habeas corpus denegado no âmbito dos tribunais superiores em julgamento originário (casos com foro privilegiado).

Também argumentou que outros elementos preliminares reforçaram os fundamentos necessários para adoção das medidas investigativas e para a evidência de materialidade e autoria, como a existência de informações provenientes do Ministério da Justiça e da Controladoria-Geral da União.

No que diz respeito ao sigilo de correspondência, entendeu a Turma que a exceção alcança inclusive as comunicações telemáticas (como e-mails), razão pela qual não existe vício nesta interceptação.

 

Progressividade das alíquotas de ITR e Território Rural

A Segunda Turma, reconhecendo o caráter extrafiscal do imposto sobre propriedade territorial rural (ITR), de competência da União.

Nota: a extrafiscalidade é uma característica de certos tributos que denota uma função além da mera captação de recursos pelo Estado (caráter fiscal, como o imposto de renda). No caso do ITR, a Constituição revela que o mesmo busca forçar o uso produtivo da terra rural, beneficiando especialmente pequenas glebas.

Alguns dispositivos constitucionais são relevantes:

Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre: VI – propriedade territorial rural;
§ 4º O imposto previsto no inciso VI do caput:
I – será progressivo e terá suas alíquotas fixadas de forma a desestimular a manutenção de propriedades improdutivas;
II – não incidirá sobre pequenas glebas rurais, definidas em lei, quando as explore o proprietário que não possua outro imóvel;
III – será fiscalizado e cobrado pelos Municípios que assim optarem, na forma da lei, desde que não implique redução do imposto ou qualquer outra forma de renúncia fiscal.

Para a Turma, não há inconstitucionalidade na progressividade de alíquotas em razão do tamanho da propriedade, tendo em vista que este é um parâmetro que funciona em conjunto com a percepção do grau de utilização da terra para definir aspectos de produtividade.

 

Neutralidade de rede no Marco Civil da Internet (Lei nº 12.965/14)

Um dos temas recorrentes no que diz respeito ao estudo do acesso à Internet é a proteção da neutralidade de rede. Em poucas palavras, a neutralidade de rede é o atributo que impede a discriminação dos dados acessados pelos usuários. Ou seja: a pessoa paga um preço definido por ter acesso à Internet e este acesso terá que ser livre e indiscriminado, independentemente dos dados que sejam consumidos.

A neutralidade repercute em face de agentes públicos e privados. No primeiro caso, a preocupação é em evitar a censura, tal como ocorre em diversos países do mundo, onde é proibido o acesso a conteúdos indesejados pelo poder dominante. No segundo caso, a neutralidade impede a discriminação geral de dados com base no uso (redução ou degradação da qualidade – velocidade ou latência – do acesso a vídeos e jogos ou redução ou degradação de velocidade para acessar o serviço do concorrente, por exemplo).

A neutralidade da rede visa à garantia de que o usuário, que contrata pacotes de dados para acesso à Internet, seja tratado de forma igual, sem discriminação pelo teor do conteúdo acessado ou pela forma de utilização do sinal contratado. Dessa forma, não haverá distinção de tratamento pelo conteúdo acessado, seja este de cunho político, religioso, ou mesmo relacionado a qualquer gênero, assim, o pressuposto é de que não haverá discriminação por qualquer tipo de material visualizado na rede, salvo aqueles considerados como crimes previstos no Estatuto da Criança e Adolescente (BRANT, 2014, p. 175).

Nos Estados Unidos da América, hoje existe uma situação cinzenta no que diz respeito à garantia, mas no Brasil (por enquanto) há uma definição e proteção legal suficiente, como se pode ver no Marco Civil da Internet (Lei nº 12.965/14):

Art. 9º O responsável pela transmissão, comutação ou roteamento tem o dever de tratar de forma isonômica quaisquer pacotes de dados, sem distinção por conteúdo, origem e destino, serviço, terminal ou aplicação.
§ 1º A discriminação ou degradação do tráfego será regulamentada nos termos das atribuições privativas do Presidente da República previstas no inciso IV do art. 84 da Constituição Federal, para a fiel execução desta Lei, ouvidos o Comitê Gestor da Internet e a Agência Nacional de Telecomunicações, e somente poderá decorrer de:
I – requisitos técnicos indispensáveis à prestação adequada dos serviços e aplicações; e
II – priorização de serviços de emergência.
§ 2º Na hipótese de discriminação ou degradação do tráfego prevista no § 1º, o responsável mencionado no caput deve:
I – abster-se de causar dano aos usuários, na forma do art. 927 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 – Código Civil;
II – agir com proporcionalidade, transparência e isonomia;
III – informar previamente de modo transparente, claro e suficientemente descritivo aos seus usuários sobre as práticas de gerenciamento e mitigação de tráfego adotadas, inclusive as relacionadas à segurança da rede; e
IV – oferecer serviços em condições comerciais não discriminatórias e abster-se de praticar condutas anticoncorrenciais.
§ 3º Na provisão de conexão à internet, onerosa ou gratuita, bem como na transmissão, comutação ou roteamento, é vedado bloquear, monitorar, filtrar ou analisar o conteúdo dos pacotes de dados, respeitado o disposto neste artigo.

Entretanto, como qualquer direito, o acesso neutro à Internet não é absoluto, admitindo restrições legais excepcionalmente. Como se vê, são previstas hipóteses razoáveis, relacionadas com serviços de emergência ou com motivos técnicos, sempre guardados os interesses dos usuários e imposta transparência e publicidade.

Referências

BRANT, Cássio Augusto Barros. Marco civil da Internet: comentários sobre a Lei 12.965/2014. Belo Horizonte: Editora D’Plácido, 2014.

STF – Informativo nº 889 comentado

Plenário
Agências reguladoras e função normativa

Agências reguladoras e função normativa

Na ADI nº 4874/DF, o Supremo julgou improcedente o pedido formulado em face de dispositivo da Lei nº 9.782/99 e, sucessivamente, da Resolução nº 14/2012 da Anvisa. A questão de fundo diz respeito à regulação da indústria do tabaco e envolve a atuação normativa da Anvisa na definição de aspectos técnicos da produção e comercialização da referida droga.

Nota: lembre-se que, tecnicamente, o pedido sucessivo impróprio, ou subsidiário, é aquele que é apreciado apenas se o pedido principal cair em improcedência. Em se tratando de pedido sucessivo próprio, a rejeição do principal implica a do subsidiário. Neste caso, o pedido sucessivo próprio apenas é apreciado se o principal for procedente.

O objeto legal em questão é o seguinte:

Art. 7º Compete à Agência proceder à implementação e à execução do disposto nos incisos II a VII do art. 2º desta Lei, devendo:
III – estabelecer normas, propor, acompanhar e executar as políticas, as diretrizes e as ações de vigilância sanitária;
XV – proibir a fabricação, a importação, o armazenamento, a distribuição e a comercialização de produtos e insumos, em caso de violação da legislação pertinente ou de risco iminente à saúde;

Para o autor da ação, tais dispositivos estariam conferindo amplos poderes normativos à Anvisa, razão pela qual seria necessária a interpretação conforme a Constituição para reduzir tais prerrogativas. Como resultado desse entendimento, apenas deveria ser possível a interpretação de que tais competências da Anvisa servem para regular situações concretamente, e não abstratamente.

Nota: a interpretação conforme a constituição, sem redução de texto, é uma técnica de julgamento em controle de constitucionalidade por meio da qual se reconhece a inconstitucionalidade de possíveis interpretações do texto normativo, mantendo íntegro o texto discutido, mas orientando o aplicador na direção da interpretação compatível com a Constituição. Para que a medida faça sentido, é necessário que o objeto da ação admita mais de uma interpretação (seja, portanto, polissêmico).

O STF, em decisão apertada, discordou da tese autoral, argumentando que os dispositivos legais não são polissêmicos. Entendeu que admitem, portanto, apenas uma interpretação, que seria constitucional no ver da Corte. Essa interpretação revolve em torno do fato de que a competência da Anvisa é executiva e guiada pelas políticas públicas aprovadas em conjunto pelo Executivo e Legislativo, sempre em estrita observância do disposto na lei, mesmo que a autarquia apresente poderes normativos para uma melhor regulação de questões técnicas. A agência não teria os poderes normativos originários amplos suscitados na ação e não teria extrapolado de seu devido nicho operativo.

A função normativa das agências reguladoras, no entanto, notadamente quando atinge direitos e deveres dos administrados ligados ao Estado tão somente por vínculo de sujeição geral, subordina-se necessariamente ao que disposto em lei. Assim, embora dotadas de considerável autonomia, a medida da competência normativa em que são investidas as agências reguladoras será aquela perfeitamente especificada nas leis pelas quais são criadas (ADI 4874).

Em comentários paralelos (obiter dictum), o STF expôs aspectos relevantes do papel das agências reguladoras na conformação atual da Administração Pública:

O Plenário registrou que o advento das agências reguladoras setoriais representa inegável aperfeiçoamento da arquitetura institucional do Estado de Direito contemporâneo no sentido do oferecimento de uma resposta da Administração Pública para fazer frente à complexidade das relações sociais verificadas na modernidade. A exigência de agilidade e flexibilidade cada vez maiores do Estado diante das ininterruptas demandas econômicas e sociais que lhe são direcionadas levou à emergência de estruturas administrativas relativamente autônomas e independentes — as chamadas agências — dotadas de mecanismos aptos e eficazes para a regulação de setores específicos, o que inclui a competência para editar atos qualificados como normativos. Nesse contexto, o escopo do modelo regulatório adotado no Brasil não se reduz à regulação concorrencial, não se limitando à correção das chamadas “falhas de mercado”. Pelo contrário, incorpora também instrumentos necessários para o atingimento de objetivos gerais de interesse público: regulação social, e não apenas econômica (ADI 4874).

Receitas e despesas públicas e respectivas classificações

A análise das receitas e despesas é imprescindível para qualquer empreendimento público ou privado que vise à manutenção de uma atividade econômica sustentável e responsável. No caso do setor público, há o manuseio das entradas financeiras derivadas de tributos e outras aplicações para a persecução dos seus fins constitucionais, que usualmente são acompanhados de intensos ônus financeiros (investimentos em saúde, educação, segurança, defesa etc.).

 

Receitas públicas

As receitas públicas são constituídas pelo recebimento definitivo de dinheiro nos cofres públicos. A doutrina ressalta que se trata de uma entrada sem reservas ou condições (daí sua característica de definitividade, e não de temporariedade ou transitoriedade) (BALEEIRO, 1984). Existindo condições e reservas sobre esse dinheiro, estaremos diante de ingresso público, e não de receita. Um bom exemplo:

[…] quando há uma licitação pública e o edital prevê a necessidade de os interessados depositarem uma caução, esse valor depositado não poderá ser utilizado pela Administração para fazer face às despesas públicas, logo, não é receita pública no sentido de disponibilização para o interesse público. Aludido valor é apenas um ingresso público, ou seja, um valor que foi lançado contabilmente, mas que não poderá ser convertido em bens ou serviços (LEITE, 2016, p. 184).

Em relação à origem, usualmente fala-se em:

Receitas originárias: são aquelas decorrentes da atuação tipicamente privada do Estado, decorrentes do manuseio de seu patrimônio, sem a presença do seu poder impositivo e de sua posição privilegiada nas relações jurídicas. São as quantias derivadas de contratos firmados em situação de paridade na iniciativa privada, decorrentes de investimentos, de indenizações, de doações recebidas ou até mesmo preços públicos ou tarifas (que não são tributos). Sobre preços públicos, note que:

O preço público, de outra parte, não é tributo. Constitui-se em uma receita originária e facultativa decorrente da contraprestação por um bem, utilidade ou serviço, em que está presente a voluntariedade, não havendo obrigatoriedade do consumo (WILGES, 2006, p. 152).

Receitas derivadas, por outro lado, são entradas decorrentes do manuseio da atuação subordinante e imperativa do poder público, possibilitando a exigência de quantia do devedor por simples poder legal, seja por meio do pagamento de tributos ou outras sujeições, como multas. O acréscimo financeiro deriva de imposição em face de outro sujeito.

Receitas transferidas, por fim, são receitas decorrentes de transferências entre entes federativos, usualmente evidenciadas de repasses financeiros da União para Estados e Municípios.

Em relação à natureza da entrada, discutem-se:

Receitas correntes são aquelas decorrentes de atividades típicas dos entes públicos, como a tributação e aplicação de multas. Já as receitas de capital são valores derivados de atuação alheia à atividade típica de Estado, como as relativas a financiamentos e recepção de juros, usualmente originadas da exploração do próprio patrimônio dos entes públicos.

 

Despesas públicas

As despesas públicas são simplesmente os gastos efetuados pelos entes públicos de acordo com a lei, a qual determina as circunstâncias que permitem o uso do dinheiro público. Normas como a Lei Orçamentária Anual usualmente definem os parâmetros para o gasto dentro de certo exercício. Para não ocorrer um engessamento, situações urgentes e imprevistas, bem como a necessidade de reforços financeiros, permitem o uso de créditos adicionais.

As despesas podem ser correntes, quando são relativas à sustentação, manutenção e continuidade da atividade típica do Estado. Usualmente são despesas de custeio, por exatamente se referirem ao custeio da atuação pública e manutenção dos seus serviços, como o pagamento da folha de remuneração dos servidores. Podem também ser transferências correntes, quando a despesa não tem correspondente contraprestação direta (como ocorre com o pagamento de pensões, aposentadorias, subvenções e outros benefícios). A Lei nº 4.320/64 enumera as despesas correntes como despesas de custeio e transferências correntes.

DESPESAS CORRENTES
Despesas de Custeio
Pessoal Civil
Pessoal Militar
Material de Consumo
Serviços de Terceiros
Encargos Diversos
.
Transferências Correntes
Subvenções Sociais
Subvenções Econômicas
Inativos
Pensionistas
Salário Família e Abono Familiar
Juros da Dívida Pública
Contribuições de Previdência Social
Diversas Transferências Correntes.

Já as despesas de capital são investimentos e gastos que visam ao incremento da estrutura pública, indo além da mera preservação e manutenção de uma condição existente. São usualmente investimentos no crescimento do aparato estatal ou de áreas de interesse público. Nos moldes da Lei nº 4.320/64, as despesas de capital podem ser divididas em mais uma classificação:

§ 4º Classificam-se como investimentos as dotações para o planejamento e a execução de obras, inclusive as destinadas à aquisição de imóveis considerados necessários à realização destas últimas, bem como para os programas especiais de trabalho, aquisição de instalações, equipamentos e material permanente e constituição ou aumento do capital de empresas que não sejam de caráter comercial ou financeiro.

§ 5º Classificam-se como Inversões Financeiras as dotações destinadas a:
I – aquisição de imóveis, ou de bens de capital já em utilização;
II – aquisição de títulos representativos do capital de empresas ou entidades de qualquer espécie, já constituídas, quando a operação não importe aumento do capital;
III – constituição ou aumento do capital de entidades ou empresas que visem a objetivos comerciais ou financeiros, inclusive operações bancárias ou de seguros.

§ 6º São Transferências de Capital as dotações para investimentos ou inversões financeiras que outras pessoas de direito público ou privado devam realizar, independentemente de contraprestação direta em bens ou serviços, constituindo essas transferências auxílios ou contribuições, segundo derivem diretamente da Lei de Orçamento ou de lei especialmente anterior, bem como as dotações para amortização da dívida pública.

Referências

BALEEIRO, Aliomar. Uma introdução à ciência das finanças. Rio de Janeiro: Forense, 1984.

LEITE, Harrison. Manual de direito financeiro. Salvador: JusPodivm, 2016.

WILGES, Ilmo José. Finanças públicas: orçamento e direito financeiro para cursos e concursos. Porto Alegre: AGE, 2006.

 

Questões

(FCC – TCE/SE – Analista de Controle Externo – 2011) Em Direito Financeiro, Tributo é receita:

a) originária instituída pelas entidades de direito público.
b) derivada instituída pelas entidades de direito público e privado, compreendendo os impostos, as taxas e contribuições nos termos da constituição e das leis vigentes em matéria financeira.
c) derivada, destinando-se seu produto ao custeio de atividades gerais ou específicas exercidas pelas entidades públicas e privadas.
d) derivada instituída pelas entidades de direito público, compreendendo os impostos, as taxas e contribuições nos termos da constituição e das leis vigentes em matéria financeira.
e) derivada ou originária instituída pelas entidades de direito público ou privado, destinando-se seu produto ao custeio de atividades gerais ou específicas exercidas por essas entidades.

 

(MPE/SC – Técnico em Atividades Administrativas – 2014) As receitas tributárias, de contribuições, patrimonial, agropecuária, industrial, de serviços e outras e, ainda, as provenientes de recursos financeiros recebidos de outras pessoas de direito público ou privado, quando destinadas a atender despesas classificáveis em despesas correntes são denominadas:

a) Receitas correntes.
b) Receitas de capital.
c) Receitas originárias.
d) Receitas derivadas.
e) Receitas efetivas.

 

(MPE/RO – Analista – 2012) Com base no Artigo 11 da Lei n° 4.320 de 1964, a receita classificar-se-á nas seguintes categorias econômicas:

a) Receitas Correntes e Receita Patrimonial.
b) Receitas Correntes e Receitas de Capital.
c) Receita Patrimonial e Receitas Tributárias.
d) Receitas de Capital e Receitas de Contribuições.
e) Receitas Tributárias e Receitas de Contribuições.

STF – Informativo nº 888 comentado

Plenário
Acordo de colaboração premiada e delegado de polícia
Embargos de declaração em embargos de declaração e efeitos infringentes – 3
Imunidade formal do Presidente da República e aplicabilidade a codenunciados
1ª Turma
Empresas Públicas e execução de débitos via precatório
Lei de Anistia e prescrição de crimes de lesa-humanidade – 2
Repercussão geral e reclamação: impossibilidade
2ª Turma
“Habeas corpus” e medida cautelar de afastamento de cargo público

Plenário

Acordo de colaboração premiada e delegado de polícia (ADI 5.508/DF)

Houve adiamento do julgamento.

A matéria discutida, vale frisar, diz respeito ao art. 4º, §§2º e 6º, da Lei nº 12.850/13 (organizações criminosas), que tratam da chamada colaboração premida (gênero do qual faz parte a delação premiada), especificamente sobre os poderes do Delegado neste contexto.

O art. 4º, §2º, da referida lei, dispõe que o Ministério Público, a qualquer momento, e o Delegado de Polícia, durante o curso do inquérito, poderão requerer ou representar ao Judiciário pela concessão dos benefícios legais ao indivíduo colaborador.

§2º Considerando a relevância da colaboração prestada, o Ministério Público, a qualquer tempo, e o delegado de polícia, nos autos do inquérito policial, com a manifestação do Ministério Público, poderão requerer ou representar ao juiz pela concessão de perdão judicial ao colaborador, ainda que esse benefício não tenha sido previsto na proposta inicial, aplicando-se, no que couber, o art. 28 do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal).

O parágrafo sexto, a seu turno, possibilita que o Delegado e membros do MP façam as negociações, na mesma esteira em que veda a atuação do julgador em tais atos:

§6º O juiz não participará das negociações realizadas entre as partes para a formalização do acordo de colaboração, que ocorrerá entre o delegado de polícia, o investigado e o defensor, com a manifestação do Ministério Público, ou, conforme o caso, entre o Ministério Público e o investigado ou acusado e seu defensor.

 

Embargos de declaração em embargos de declaração e efeitos infringentes – 3 (AP 565 ED-ED/RO)

Neste julgado, o Plenário ratificou a tese segundo a qual o empate no julgamento de ação penal deve privilegiar a corrente mais favorável ao réu. É posicionamento que prestigia vetores e princípios interpretativos comezinhos ao Direito Penal e ao Direito Processual Penal, como a aplicação da norma mais favorável, favor rei e in dubio pro reo.

Neste mesmo julgamento, esteve em debate situação de dupla penalização do réu (bis in idem), circunstância também rechaçada pela Corte. Prevaleceu o voto do Ministro Dias Toffoli no sentido de que o manuseio de circunstâncias relativas à conduta social e personalidade em duplicidade (para incrementar a culpabilidade e impor majorante ao fato) seria vedado pelo ordenamento jurídico.

 

Imunidade formal do Presidente da República e aplicabilidade a codenunciados (Inq 4483 e Inq 4327)

O Plenário asseverou que:

A imunidade formal prevista no art. 51, I, e no art. 86, “caput”, da Constituição Federal (1) (2), tem por finalidade tutelar o exercício regular dos cargos de Presidente da República e de Ministro de Estado, razão pela qual não é extensível a codenunciados que não se encontram investidos em tais funções.

Esta imunidade, lembre-se, diz respeito à necessidade de a Câmara dos Deputados autorizar a instauração de processo contra o Presidente, seu vice e ministros. É uma condição de procedibilidade para o processo contra tais figuras republicanas. Trata-se, ademais, de uma decisão de cunho político-jurídico.

A decisão da Câmara favorável ao Presidente e Ministros envolvidos, entretanto, não beneficia terceiros que não se encontram investido nestes cargos. Nessa toada, o STF entendeu que o desmembramento da ação penal e continuidade do procedimento penal em face dos demais acusados pelos respectivos Juízos competentes é regular.

Primeira Turma

Empresas Públicas e execução de débitos via precatório (RE 851.711)

A Turma ratificou que as empresas públicas e sociedades de economia mista não têm direito à prerrogativa de execução via precatório. Ou seja, suas dívidas estão sujeitas aos mesmos métodos de cobrança disponíveis contra dívidas de qualquer outra empresa privada.

Trata-se de repercussão necessária da submissão ao regime jurídico de direito privado e da observância ao princípio da livre concorrência (art. 170, IV, da CF/88). No mais, é importante rememorar que a exploração direta de atividade econômica pelo Estado é medida excepcional, decorrente de duas hipóteses: a) motivos de segurança nacional e b) existência de relevante interesse coletivo.

Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei.
§ 1º A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, dispondo sobre:
II – a sujeição ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto aos direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributários

O entendimento permanece inclusive para as empresas que se focam na prestação de serviços públicos. Para estas, o mais adequado seria a adoção da forma autárquica.

 

Lei de Anistia e prescrição de crimes de lesa-humanidade – 2 (Ext 1270/DF)

A Turma definiu que o crime de sequestro, por ser permanente, não prescreve enquanto não for encontrada a pessoa ou o corpo, sendo este julgado interessante pelas suas repercussões sobre delitos ocorridos durante períodos ditatoriais porque passaram diversos países latino-americanos.

Este caso em específico trata de extradição solicitada pelo governo argentino contra indivíduo acusado de participar em crimes de sequestro, tortura e outros. O voto majoritário entendeu que não havia prescrição a ser declarada, razão pela qual os fatos ainda seriam puníveis.

 

Repercussão geral e reclamação: impossibilidade

O caso trata de terceirização no âmbito da Administração Pública, notadamente a responsabilidade do Estado por dívidas trabalhistas de empresas com que manteve contrato de prestação de serviços terceirizados.

A Primeira Turma entendeu que, em virtude do julgamento do RE 760.931, a ADC 16 não poderia ser parâmetro para o ajuizamento de reclamação, pois houve substituição da tese firmada nesta pela firmada naquela. O entendimento vigente, bem semelhante ao anterior, aprecia o tema nº 246 de Repercussão Geral e expõe que:

[…] o inadimplemento dos encargos trabalhistas dos empregados do contratado não transfere automaticamente ao Poder Público contratante a responsabilidade pelo seu pagamento, seja em caráter solidário ou subsidiário, nos termos do art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/93.

A Turma também asseverou que a má aplicação da tese firmada há de ser combatida pelos recursos previstos na lei, tendo em vista que é inadmissível reclamação proposta para garantir a observância de acórdão de recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida ou de acórdão proferido em julgamento de recursos extraordinário ou especial repetitivos, quando não esgotadas as instâncias ordinárias, nos moldes do art. 988, §5º, II, do CPC. O dispositivo visa a frear o ajuizamento de reclamações e impedir a transformação da mesma em substituto recursal.

 

Segunda Turma

Habeas corpus e medida cautelar de afastamento de cargo público

Decidiu a Segunda Turma:

O “habeas corpus” pode ser empregado para impugnar medidas cautelares de natureza criminal diversas da prisão. Com base nessa orientação, ao concluir o julgamento conjunto de duas impetrações, a Segunda Turma, por maioria, concedeu a ordem para revogar a suspensão do exercício da função pública de Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Amapá e demais medidas cautelares pessoais impostas pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Para a maioria dos ministros integrantes, o remédio constitucional em questão pode ser utilizado quando interesses não patrimoniais diversos da liberdade locomotiva sejam afetados. A Turma também observou a duração prolongada e desproporcional da medida cautelar imposta.

Direito e justiça: o que é justiça?

A justiça é um complexo tema recorrentemente abordado pela Filosofia, pela Ética, pela Religião, pelo Direito e tantos outros ramos do conhecimento humano. As abordagens do objeto são inúmeras e passam por filósofos ocidentais e orientais antigos e contemporâneos. Uma resposta prefacial ao questionamento “o que é justiça?” é inviabilizada pela multiplicidade de visões lançadas sobre o objeto, mas admite um rico debate no que diz respeito à formulação e aplicação do Direito (ou seja, desde o nascedouro das normas até a decisão definitiva que consagra a aplicação delas).

Contos milenares, como a história de Antígona, representam bem como a noção de justiça atormenta os homens. Na prosa do grego Sófocles, entram em embate as normas postas pelo homem contra os costumes e normas religiosas (entendidas superiores e, consequentemente, a verdadeira justiça, por Antígona). A narrativa passeia pelo conflito e pelas noções de justiça dos seus atores, contrapondo manifestações primordiais do positivismo e do jusnaturalismo.

Estudiosos como Perelman e Kelsen abordaram o tema dentro da ciência jurídica, chegando à conclusão que a noção de justiça aplicada em concreto é deveras relativa, dependente das culturas em que se inserem os indivíduos, das peculiaridades de suas sociedades e histórias e da forma de pensamento. Por isso, para o primeiro seria mais interesse resolver o conflito social por meio da razoabilidade da argumentação jurídica. Já o segundo busca uma fundação da ciência jurídica independentemente de valores externos, alcançando um sistema normativo puro, passível de universalização e funcionamento alheio a subjetivismos.

A discussão é atual e serve para a contraposição entre a atuação formal dos participantes políticos (legisladores e governantes) e não políticos (juízes, advogados, defensores etc.) da vida jurídica de uma sociedade e a finalidade última dos procedimentos de edição e aplicação das normas. Para Bittar (2016, p. 596), poder-se-ia falar da Justiça como preenchimento semântico do Direito (que seria mera forma posta, enquanto a Justiça seria conteúdo, significado).

A conclusão de Bittar (2016) é valiosa e expressa bem o multifacetado papel que a Justiça deveria operar no Direito na contemporaneidade:

A justiça funciona, enquanto valor que norteia a construção histórico-dialética dos direitos, como fim e como fundamento para expectativas sociais em torno do Direito. Apesar de a justiça ser valor de difícil contorno conceitual, ainda assim pode ser dita um valor essencialmente humano e profundamente necessário para as realizações do convívio humano, pois nela mora a semente da igualdade. (BITTAR, 2016, p. 597).

Kelsen, em seus ensaios, também já abordou o tema e, após anunciar seu fracasso no que diz respeito a uma formulação universal e absoluta de Justiça, argumenta que a Justiça, na sua visão pessoal, se revelaria na ordem social na qual a busca pela verdade poderia prosperar, na qual prevaleceria a liberdade e a paz: uma justiça da democracia, uma justiça da tolerância. (KELSEN, 1971).

 

Referências

BITTAR, Eduardo Garcia Bianca. Curso de Filosofia do Direito. São Paulo: Atlas, 2015.
KELSEN, Hans. What is justice?: Justice, Law, and Politics in the mirror of science. London: University of California Press, 1971.

Lançamento tributário e suas modalidades

No direito tributário, o lançamento é o ato (ou procedimento, conforme parte da doutrina) que formaliza a constituição do crédito tributário. Uma definição legal é trazida pelo art. 142, do CTN:

Art. 142. Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível.
Parágrafo único. A atividade administrativa de lançamento é vinculada e obrigatória, sob pena de responsabilidade funcional.

Obs: é válido ressaltar que o crédito tributário é a formalização da obrigação tributária (dever legal de pagar os tributos) já existente. Uma gradação cronológica seria a de que o fato gerador ocorre, vindo a surgir uma obrigação tributária, que será formalizada em crédito por meio do lançamento.

O lançamento funciona, assim, como mecanismo vinculado (obrigatório) que confere certeza e liquidez ao crédito fazendário, viabilizando sua cobrança. Sua natureza é disputada entre os estudiosos, mas admite-se em geral a visão de que o mesmo declara a obrigação e constitui formalmente o exigível crédito.

[…] podemos dizer que o lançamento tem eficácia dúplice: é declaratório da obrigação e constitutivo do crédito que dela decorre. (MACHADO SEGUNDO, 2017, e-book).

Por possuir uma íntima relação com a situação de fato pertinente (o correlato fato gerador, como a circulação de mercadoria ou a transmissão de bens causa mortis), o lançamento segue como regra geral os parâmetros da lei vigente no momento da concretização de tais fatos geradores (sujeitos, alíquotas, base de cálculo etc.). É o que expõe o art. 144, do CTN:

Art. 144. O lançamento reporta-se à data da ocorrência do fato gerador da obrigação e rege-se pela lei então vigente, ainda que posteriormente modificada ou revogada.
§1º Aplica-se ao lançamento a legislação que, posteriormente à ocorrência do fato gerador da obrigação, tenha instituído novos critérios de apuração ou processos de fiscalização, ampliado os poderes de investigação das autoridades administrativas, ou outorgado ao crédito maiores garantias ou privilégios, exceto, neste último caso, para o efeito de atribuir responsabilidade tributária a terceiros.
§ 2º O disposto neste artigo não se aplica aos impostos lançados por períodos certos de tempo, desde que a respectiva lei fixe expressamente a data em que o fato gerador se considera ocorrido.

Como denota o parágrafo primeiro, aspectos meramente procedimentais (critérios de apuração, poderes de investigação, novos mecanismos e procedimentos de fiscalização etc.) não se sujeitam aos parâmetros existentes à época do fato gerador.

O art. 146, do CTN, complementa essa visão, determinando que modificações nos critérios de apuração de tributos (sejam efetuadas de ofício ou por decisão administrativa ou judicial) só serão aplicadas aos fatos geradores posteriores à definição da nova postura.

Art. 146. A modificação introduzida, de ofício ou em conseqüência de decisão administrativa ou judicial, nos critérios jurídicos adotados pela autoridade administrativa no exercício do lançamento somente pode ser efetivada, em relação a um mesmo sujeito passivo, quanto a fato gerador ocorrido posteriormente à sua introdução.

Como a finalidade precípua do lançamento é a constituição e definição da exigibilidade do crédito tributário em face do sujeito passivo, este precisa ser regularmente notificado para que aquele seja considerado aperfeiçoado. Com a regular notificação do contribuinte, o lançamento se aperfeiçoa e sua alteração só ocorrerá nas hipóteses previstas na lei:

Art. 145. O lançamento regularmente notificado ao sujeito passivo só pode ser alterado em virtude de:
I – impugnação do sujeito passivo;
II – recurso de ofício;
III – iniciativa de ofício da autoridade administrativa, nos casos previstos no artigo 149.

Obs: antes da notificação, a alteração prescinde de maiores formalidades.

Súmula nº 397, do STJ: O contribuinte do IPTU é notificado do lançamento pelo envio do carnê ao seu endereço. (DJe 07/10/2009)

A notificação, ademais, marca o término do prazo decadencial concedido à Fazenda para exercer seu direito. Explica a doutrina:

Como até a ocorrência da notificação ao sujeito passivo o lançamento não se considera efetuado, o prazo de decadência do direito de lançar, seja ele o do art. 150, §4º, seja ele o do art. 173, do CTN, flui até a data dessa notificação, que deve ocorrer antes de consumada a extinção do direito da Fazenda. O início de um procedimento de fiscalização não configura a feitura do lançamento, não representa ainda o exercício do direito de lançar, e por isso mesmo não tem qualquer repercussão no sentido de fazer cessar o curso do prazo de caducidade. (MACHADO SEGUNDO, 2017, e-book).

 

Modalidades de lançamento

Três espécies de lançamento são previstas no ordenamento jurídico brasileiro: a) de ofício (direto); b) por declaração (misto); e c) por homologação (“autolançamento”).

No lançamento de ofício, todos os atos pertinentes ao lançamento (verificação do fato gerador, cálculo do montante devido, definição das alíquotas e base de cálculo, determinação do sujeito passivo etc.) são realizados pelas autoridades administrativas. Isso pode ocorrer naturalmente, após a verificação de inadequação de declarações do contribuinte, após a percepção da inércia deste em declarar e pagar e em outras situações previstas em lei.

Art. 149. O lançamento é efetuado e revisto de ofício pela autoridade administrativa nos seguintes casos:
I – quando a lei assim o determine;
II – quando a declaração não seja prestada, por quem de direito, no prazo e na forma da legislação tributária;
III – quando a pessoa legalmente obrigada, embora tenha prestado declaração nos termos do inciso anterior, deixe de atender, no prazo e na forma da legislação tributária, a pedido de esclarecimento formulado pela autoridade administrativa, recuse-se a prestá-lo ou não o preste satisfatoriamente, a juízo daquela autoridade;
IV – quando se comprove falsidade, erro ou omissão quanto a qualquer elemento definido na legislação tributária como sendo de declaração obrigatória;
V – quando se comprove omissão ou inexatidão, por parte da pessoa legalmente obrigada, no exercício da atividade a que se refere o artigo seguinte;
VI – quando se comprove ação ou omissão do sujeito passivo, ou de terceiro legalmente obrigado, que dê lugar à aplicação de penalidade pecuniária;
VII – quando se comprove que o sujeito passivo, ou terceiro em benefício daquele, agiu com dolo, fraude ou simulação;
VIII – quando deva ser apreciado fato não conhecido ou não provado por ocasião do lançamento anterior;
IX – quando se comprove que, no lançamento anterior, ocorreu fraude ou falta funcional da autoridade que o efetuou, ou omissão, pela mesma autoridade, de ato ou formalidade especial.
Parágrafo único. A revisão do lançamento só pode ser iniciada enquanto não extinto o direito da Fazenda Pública.

O IPTU, a COSIP (contribuições de iluminação pública) e as taxas são os tributos comumente relacionados com o lançamento de ofício, pois as autoridades fiscais já possuem todos os dados necessários para o lançamento, sendo desnecessária qualquer participação do contribuinte. De fato, o contribuinte apenas recebe a fatura de energia com o valor devido da contribuição de iluminação pública, por exemplo.

Já o lançamento por declaração ou misto é o que é efetuado, pela autoridade, com base em declaração do sujeito passivo. Há uma participação nodal do contribuinte no fornecimento de informações que serão efetivamente utilizadas pela Fazenda para aperfeiçoar o lançamento. Expõe o art. 147, do CTN:

Art. 147. O lançamento é efetuado com base na declaração do sujeito passivo ou de terceiro, quando um ou outro, na forma da legislação tributária, presta à autoridade administrativa informações sobre matéria de fato, indispensáveis à sua efetivação.
§ 1º A retificação da declaração por iniciativa do próprio declarante, quando vise a reduzir ou a excluir tributo, só é admissível mediante comprovação do erro em que se funde, e antes de notificado o lançamento.
§ 2º Os erros contidos na declaração e apuráveis pelo seu exame serão retificados de ofício pela autoridade administrativa a que competir a revisão daquela.

Na verdade, nem sempre a Administração disporá de dados suficientes para proceder ao lançamento, suprindo tal deficiência de informação com a declaração prestada pelo particular, em pleno cumprimento de uma obrigação acessória ou colateral (art. 113, §2, CTN). Portanto, o sujeito passivo informa ao Fisco “matéria de fato” na declaração prestada, e, como supedâneo nesta, a entidade tributante calcula o gravame e o notifica para pagar a exação tributária. (SABBAG, 2016, e-book).

É o caso do ITBI, onde o contribuinte informa o valor das transferências imobiliárias realizadas, informação imprescindível para o cálculo do tributo.

Como o próprio contribuinte declara, a alteração de sua declaração, com repercussão financeiramente favorável ao mesmo, depende de comprovação do erro e tem que ser realizada antes da notificação do lançamento.

O lançamento por homologação (chamado também de “autolançamento”, mas com críticas de parte da doutrina) tem traços distintos. Nesta modalidade, o próprio contribuinte ou responsável observa o fato gerador, promove o cálculo do tributo e o recolhe, sem participação prévia da autoridade fiscal. Esta atua posteriormente, verificando a regularidade da conduta do agente passivo. Inexistindo vício, a autoridade realiza a homologação expressa ou tacitamente. No caso de irregularidade, a retificação será promovida pela Administração, nos moldes do art. 142, do CTN, estudado no introito.

Art. 150. O lançamento por homologação, que ocorre quanto aos tributos cuja legislação atribua ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame da autoridade administrativa, opera-se pelo ato em que a referida autoridade, tomando conhecimento da atividade assim exercida pelo obrigado, expressamente a homologa.
§ 1º O pagamento antecipado pelo obrigado nos termos deste artigo extingue o crédito, sob condição resolutória da ulterior homologação ao lançamento.
§ 2º Não influem sobre a obrigação tributária quaisquer atos anteriores à homologação, praticados pelo sujeito passivo ou por terceiro, visando à extinção total ou parcial do crédito.
§ 3º Os atos a que se refere o parágrafo anterior serão, porém, considerados na apuração do saldo porventura devido e, sendo o caso, na imposição de penalidade, ou sua graduação.
§ 4º Se a lei não fixar prazo a homologação, será ele de cinco anos, a contar da ocorrência do fato gerador; expirado esse prazo sem que a Fazenda Pública se tenha pronunciado, considera-se homologado o lançamento e definitivamente extinto o crédito, salvo se comprovada a ocorrência de dolo, fraude ou simulação.

Essa modalidade se verifica em vários tributos, como o imposto de renda (onde a pessoa declara anualmente pelo software da SRFB e já recebe em seguida as guias de pagamento), no ICMS de vários Estados (o empresário faz a operação comercial, inserindo as informações da transação, e já se determina o valor do tributo a ser pago), ou no imposto de importação (o importador declara o valor do bem e sua classificação nas tabelas alfandegárias do Mercosul, vindo a encontrar o valor do tributo que pagará).

Em todas estas modalidades de lançamento, se emergir a necessidade de estimar valores de bens, direitos, serviços ou atos jurídicos, seja por omissão da informação do contribuinte ou carência de fé de tais informações, a autoridade administrativa poderá arbitrar tais montantes em processo regular:

Art. 148. Quando o cálculo do tributo tenha por base, ou tome em consideração, o valor ou o preço de bens, direitos, serviços ou atos jurídicos, a autoridade lançadora, mediante processo regular, arbitrará aquele valor ou preço, sempre que sejam omissos ou não mereçam fé as declarações ou os esclarecimentos prestados, ou os documentos expedidos pelo sujeito passivo ou pelo terceiro legalmente obrigado, ressalvada, em caso de contestação, avaliação contraditória, administrativa ou judicial.

 

Decadência do crédito tributário em suas modalidades

Como visto acima, o prazo decadencial para lançar o tributo é de 5 anos. A contagem deste prazo merece atenção.

A regra geral de contagem e definição do dia inicial de tal prazo se encontra no art. 173, I, do CTN, aplicável ao lançamento de ofício:

Art. 173. O direito de a Fazenda Pública constituir o crédito tributário extingue-se após 5 (cinco) anos, contados:
I – do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado;

Sabendo que o lançamento pode ocorrer a partir do advento do fato gerador e que o exercício tributário corresponde com o ano civil, tem-se que, ocorrendo o fato gerador no ano 2018, o prazo decadencial para lançar o tributo se inicia em 1/1/2019.

No caso do lançamento por declaração, a lógica é a mesma, mas, no lugar do fato gerador, o momento central é o esgotamento do prazo de prestar declarações. Então, se o contribuinte tinha até 2018 para prestar declarações, o prazo decadencial para lançar o tributo se inicia em 1/1/2019.

No caso do lançamento por homologação, a situação é peculiar, conforme define o art. 150, §4º, do CTN:

Art. 150. O lançamento por homologação, que ocorre quanto aos tributos cuja legislação atribua ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame da autoridade administrativa, opera-se pelo ato em que a referida autoridade, tomando conhecimento da atividade assim exercida pelo obrigado, expressamente a homologa.
§ 4º Se a lei não fixar prazo a homologação, será ele de cinco anos, a contar da ocorrência do fato gerador; expirado esse prazo sem que a Fazenda Pública se tenha pronunciado, considera-se homologado o lançamento e definitivamente extinto o crédito, salvo se comprovada a ocorrência de dolo, fraude ou simulação.

Nos casos de lançamento por homologação, duas situações devem ser observadas: o caso de pagamento e o caso de inadimplência (e, consequentemente, falta integral de declaração), conforme explana Paulsen (2012):

Havendo o pagamento (mesmo que inferior ao devido), aplica-se o art. 150, §4º, do CTN, regularmente.

Por exemplo: o contribuinte paga o imposto de importação em 2018, ano em que ocorreu também a entrada do bem (fato gerador). É a partir deste fato gerador que se inicia o prazo de homologação de cinco anos (e não a partir do exercício seguinte ao fato gerador). Passado esse prazo, entende-se homologado tacitamente o pagamento. Se a autoridade entender que houve pagamento inferior ao devido, lançará a diferença por ofício.

Havendo inadimplência (ou seja, o contribuinte ignora seu dever de apurar e pagar) ou outro vício (dolo, fraude, simulação), duas correntes doutrinárias se verificam: a) o prazo se inicia no exercício seguinte ao em que ocorreu o fato gerador; ou b) o prazo se inicia no exercício seguinte ao ano em que se venceu a obrigação. Jurisprudencialmente, a primeira visão é consagrada pelo STJ. A Primeira e Segunda Turmas do STJ (as que tratam de direito público e integram a Primeira Seção da corte, enquanto a T3 e T4 tratam de direito privado e a T5 e a T6 tratam de direito penal) têm decisões recentes sobre o tema:

[…]
4. Em relação à ocorrência da decadência, o STJ possui jurisprudência no sentido de que, na hipótese de ausência de pagamento de tributo sujeito a lançamento por homologação, o prazo decadencial para lançamento do crédito segue a regra do art. 173, I, do CTN. Entretanto, no caso de pagamento antecipado, mesmo que a menor, e não havendo dolo ou fraude, a regra legal aplicável para decadência é a do art. 150, § 4º, do CTN. (STJ – REsp 1691302 / PE. RECURSO ESPECIAL 2017/0199126-0. Relator(a): Ministro HERMAN BENJAMIN. Órgão Julgador: T2 – SEGUNDA TURMA. Data da Publicação/Fonte: DJe 16/10/2017).

[…]
III – Este Tribunal firmou posicionamento, em sede de recurso repetitivo, segundo o qual o prazo decadencial do tributo sujeito a lançamento por homologação, inexistindo a declaração prévia do débito, sem a constatação de dolo, fraude ou simulação do contribuinte, tem início no primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento de ofício poderia ter sido realizado. (STJ – AgInt no REsp 1657137 / SP. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL 2017/0008585-6. Relator(a): Ministra REGINA HELENA COSTA. Órgão Julgador: T1 – PRIMEIRA TURMA. Data da Publicação/Fonte: DJe 27/09/2017).

 

A Súmula nº 555, do STJ, também ressalta esse entendimento:

Súmula nº 555, do STJ: Quando não houver declaração do débito, o prazo decadencial quinquenal para o Fisco constituir o crédito tributário conta-se exclusivamente na forma do art. 173, I, do CTN, nos casos em que a legislação atribui ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame da autoridade administrativa. (DJe 15/12/2015).

Obs: é interesse observar, ademais, a situação em que há correta declaração, mas inadimplência. Para Machado Segundo (2017), é o caso de mera inscrição e cobrança da dívida ativa, tendo em vista que não há retificação a ser feita na obrigação, dispensando novo lançamento em relação à dívida que foi corretamente declarada pelo contribuinte.

Ainda sobre a decadência, é necessário observar o teor do art. 173, II, do CTN, que trata de contagem nos casos em que há modificação do lançamento em virtude de nulidade por vício formal. A contagem do novo prazo decadencial se dá a partir da decisão definitiva que reconheceu esta nulidade.

Vale frisar que estamos falando de vício formal (irregularidades do auto de infração, violação de direitos no processo administrativo etc.) que gere nulidade conhecível em processo judicial ou administrativo. Se for o caso de vício material (como relativo ao montante do tributo, abrangência da incidência tributária, isenções etc.), não há reabertura de qualquer prazo, valendo o iniciado anteriormente.

 

Antecipação do termo inicial

Nos moldes do art. 173, parágrafo único, do CTN, temos uma antecipação do termo inicial do prazo decadencial ao momento em que é notificado o sujeito passivo de medidas preparatórias indispensáveis ao lançamento.

Art. 173, parágrafo único: O direito a que se refere este artigo extingue-se definitivamente com o decurso do prazo nele previsto, contado da data em que tenha sido iniciada a constituição do crédito tributário pela notificação, ao sujeito passivo, de qualquer medida preparatória indispensável ao lançamento.

O prazo inicial do art. 173, I (início do exercício seguinte), é antecipado para o momento da notificação sobre as medidas adotadas ainda no exercício anterior pela Fazenda.

 

Referências

MACHADO SEGUNDO, Hugo de Brito. Código tributário nacional. São Paulo: Atlas, 2017.
PAULSEN, Leandro. Curso de direito tributário. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012.
SABBAG, Eduardo de Moraes. Manual de direito tributário. São Paulo: Saraiva, 2016.

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